De 142 ônibus da empresa Gil, 84 não contam com bancos acolchoados, um descumprimento de item mínimo de exigência previsto nos contratos de licitação para o transporte coletivo, assinado em 2016 pelas empresas dos consórcios Manchester e Via JF. O número representa cerca de 60% dos coletivos. A irregularidade foi flagrada na saída dos veículos na madrugada desta quarta-feira (3), pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos ônibus, da Câmara Municipal de Juiz de Fora, e já havia sido denunciada pela Tribuna em 2018. A questão seria suficiente para impedir que os ônibus saíssem da garagem, entretanto, a comissão entendeu que a circulação dos veículos deveria seguir o cronograma a fim de evitar transtornos ao sistema. Por outro lado, a Astransp afirma que houve retenção de 40 minutos de três veículos da empresa, o que acarretou no atraso de cumprimento de itinerário de algumas linhas. A associação entende, ainda, que o ocorrido foi uma tentativa de intimidação e que irá tomar as medidas jurídicas cabíveis.
Após captar informações por meio de documentos, a Comissão inicia os trabalhos de diligências, segundo o vereador Adriano Miranda (PHS), presidente da CPI. Desta forma, a ação ocorrida na madrugada desta quarta-feira faz parte desta fase de atividades da Comissão Parlamentar, e teve como objetivo verificar itens essenciais ao funcionamento do veículo. “Chegando lá (garagem da Gil), de pronto identificamos que quase 60% da frota da empresa não cumpre determinação básica do contrato, que é a questão do revestimento do banco. Isso já era exigido no início do contrato”, explica o vereador. “Nós entendemos que isso passou batido pela Settra e foi negligenciado pela fiscalização durante esses dois anos.” A Settra, entretanto, garante que as fiscalizações são rotineiras e autua, inclusive, as empresas.
Ainda segundo Adriano Miranda, outras questões voltadas à qualidade dos veículos seriam verificadas, entretanto, a chuva também limitou a atividade. De toda forma, segundo informações da assessoria de imprensa do vereador, os fatos registrados irão integrar parte da documentação já recolhida e apurada pela CPI. A atual fase de trabalho da comissão indica flagrantes e provas contundentes de descumprimentos de cláusulas do contrato de licitação. Os relatórios serão encaminhados ao Ministério Público, Tribunal de Contas do Estado e ao Executivo.
Possibilidade de reter os veículos
Conforme o vereador, tal irregularidade poderia acarretar na retenção dos veículos. Porém, para não causar prejuízos ao sistema de transporte público, devido à chuva registrada na madrugada desta quarta-feira, a CPI entendeu que os coletivos deveriam seguir o cronograma. “São cinco empresas que temos que visitar nessa etapa de diligência e nós vamos continuar com essa sequência de atividades. Em relação a esse descumprimento específico (da empresa Gil), o fiscal da Settra irá notificar.” A ação foi acompanhada, além de Miranda, pelo vereador José Márcio Guedes (Garotinho, PV), também integrante da CPI, de um agente da Secretaria de Transporte e Trânsito (Settra) e de policiais militares.
Astransp considera abuso de autoridade
Para a Astransp, representante legal do Consórcio Manchester, formado pelas empresas Tusmil e Gil, a ação ocorrida na madrugada desta quarta-feira foi uma tentativa de intimidação por parte dos vereadores. Conforme Alexandre Carneiro, advogado da associação, o grupo foi surpreendido com a informação da visita dos parlamentares. “Os vereadores estavam impedindo os ônibus de circular, sob o argumento de que estavam fazendo uma fiscalização, abusando do poder de autoridade ao reter os ônibus que deveriam atender a população na parte da manhã.”
Isto porque, conforme Carneiro, houve retenção, por 40 minutos, de três veículos, que atendiam as linhas Milho Branco, Floresta e Jardim Natal. Com isso, outros coletivos foram impedidos de sair da garagem, causando um atraso, em efeito cascata, em toda a frota da empresa. “Houve retenção de ônibus, nítida interrupção do fluxo dos ônibus da garagem e identificação dos motoristas, em nítido ato intimidatório dos mesmos”, afirma. “A Astransp entende que foi uma tentativa de intimidação e uma tentativa de colocar a população contra as empresas. Nós vamos adotar todas as medidas jurídicas que o caso comporta.”Entre as medidas citadas pelo advogado está o acionamento da Comissão de Ética da Câmara Municipal, além de reportar o ocorrido durante a madrugada ao Ministério Público.
Perguntado sobre o descumprimento do contrato, o advogado explicou que a questão já foi abordada com a Settra e estipulado prazo para as empresas promoverem a substituição da frota. “Como essa substituição vai ocorrer em julho de 2019, não é economicamente viável, porque a adoção de medidas nesse momento impactaria na planilha”, justifica.
O advogado defende, ainda, que outros pontos deveriam ser foco de fiscalização, que teriam mais impacto ao sistema de transporte público. “O poder público municipal tinha ciência a todo o momento dessa questão do acolchoamento dos bancos, então, o que causa espanto é que há outras questões importantes a serem tratadas, que impactam diretamente na qualidade da frota. Os inúmeros buracos que Juiz de Fora possui desgastam pneus e suspensões. E essas são as questões que julgamos realmente importantes para a qualidade do serviço.”
À reportagem, a Settra garantiu que os dispositivos que constam na licitação são rotineiramente fiscalizados pela Supervisão de Fiscalização de Transportes, entre eles, a obrigatoriedade dos bancos acolchoados. Em nota, a pasta afirmou que a vistoria de 2019 teve início em março, sendo realizada nas garagens e veículos do Consórcio Manchester, e constatada a ausência do item. “A Settra já está adotando as medidas cabíveis para garantir o cumprimento da exigência”, diz o texto. Por fim, a Settra informou que, em virtude dos descumprimento dos itens previstos do edital, foram aplicadas 1.538 autuações às empresas dos consórcios Manchester e Via JF. Apesar de questionada, a secretaria não detalhou quantas multas foram pagas, nem mesmo os valores devidos.