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Empresária é presa em Juiz de Fora durante operação da Polícia Federal

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Empresária prestou depoimento na sede da Polícia Federal (Fotos: Olavo Prazeres)
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A Polícia Federal (PF) deflagrou, nesta terça-feira (4), a Operação Ressonância, um desdobramento da Lava Jato no Rio de Janeiro, contra suposto cartel e fraude em licitações para o fornecimento de equipamentos médicos e materiais hospitalares para a Secretaria de Saúde do Estado do Rio de Janeiro e para o Instituto Nacional de Traumatologia (Into). Em Juiz de Fora, foram cumpridos um mandado de prisão temporária e um mandado de busca e apreensão. O alvo na cidade é Danielle Cristine Fazza da Veiga, empresária do ramo alimentício e de consultoria. Ela tem participação societária em uma empresa de consultoria e treinamento com sede em Brasília, envolvida nas investigações.

A empresa teria apresentado movimentações suspeitas de dinheiro para o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), que ultrapassaram o montante de R$ 700 mil no período de dois meses. Danielle Cristine Fazza da Veiga prestou depoimento na sede da Polícia Federal em Juiz de Fora. O advogado da empresária, Pedro Brandi, informou à Tribuna que sua cliente foi encaminhada para o IML e, logo após realizar os exames de praxe, seria levada para a Penitenciária Ariosvaldo Campos Pires. Um agente penitenciário confirmou que ela deu entrada na unidade prisional na parte da tarde. A reportagem tentou contato com a assessoria da Secretaria de Estado de Administração Prisional (Seap) para confirmar esta informação, no entanto, as ligações não foram atendidas. O advogado optou por não se manifestar sobre o assunto.

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De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), o marido da empresária, Jair Vinnicius Ramos da Veiga, conhecido como Coronel Veiga, seria um dos principais articuladores de fraudes e licitações envolvendo os órgãos de saúde. Ele teria sido cooptado por um empresário para reformular os editais do Into, no Rio, e adequá-los às exigências do Tribunal de Contas da União (TCU), “tornando mais sofisticadas as fraudes licitatórias sistematicamente perpetradas pela organização criminosa”, diz o documento do MPF.

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Por meio da quebra de sigilo bancário do casal, as investigações apontaram depósitos em espécie na conta de ambos – operações que foram detectadas como suspeitas pelo Coaf. Somente na conta do marido, os depósitos suspeitos em espécie totalizaram mais de R$ 2 milhões no período. O marido da mulher também foi alvo de mandado de prisão preventiva cumprido no Rio de Janeiro.

Operação Ressonância mira ‘clube do pregão’ que atua desde 1996 no Rio

As investigações que levaram à Operação Ressonância, etapa da Lava Jato que mirou em contratos para a aquisição de equipamentos médicos no Rio, mostraram que licitações foram fraudadas para a compra de itens em quantidade desnecessária e que outros equipamentos foram pagos e sequer foram entregues às unidades de saúde. Segundo o Ministério Público Federal (MPF), o esquema de cartel vem desde 1996, foi incorporado pela gestão do governador Sergio Cabral (MDB) – 2007-2014 -, e permanece vigorando atualmente no Estado, a despeito do holofote da Lava Jato sobre o setor desde o ano passado.

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A operação foi desencadeada pelo MPF, em conjunto com o Conselho de Defesa Administrativa (Cade), o Tribunal de Contas da União (TCU) e a Controladoria Geral da União (CGU), a Receita Federal e a Polícia Federal, com o objetivo de aprofundar as investigações sobre aquisições na área da saúde firmados pelo governo do Estado e pelo Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia Jamil Haddad (Into).

Ano passado, “a ponta do iceberg” havia sido revelada pela Operação Fatura Exposta, de abril de 2017, que prendeu Sérgio Côrtes, ex-diretor do Into, ex-secretário de Saúde de Cabral e estreito colaborador do emedebista. Ele foi solto em fevereiro deste ano pelo Supremo Tribunal Federal (só precisa permanecer em casa no período noturno). Hoje, sua residência foi alvo de mandado de busca e apreensão, mas ele não foi encontrado em casa Côrtes teria ido realizar uma cirurgia e saiu antes das 6 horas, de acordo com o MPF.

