No primeiro dia de prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2018, realizado no último domingo (4), 24,9% dos inscritos em todo o Brasil não compareceram. Este é o menor percentual desde 2009, quando o exame passou a ter dois dias de aplicação, de acordo com dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Cerca de 1,3 milhão de participantes se ausentaram, de um total de 5,5 milhões de inscrições confirmadas. Em Minas Gerais, o índice de faltosos ficou próximo ao nacional: 24,2% faltaram às provas de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, Ciências Humanas e suas Tecnologias, além da redação, que teve como tema “Manipulação do comportamento do usuário pelo controle de dados na internet”.
Em Juiz de Fora, onde esperavam-se mais de 19 mil candidatos, alunos encontraram dificuldades, mas a avaliação foi considerada positiva. Para o diretor pedagógico do Sistema Degraus de Ensino, Rodrigo Mendonça Pereira “a sensação, na escola, foi de que a prova foi difícil, em termos de conteúdo e de exigência, mas, de um modo geral, os alunos ficaram satisfeitos com a elaboração da prova.”
Com temas sociais, como violência contra mulher, racismo e cultura LGBT, o exame cumpriu uma característica de interdisciplinaridade, segundo Marcus Vinícius Dutra, diretor pedagógico do curso preparatório Cave. “Você não está trabalhando nada que envolva dados, estatísticas e informação. Claro que o aluno que trabalha a informação tem a capacidade de análise, mas foram questões muito bem feitas”, explica. “Este ano, talvez a questão social tenha vindo de uma maneira mais abrangente, em um prenúncio de que vamos ter uma mudança de governo. Isso é esperado pelo aluno, não é possível trabalhar questões sociológicas sem abordar a diversidade.”
Próxima etapa
De acordo com o Ministério da Educação (MEC), os gabaritos e cadernos de questões estarão disponíveis no dia 14 de novembro, no site do Enem, enquanto os resultados devem ser divulgados em janeiro de 2019.
Com o tema “Manipulação do comportamento do usuário pelo controle de dados na internet”, a redação desta edição do Enem trouxe um rompimento em relação às temáticas anteriores. “Na prova de redação, quebrou-se uma série de três anos em que se tratava das minorias. Tratou-se das mulheres, dos negros, dos surdos, e esse ano não veio com uma ‘polêmica’, em contrapartida”, explica Rodrigo Mendonça.
Os candidatos que realizaram a prova no último domingo poderiam abordar diversas questões na redação, de acordo com Waldyr Imbroisi, professor especialista em redação do curso Aporia. “O aluno tinha a possibilidade de escrever por muitos caminhos. Poderia seguir discussões que tivessem a ver com economia e como a propaganda chega melhor no indivíduo. Poderia falar um parágrafo sobre fake news, embora uma redação inteira poderia configurar tangenciamento de tema. Poderia falar de indústria cultural e da maneira que se padroniza o acesso à cultura, bem como poderia falar sobre bolha e aumento da intolerância dentro desses locais, porque você só tem acesso às mesmas opiniões e às mesmas notícias que corroboram com sua própria ideia”.
Outros exemplos citados pelo diretor pedagógico Marcus Dutra estão relacionados ao comércio on-line ou com controle de e-mails. “Cartão de crédito e espionagem de e-mail no mundo todo: são caminhos muito diferentes, mas que não seriam fuga ao tema, por conta dessa multiplicidade.” Por ser um tema relativamente atual, uma dúvida entre alunos estava relacionada à citação literária. Sobre isso, Dutra exemplificou as obras “1984”, de George Orwell e “Admirável Mundo Novo”, de Aldous Huxley. “O candidato poderia pegar essas citações literárias. A questão do alienamento, de direcionamento do raciocínio, do comportamento das pessoas, de comprar o que mandam, ler o que estão direcionando: está tudo extremamente relacionado.”
Uma das competências cobradas pela prova de redação do Enem é a elaboração de propostas de solução para o problema abordado, respeitando os direitos humanos. “A maior complexidade desse tema é na finalização, na hora de apresentar a argumentação para aquilo que levantou como problemática”, explica Dutra. Assim, de acordo com o coordenador pedagógico, as propostas seriam amplas, seguindo o que os candidatos abordaram. “Um nível de elaboração ‘mirabolante’ acaba, na verdade, dificultando a finalização. Na hora que o aluno falar de liberdade, não pode cair em contradição de estar criando um impedimento ou censura.”
Para Rodrigo Mendonça, um ponto que, além de proposta de solução, poderia ser abordado como argumento na redação, está relacionado à alfabetização digital. “Hoje, é um dos conceitos que temos que trazer a partir da Base Comum Curricular. Tem tudo a ver com uma legislação recente que foi criada e com essa proposta de intervenção de educação digital.”