No lançamento do Volkswagen Nivus, em junho, o lote de 1.200 unidades destinado à pré-venda esgotou-se em apenas sete minutos. Também no Brasil, em maio, a Audi vendeu todas as unidades do esportivo R8 destinadas ao País em apenas uma semana. Em dezembro de 2019, a versão inicial do SUV do Ford Mustang acabou no mundo todo em um dia. Já nos Estados Unidos, toda a produção inicial da picape elétrica Hummer foi arrematada em menos de uma hora. Apesar da severa crise econômica motivada pela pandemia do novo coronavírus, muitos clientes ao redor do mundo correm para garantir a compra de um automóvel que nem foi testado ou visto de perto.
Para Fernando Trujillo, consultor da IHS Markit, no Brasil o Nivus é um caso à parte. Com o mercado de SUVs aquecido, optar pelo novato gerou uma certa exclusividade. E brasileiro gosta disso. “Ele (o Nivus) é o primeiro SUV-cupê do Brasil sem ser de marca de luxo. Isso tornou acessível um tipo de carroceria antes oferecida apenas por fabricantes como BMW e Mercedes-Benz, por exemplo. É tudo questão de criar o desejo no consumidor.”
Ele comenta que o fato de a Volkswagen ser uma marca muito forte no Brasil e, ao mesmo tempo, estar renovando todo o seu portfólio, com mais tecnologia e novo design, contribui para o sucesso. A marca afirma que o Nivus já ultrapassou as 10 mil unidades vendidas.
Algumas situações ainda mais inusitadas ocorreram recentemente nos Estados Unidos. E isso apesar de o país ter sido o mais gravemente atingido pela pandemia do novo coronavírus. Em agosto, a Ram 1500 TRX foi lançada como a picape mais rápida do mundo. A potência da grandalhona chega a 711 cv. E o preço começava em quase US$ 100 mil, perto de R$ 570 mil na conversão direta.
Pois a edição Launch Edition se esgotou em apenas três horas, com 702 pedidos confirmados. Além de potência de sobra, a picape se destaca pelo emblema vermelho de alumínio escovado no console, identificando se tratar de uma série limitada. E nem era o caso de gastar essa quantia e levar o carro para casa. Na época, o veículo nem havia entrado em produção.
Mais curioso ainda é o caso da picape Hummer EV. Depois de dez anos fora do mercado, a Hummer voltou na semana passada. Dessa vez, na forma de um modelo elétrico sob responsabilidade da GMC (divisão de veículos comerciais da General Motors). A expectativa foi tanta que toda a produção inicial, destinada à pré-venda, esgotou-se em menos de uma hora. Como no caso da RAM, o início da fabricação não será imediato. A novata deve chegar às mãos dos compradores só no fim do ano que vem.
Da mesma forma como no modelo da RAM, o preço não era exatamente um atrativo. A picape Hummer custa nos EUA US$ 112.595, ou cerca de R$ 650 mil na conversão direta. A superpicape tem três motores elétricos. Juntos, são capazes de gerar 1.000 cv. A fabricante anuncia autonomia de 560 km. Além disso, segundo informações oficiais, ela é capaz de acelerar de 0 a 100 km/h em 3 segundos, tempo digno de superesportivo.
Poder da marca
“Estes modelos são bem sucedidos por vários motivos, mas eu destacaria, em alguns casos, o poder da marca. Isso remete a uma diferenciada percepção de desempenho e qualidade”, enfatiza a especialista no setor automotivo Letícia Costa, sócia da Prada Assessoria. Ela afirma que o efeito “novidade” desperta atração no consumidor. Outro fator é o estilo. “Ninguém compra um carro que ache feio. As linhas podem ser atraentes por ter apelo retrô, por ter personalidade ou, apenas, por serem modernas”, aponta.
“O conteúdo básico do modelo também pode ser parte do atrativo”, afirma Letícia. Para ela, essa afinidade com determinado veículo é aprofundada quando o cliente avalia a concorrência direta. Ou seja, no caso da picape Hummer, além do apelo da sustentabilidade, trata-se de um veículo extremamente potente. Um diferencial e tanto para quem busca exclusividade no segmento
Quatro minutos
Outro modelo que registrou rapidez de vendas foi o Civic Type R Limited Edition. No Canadá, a Honda conseguiu esgotar todas as 100 unidades destinadas ao país em quatro minutos. Para garantir a compra, os interessados precisaram fazer um depósito de 1.000 dólares canadenses, equivalentes a R$ 4.328 na conversão direta
Andrew Tai, CEO e cofundador do Motoinsight, que controla as vendas on-line do modelo, ficou impressionado com o sucesso. Ele disse que os consumidores estavam comprando um carro que nem ao menos tinham visto de perto. Para os especialistas, a exclusividade de uma nova geração somada à tecnologia embarcada explicam o êxito nas vendas.
“É o mesmo que juntar a fome com a vontade de comer”, aponta o consultor Paulo Garbossa, da ADK Automotive. Ele pondera que o público tem um xodó por determinados modelos, e isso se reverte em sucesso de vendas. “Na década de 1990, por exemplo, os americanos ficaram órfãos do Bronco. Quando viram que a Ford estava trazendo o carro de volta, com as devidas atualizações, o público logo se interessou.”
De fato, este é o caso mais recente de êxito instantâneo. Mesmo sem abrir vendas, o novato caiu nas graças do público e já ultrapassou as 190 mil reservas nos EUA. As entregas estão previstas para meados do ano que vem. O Ford Bronco foi lançado com apelo retrô e três opções de carroceria.
O modelo inédito também nem sequer passou pelas mãos da imprensa especializada. Ou seja, ninguém conhece o comportamento do SUV, nem mesmo por meio de leituras ou vídeos. Isso reforça a tese de que o comprador vem adotando novas práticas de consumo.
Para Garbossa, a pandemia contribuiu para essa mudança de comportamento. “Nesses meses de quarentena, o Brasil ganhou cinco anos em tecnologia. As pessoas estão mais virtuais que nunca. Hoje, o papo na hora do café foi substituído. Agora, esses minutos são reservados às pesquisas de produtos, inclusive, carros.”
Mas o consultor Fernando Trujillo, da IHS Markit, diz que esses veículos “fora da caixinha” são, em primeiro lugar, um nicho de mercado. O executivo afirma que essas pré-vendas não refletem o ciclo de vida do modelo. “O nome forte, a vasta tecnologia e o design agressivo criam esse desejo no consumidor, impactando no marketing e, dessa forma, facilita as vendas. Porém, elas (as vendas) não são sustentáveis neste nível alto”, pondera.