Há dez anos, num desses exames, o produtor de leite recebeu a notícia de que a sua dosagem de PSA (antígeno prostático específico) estava elevada. O sinal de alerta acendeu, e ele procurou um médico urologista. Foi encaminhado aos exames necessários e teve o diagnóstico positivo. A cirurgia para retirada da próstata foi a estratégia para livrá-lo do câncer. “Fiz a operação e fiquei novinho em folha”, brinca.
Todavia, depois de oito anos, em janeiro de 2017, a dosagem de PSA voltou a subir, o que foi descoberto pelo produtor de leite durante um exame de sangue, que ele nunca deixou de fazer. Voltei ao médico e tive que passar por mais 33 sessões de radioterapia”, conta Alceu. Atualmente, sua saúde é de ferro. Ele acorda todos os dias, ainda de madrugada, para ordenhar suas vacas, no sítio onde mora e também cria galinhas. É dono de um vigor invejável. “Sobre o câncer, nunca tive medo. Não sofri nenhum tipo de abalo, quando recebi o diagnóstico. Nunca pensei na morte. Se a gente tem um Deus, ele é maior do que essa doença”, fala com entusiasmo. “O câncer para mim foi o mesmo que uma gripe, uma doença qualquer”, ressalta.
Alceu tem três filhos homens, de 50, 46 e 42 anos, e mora com a esposa Maria Aparecida, 80. Quando o câncer foi descoberto, apenas um dos filhos ficou mais preocupado. “Mas depois da cirurgia, eles viram que não era nada, e tudo voltou ao normal”, afirma, lembrando que só depois da operação precisou ficar 60 dias em repouso. “Apenas caminhava pela varanda de casa. Depois que passou o repouso, minha vida voltou ao normal e só não pego peso”. Ele faz questão de dizer que, em relação ao tratamento, nunca sentiu efeito colateral. “A médica até me disse que, em razão de uma injeção, eu iria sentir um calor insuportável, mas nunca senti nada. Nunca senti dor antes da confirmação do diagnóstico, durante o tratamento e depois.”
Sobre o exame de toque retal, que causa aversão aos homens, afastando-os do consultório médico, Alceu, no auge de sua sabedoria conferida por muitos anos de vida, afirma: “O toque não é nada, mas muito necessário fazê-lo. É preciso deixar o orgulho de lado, porque isso é besteira. A gente não sente nada, não vê nada. É uma coisa fácil, rápida. Então, aconselho que todos façam. Passou dos 40 anos, faça o toque”, recomenda, lembrando que nunca teve casos de câncer na sua família, mas fumava dois maços de cigarro por dia até os 60 anos. Segundo ele, o hábito de realizar exames foi adquirido pela necessidade que tinha de saber sobre a sua saúde. “Sempre fiz os exames, porque gostava de fazer, porque não custa olhar e ficar tranquilizado”.
Para o produtor, manter corpo e mente saudáveis é a melhor maneira de se prevenir contra a doença e também combatê-la durante o tratamento. “Essa doença para mim nunca significou nada, e a morte nunca passou perto de mim. Aliás, acho que ela tem medo de mim. Acho que o que me curou mais rápido, me deu mais força, é que não penso no que vai acontecer. Tenho 82 anos, mas minha cabeça é de 40 anos. Subo e desço morro e corro atrás de vaca. Sou muito ativo.”
Com essa mensagem positiva, a Tribuna inicia, neste domingo, dentro da série “Existe Esperança!”, a primeira matéria do “Novembro Azul”, mês de conscientização para o combate ao câncer de próstata.
Segundo tipo mais comum da doença
O câncer de próstata é o segundo mais comum entre os homens e está atrás apenas do câncer de pele não-melanoma. Conforme o Instituto Nacional do Câncer (Inca), em valores absolutos e considerando ambos os sexos, é o segundo tipo mais comum. Em 2018, foram estimados 68.220 novos casos em todo o país. Em Juiz de Fora, dados da Secretaria de Saúde mostram que, pelo menos, 300 novas ocorrências são registradas, a cada ano. Mais do que qualquer outro tipo, é considerado um câncer da terceira idade, já que cerca de 75% dos casos no mundo ocorrem a partir dos 65 anos. O aumento observado nas taxas de incidência no Brasil pode ser parcialmente justificado pela evolução dos métodos de diagnósticos (exames), pela melhoria na qualidade dos sistemas de informação do país e pelo aumento na expectativa de vida.
