O velório do empresário Abilio Diniz, que morreu neste domingo (18), aos 87 anos, ocorrerá das 11h às 15h desta segunda-feira (19), no Salão Nobre do MorumBis, estádio do São Paulo, o time do coração do empresário. O velório será aberto ao público, mas o enterro, cujo local não foi revelado, será reservado aos familiares.
“Um dos maiores e mais inovadores empresários do Brasil, Abilio sempre se guiou pelos valores que construiu ao longo de sua vida, pautada pela fé, pela disciplina, pelo amor à família e ao seu país”, diz nota divulgada pela família de Abilio.
“O empresário deixa cinco filhos, esposa, netos e bisnetos, e irá ao encontro do seu filho João Paulo, falecido em 2022. A família agradece a todas as mensagens de apoio e carinho neste momento tão difícil”, diz o comunicado.
Abílio Diniz morreu em consequência de insuficiência respiratória. Ele estava internado há três semanas no Hospital Albert Einstein com pneumonia. O empresário viajou em janeiro para Aspen, no Colorado (EUA), enquanto se recuperava de duas cirurgias no joelho. Ele se sentiu mal e voltou às pressas para o Brasil.
Diniz foi um empresário relevante no setor de varejo e transformou o Grupo Pão de Açúcar, fundado por seu pai, Valentim Diniz, numa das maiores empresas do setor no País.
Esposa de Abilio Diniz lamenta a morte
Geyze Diniz usou as redes sociais para lamentar falecimento de seu marido. Em mensagem publicada nas redes sociais, a esposa do empresário declarou que a vida sem ele “não será mais a mesma”, mas as “lindas memórias ficarão eternizadas”. “Faltam palavras e me sobra dor e tristeza, mas me sinto em paz e tenho muita fé em Deus, acreditando que era o seu momento de fazer sua passagem. Neste período, imagino que você estava em sua cura espiritual, enquanto nos preparávamos (se é que isso é mesmo possível)”, disse.
Geyze e Abilio se conheceram nos anos 2000 e casaram em 2004. O casal teve dois filhos, Rafaela e Miguel. “Uma jornada incrível, repleta de amor, compreensão e momentos inesquecíveis”, descreveu a empresária ao celebrar o aniversário de 19 anos de casamento, em dezembro de 2023, em uma publicação no Instagram.
A notícia de sua morte repercutiu entre parentes, amigos, autoridades e empresários, que destacaram em notas ou publicações em redes sociais seu legado de obstinação, empreendedorismo, dedicação ao trabalho e otimismo com o Brasil. Na publicação de Geyze, personalidades como Ricardo Amorim, Roberto de Carvalho, Preta Gil e Eliana enviaram mensagens à esposa.
Associação de Supermercados e empresários de luto
A Associação Brasileira de Supermercados (Abras) lamentou o falecimento de Abílio Diniz. “Um dos empresários mais importantes do país, com uma contribuição fundamental para o desenvolvimento do varejo. Abilio, com seu espírito empreendedor, transformou o Grupo Pão de Açúcar na maior rede varejista do País. Teve papel fundamental também na criação e fortalecimento da Abras, como um dos seus membros mais importantes. A Abras agradece Abílio pela sua liderança e contribuição ao setor supermercadista. A entidade presta suas condolências aos familiares e amigos deste ilustre empresário, que deixou um belíssimo exemplo de dedicação ao trabalho, à família e a toda a classe supermercadista. O nosso setor está de luto”, declarou em nota assinada pelo presidente da Associação, João Galassi.
O presidente do Grupo Bahamas, Jovino Campos, também se pronunciou sobre a perda. Segundo ele, o domingo, 18 de fevereiro, ficará na memória de todo supremercadista brasileiro.
“Perdemos o nosso grande líder, Abilio Diniz, uma pessoa que nos ensinou bastante como tocar o nosso negócio. Que já passou por várias dificuldades na vida, inclusive até sequestrado foi, e que mudou o setor, o varejo brasileiro, especialmente no supermercado. É uma pessoa que vai fazer muita falta, mas que nos deixou um legado, um ensinamento muito grande. Então, nós vamos ser sempre gratos a ele por tudo aquilo que ele fez para o país e que fez também para os empresários do setor. O que ele fazia, ele não escondia, ele passava para a gente. Então, a experiência dele nos serviu também para avançar cada um de nós nos nossos negócios. Vai fazer muita falta”, lamentou Jovino.
