Ícone do site Tribuna de Minas

A história não contada da Vila da Prata: lembranças da moradora Carlinda Gerheim

leonardo costa Carlinda Gerheim
Carlinda Gerheim tinha cerca de 18 anos quando foi morar na Vila da Prata (Foto: Leonardo Costa)
PUBLICIDADE

Era quase véspera de Natal. Um dia comum, até então, para os moradores da Vila da Prata, uma antiga comunidade que ficava localizada entre os bairros Teixeiras e Aeroporto, na região Sul da cidade. No entanto, em 22 de dezembro de 1981 tudo mudou. Já se passaram 44 anos, mas Carlina Gerheim lembra nitidamente desse dia, como se fosse hoje. “Foi terrível para todo mundo. Acordamos com muito policial, acho que tinha uns 40 policiais. As máquinas revirando, passando pela horta bonita, tinha pé de café, de bananeira… era o nosso sustento.” Assim, a mando da Prefeitura de Juiz de Fora, sob a gestão do então prefeito Mello Reis, a vila foi destruída para dar lugar ao Parque da Lajinha e ao projeto do acesso que ligaria as cidades de Juiz de Fora e Rio de Janeiro.

Carlinda tinha por volta de 18 anos quando foi morar na Vila da Prata junto com sua mãe. Por lá se casou, a família aumentou – tinham 11 crianças – e, junto com o marido, mantinha uma olaria onde produziam tijolos. No dia em que tudo aconteceu, ela estava fazendo café no fogão a lenha quando começou a escutar os barulhos das máquinas bem cedo, por volta das 7h. “Foi muita tristeza ver a casa sendo derrubada, era marreta para todo lado, crianças chorando, animais assustados, moradores passando mal. A gente não tinha para onde ir, ficamos sem chão.” De acordo com a moradora, a prefeitura apareceu sem aviso, embora a população soubesse que já existia a vontade de tirá-los dali, só não esperava que seria da forma que foi. “A prefeitura já queria tirar o pessoal daqui. O prefeito falava que a gente enfeiava a cidade.”

Cerca de 200 pessoas moravam na antiga Vila da Prata (Foto: Humberto Nicoline)

Pelo que Carlinda recorda, cerca de 200 pessoas viviam na vila. Dois anos antes do ocorrido, uma parte dos moradores foi levada para o Bairro Santa Efigênia. Restaram aproximadamente 100 moradores, que resistiram às pressões e ficaram por lá até 22 de dezembro de 1981, antes de serem retirados e transferidos para o Bairro Santo Antônio em loteamentos precários. “Era um cômodo. Sem água, sem luz, sem rede de esgoto. Sem porta, sem janela, sem nada.” Carlinda e seu companheiro foram os últimos moradores que permaneceram no local meses depois do ocorrido. “A gente perdeu tudo. A minha mãe foi morar num estábulo de cavalo”, conta Carlinda, que também menciona o apoio da comunidade. “O povo de Juiz de Fora foi muito solidário, trouxe comida para a gente no Natal, e roupa, que a gente nem tinha roupa para vestir.”

PUBLICIDADE

Hoje, aos 64 anos, ao voltar ao local da antiga Vila da Prata – atual Parque da Lajinha-, as lembranças daquele que, conforme ela foi o pior Natal de sua vida, revivem. Carlinda reconhece o espaço onde ficava o fundo do seu quintal e vê algumas árvores antigas que permaneceram. Saudosa, ela diz que a vida ali era boa. “Todo mundo tinha horta, criava porco, galinha… as pessoas se ajudavam.” Mas as recordações trazem mais dor do que saudade. “Eu não venho aqui não. É muito triste.”

 

Sair da versão mobile