“O câncer no geral é multifatorial, porém, o câncer de próstata tem como causa principal o histórico familiar, ou seja, a genética. Claro que tem importância o estilo de vida. Sedentarismo, tabagismo, abuso de bebida alcoólica e dieta com abuso de carne estão entre os hábitos de risco. Mas o histórico familiar é determinante na origem da doença”, explica o urologista Fernando Henrique Ribeiro, coordenador do Serviço de Urologia da Ascomcer e diretor técnico do hospital.
Para o especialista, a melhor maneira de prevenir essa doença é mantê-la rastreada, ou seja, agir como o produtor de leite Alceu Ávila, mantendo em dia as visitas ao urologista e realizar os exames de forma rotineira. “Eu costumo dizer que se deve fazer sempre esse rastreamento, porque, se o câncer de próstata tem como causa principal o fator genético, não há como evitar. É preciso procurar o urologista a partir dos 50 anos de idade, fazer o exame de toque juntamente com o exame de sangue que é essencial, pois, caso a doença ocorra, pode ser descoberta em fase inicial”, orienta.
Fernando Henrique lembra que, para quem já teve casos na família e também para homens negros, as consultas ao médico devem começar mais cedo, a partir dos 45 anos, e com frequência anual. “É bom ressaltar que o fato de realizar o exame uma única vez não protege o homem, pois não é uma vacina. O paciente, realmente, tem que procurar o médico todo ano, porque não tem hora para o câncer aparecer”.
Depois de descoberta, a doença, se não for tratada, mata. Em todo o Brasil, de acordo com a última pesquisa do Inca, 15.391 homens morreram em decorrência do câncer de próstata. No município, entre 2014 e 2018, foram 269 vítimas, conforme a Secretaria de Saúde.
Câncer de próstata não dói
Culturalmente, o homem brasileiro não tem o hábito de ir ao médico de forma preventiva como as mulheres. Neste quesito, para os especialistas, os homens têm muito a aprender com elas. “No caso do câncer de próstata, o paciente não sente nada. Costumo dizer que essa doença não mata no local. O paciente, quando começar a sentir, por exemplo, uma falta de ar, será porque o câncer já migrou para o pulmão. Uma dor nos ossos, por exemplo, é porque já se espalhou. Se a doença já está apresentando sintomas é porque, infelizmente, o homem já é um paciente paliativo, ou seja, já não tem como curá-lo”, adverte o urologista Fernando Henrique, defendendo o rastreamento precoce da doença.
O médico pontua que o homem não vai ter dificuldade de urinar ou defecar sangue, que são sintomas, frequentemente, associados pelas pessoas de forma errada ao câncer de próstata. “Essa é uma questão muito comum que provoca confusão, pois acontece quando há o inchaço da próstata, chamado de hiperplasia benigna. Esse inchaço abraça o canal da urina, e o paciente tem dificuldade de urinar, vai apresentar um jato fraco, vai levantar entre quatro e cinco vezes à noite para ir ao banheiro. É uma doença benigna. Com o câncer de próstata esses sintomas podem até ocorrer, mas só em casos muito avançados, terminais, em que a doença já se espalhou e já não existe possibilidade de cura.”
Glândula
A próstata é uma glândula que se localiza na parte baixa do abdômen do homem. Ela é um órgão pequeno, tem a forma de maçã e se situa logo abaixo da bexiga e à frente do reto (parte final do intestino grosso). A próstata envolve a porção inicial da uretra, tubo pelo qual a urina armazenada na bexiga é eliminada. A glândula produz parte do sêmen, líquido espesso que contém os espermatozoides, liberado durante o ato sexual. Alguns tumores que acometem a próstata podem crescer de forma rápida, espalhando-se para outros órgãos e podendo levar à morte. A maioria, porém, cresce de forma tão lenta (leva cerca de 15 anos para atingir um centímetro cúbico) que não chega a dar sinais durante a vida, nem a ameaçar a saúde do homem.