“Abilio Diniz levou alimentos brasileiros para o mundo todo”
Um dos maiores líderes empresariais do país por décadas
O grupo seguiu fazendo aquisições, comprando os tradicionais rivais Peg-Pag e Superbom. Nesta época já tinha negócios em Portugal e Angola. Eram os tempos do chamado milagre brasileiro, na fase mais dura da ditadura militar. Ao contrário de outros empresários, que em meados dos anos 70 começaram a pedir a abertura da fechadíssima economia brasileira, Abilio se manteve discreto, falando somente de negócios ou reclamando muito discretamente da inflação, que estava começando a ser um problema sério da economia e afetando a lucratividade do grupo. Em entrevista ao Estadão, em 1979, disse: “Inflação? Cada uma faça sua parte”.
Em 1981 foi criada a Companhia Brasileira de Distribuição (CBD). É neste ano que finalmente se une ao coro dos que pediam a abertura da economia. Quatro anos depois chegaria a estar numa lista de possíveis ministros do primeiro governo civil após a queda da ditadura, o de José Sarney. Logo depois sofreu com o congelamento de preços determinado durante o Plano Cruzado. As prateleiras dos supermercados ficavam vazias, Diniz chegou a ser indiciado, acusado de sonegar mercadorias. Numa entrevista, ironizou: “Fui de (possível) ministro a inimigo público número 1?.
Durante o segundo turno da primeira eleição direta para presidente da República após a ditadura militar, Abilio foi sequestrado, em 11 de dezembro de 1989, no Jardim Europa. Arrancado de seu Mercedes-Benz, foi levado para um cativeiro no Jabaquara. No quinto dia do sequestro, um sábado, enquanto a família negociava o pagamento de um resgate de US$ 5 milhões, a polícia descobriu o cativeiro. A casa foi cercada e foi iniciada uma negociação que durou mais de 24 horas. No dia seguinte, Diniz foi libertado e 10 sequestradores foram presos: 5 chilenos, 2 argentinos, um casal canadense e um brasileiro. Era a manhã do dia do segundo turno entre Lula e Fernando Collor. Na saída do cativeiro Abilio vestia uma camiseta do PT.
A capa do Estadão daquele domingo mostrava uma pesquisa do Instituto Gallup: Collor 44,9%, Lula, 44,4%. Até hoje, petistas acreditam que o fato contribuiu para a derrota de Lula. Ao sair do local, ainda assustado disse que aqueles tinham sido os piores dias de sua vida e deu detalhes sobre as horas que passou num buraco cavado no cativeiro. Depois, procurou não falar do sequestro. Muitos anos depois contou que teve de lidar com traumas psicológicos, ouvia barulhos estranhos e procurou um terapeuta. Mas que fez questão de seguir liderando o Pão de Açúcar como se nada tivesse ocorrido.
“Sempre encarei a vida como competição”, disse num trecho de uma entrevista ao Estadão ao comentar que tinha começado a competir no triatlo, a competição que reúne longos trechos de natação, ciclismo e corrida. Era o começo dos anos 90 e Abilio era visto aos fins de semana saindo ou entrando correndo da Península, a porção final e mais chique da Praia da Enseada, onde ficava sua mansão no Guarujá. O dono de um quiosque na praia sempre gritava quando a figura atlética passava: “Vai, homem de aço!”. Era referência ao Ironman, o nome da mais famosa competição do triatlo.
Abilio começou a competir ainda com mais garra também nos negócios. Ele tinha assumido a presidência do Pão de Açúcar em 1990 e em 1993 tornou-se o acionista majoritário. O grupo já enfrentava problemas financeiros com disputas familiares pela divisão do negócio. O quadro era agravado pela péssima situação econômica do Brasil vivida no governo Collor. Em 1990, o Pão de Açúcar teve US$ 32 milhões de prejuízo, débito grandioso para a época. Abilio mandou fechar um terço das lojas e demitiu mais de 20 mil funcionários. Após o ajuste, o grupo voltou a crescer.
O Plano Real, criado em 1994, auxiliou Diniz e seu estilo competidor. Lançou um pioneiro serviço de entrega, o Delivery, fez a abertura de capital (IPO) na Bovespa. Dois anos depois fez o mesmo na Bolsa de Nova York e tornou o Pão de Açúcar a primeira empresa varejista brasileira a ter ações negociadas em Wall Street. Para expandir o grupo, comprou redes de mercados de bairro, como Barateiro e Peralta.