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O TCU e a CGU analisaram processos licitatórios selecionados aleatoriamente, e encontraram as mesmas irregularidades neles, o que comprovaria a persistência do modelo criminoso. O TCU avaliou nove pregões, num total de R$ 180 milhões, e detectou “possível débito” de R$ 85 milhões. O valor se refere a equipamentos que não tiveram a entrega comprovada. O órgão pediu que as entregas sejam atestadas por meio de documentação e fotos e ainda aguarda respostas.

No Into, foram localizadas mais mesas cirúrgicas do que quartos disponíveis para a realização de cirurgias. Isso foi detectado numa vistoria in loco da CGU, realizada no segundo semestre do ano passado. “Foram encontrados equipamentos de alta complexidade sem uso. Isso permite visualizar como a corrupção afeta as escolhas públicas e prejudica diretamente a população”, disse a procuradora da República Marisa Ferrari, ao detalhar a operação.

Conforme o MPF, a liderança do cartel era exercida pela empresa Oscar Iskin, do empresário Miguel Iskin, e outras 33, pelo menos, também participavam do esquema (parte delas, laranjas). Elas formavam o “clube do pregão internacional”. Licitações foram feitas no exterior sem que fossem divulgadas, de modo a impedir a entrada de empresas de fora do “clube”. Eram feitas exigências excessivas, outra forma de afastar outras possíveis interessadas. As listas dessas exigências eram redigidas pelo próprio “clube”, e assinadas por funcionários públicos.

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De acordo com o MPF, a propina era de 40% do valor dos contratos Houve compras fraudadas inclusive para serem entregues em outros Estados brasileiros, uma vez que o Into é referência nacional para cirurgias ortopédicas e se relaciona com o Sistema Único de Saúde. As empresas que não faziam parte do cartel eram desclassificadas no decorrer de diferentes etapas dos pregões, explicaram procuradores da República.

Foram decretadas pela 7ª Vara Federal Criminal as prisões preventivas de 13 pessoas e temporárias de nove, e também busca e apreensão de possíveis provas em 44 endereços. Apenas duas prisões não foram efetuadas, porque os alvos não estavam no país.  O bloqueio de bens dos investigados chegou ao valor de R$ 1,2 bilhão. “Esse grupo agia desde a fase de publicação de editais, colocando especificações técnicas que só poderiam ser atendidas pelo cartel, depois na fase de lances, e também fornecendo subsídios para tornar o jogo de cartas marcadas. Temos indícios suficientes para dizer que ainda hoje dentro do Into há cobrança de propina. As trocas na direção foram feitas para perpetuar o esquema. O prejuízo é inestimável”, afirmou o procurador Felipe Bogado. Entre os envolvidos, há executivos de empresas multinacionais fornecedoras de insumos médicos, como Philips, Johnson & Johnson, Drager, Stryker.

Defesas

A Johnson & Johnson Medical Devices Brasil afirma que “segue rigorosamente as leis do país e está colaborando integralmente com as investigações em andamento”, informou a empresa em nota. Em nota, a GE afirmou que “a respeito da operação da Polícia Federal conduzida na manhã de hoje, que resultou na prisão temporária de Daurio Speranzini Jr., esclarecemos que as alegações são referentes ao período em que o executivo atuou na liderança de outra empresa. A GE ressalta que não é alvo das investigações. A empresa acredita que os fatos serão esclarecidos pela Justiça e está à disposição para colaborar com as autoridades”.

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A Philips informa que “ainda não teve acesso ao processo, no entanto, está cooperando com as autoridades para prestar quaisquer esclarecimentos quanto às alegações apresentadas, que datam de muitos anos atrás. Os atuais líderes executivos da Philips não são parte da ação da Polícia Federal; um colaborador da equipe de vendas da Philips foi conduzido para prestar esclarecimentos. A política da Philips é realizar negócios de acordo com todas as leis, regras e regulamentos aplicáveis. Quaisquer investigações sobre possíveis violações dessas leis são tratadas muito seriamente pela empresa”.

O advogado Alexandre Lopes, que defende o empresário Miguel Iskin, afirmou: “Mais uma prisão ilegal que será revogada pelos tribunais brasileiros. Trata-se de repetição de operação anterior, na qual custódia preventiva já foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal. Causa perplexidade a utilização como base da prisão depoimentos de um delator chamado Cesar Romero, que ouvido em Juízo, anteriormente, foi flagrado em várias mentiras. Suas delações deveriam ser anuladas, e não usadas como arrimo de prisão ilegal.” O Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia Jamil Haddad afirmou que “está à disposição para esclarecimentos da investigação”.
Até o fechamento desta edição, a reportagem ainda procurava as demais empresas.

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