Em 1999, fechou um grande acordo com o gigantesco grupo francês Casino, rival do Carrefour, que chegara ao Brasil em 1975 e se tornara seu principal competidor. Com dinheiro em caixa, comprou o grupo Sendas e o Sé. Em 2002 assumiu a presidência do Conselho de Administração e seu pai tornou-se presidente honorário. Significava que a partir daí o Pão de Açúcar passaria a ter executivos no comando da operação. Em 2005 foi criada uma nova holding, a Vieri Participações, dividindo a sociedade em 50% para a família Diniz e 50% para o grupo Casino.
Pelo acordo, Abilio continuaria na presidência do Conselho até 2012, mesmo que os franceses tivessem a maioria das ações (já tinham). Reportagem do The Wall Street Journal de junho de 2006 mostrava os esforços de Abilio para manter o Pão de Açúcar na liderança do mercado brasileiro com a recente chegada do grupo americano Walmart. “Como não pode combater a deflação, Diniz – que corre de manhã, malha na hora do almoço e joga squash à noite – está forçando sua empresa a entrar numa dieta de gastos… Para manter o ritmo, espera gastar US$ 1,1 bilhão nos próximos 4 anos”.
Com o Grupo Pão de Açúcar capitalizado, Abilio liderou a compra do Ponto Frio em 2009 e, meses depois, anunciou uma joint venture com a Casas Bahia, dando origem à Via Varejo. Estava criado o maior grupo de distribuição da América Latina (o negócio seria em seguida contestado pela família Klein, da Casas Bahia, que reclamou da valoração da empresa). Seu pai, Valentim dos Santos Diniz, tinha morrido em 2008.
Todavia, em 2011 Abilio quis romper o acordo com o Casino, propondo um negócio com o Carrefour, rival histórico do grupo francês Casino. Tinha o apoio do BTG Pactual e a propalada promessa de um aporte do BNDES. A disputa foi aos tribunais e em 2013, após acordo, Diniz deixou sua cadeira no Conselho do Pão de Açúcar. O Casino assumiria então o GPA e a Via Varejo.
Mas, a esta altura, Abilio já era presidente de outro conselho, o da BRF, a então recente e surpreendente fusão das marcas Sadia e Perdigão. Também passara a ser um dos maiores acionistas do Carrefour, através da Península Participações, que havia criado anos antes – com o nome em homenagem a seu lugar no Guarujá – para administrar a fortuna e os negócios da família. Ficou como presidente da BRF até 2018, quando foi substituído por Pedro Parente, então presidente da Petrobras. Continuou um grande acionista da BRF assim como do Carrefour Brasil e mundial, do qual foi conselheiro.
O competidor Abilio foi então lutar em outras frentes: já sócio minoritário da Wine, um e-commerce de vinhos, abriu a O3, uma gestora de fundos. “Sou jovem ainda, com filhos pequenos para criar, e gosto muito de trabalhar e aprender. Isso leva a gente para a frente em todos os sentidos”.
Em julho de 2022, porém, o empresário sofreu um grande abalo. Seu filho João Paulo Diniz morreu, aos 58 anos, vítima de um infarto fulminante. “Ontem a vida me deu o golpe mais duro que eu poderia receber e eu estou completamente sem chão. A dor que eu sinto é inexplicável. Meu filho João Paulo me deixou aos 58 anos, invertendo a lei natural da vida”, escreveu Abilio nas redes sociais. “Filho, peço a Deus que te receba com muita luz e dê forças para toda a nossa família enfrentar este momento tão triste e doloroso. João, eu te amo muito, meu filho, e sempre te amarei profundamente. Obrigado pelos 58 anos que você passou comigo, sendo meu grande companheiro.”
Em entrevista ao Estadão em fevereiro de 2023, afirmou que o Brasil estava “vivendo um grande momento” diante das perspectivas de oportunidades de ingresso de capitais internacionais que poderia receber no curto prazo. “A China se abre e nós somos o grande celeiro do mundo. Os EUA começam a se recuperar, a vencer a inflação e não devem enfrentar uma recessão profunda. O mundo apresenta condições para o Brasil ter grandes investimentos”. Na entrevista se definiu: “Sou um otimista”.
Meses depois desta entrevista, em junho, o Grupo Casino, endividado na Europa, anunciou que colocaria à venda o GPA. Já Abilio tinha iniciado a carreira de professor, em parceria com a FGV, e de apresentador de um programa de TV. Dava aulas de como competir.