
A hidrocefalia de pressão normal, também chamada de hidrocefalia normobárica, é uma condição neurológica que atinge principalmente pessoas acima dos 60 anos e pode passar despercebida por anos, justamente por seus sintomas serem frequentemente confundidos com os efeitos naturais do envelhecimento. A doença ganhou destaque recentemente após o cantor e compositor Chico Buarque ser diagnosticado com o quadro e passar por uma cirurgia na última terça-feira (3).
Segundo a assessoria do artista, o procedimento foi bem-sucedido e Chico se recuperou no “com seu habitual bom humor”. O cantor já recebeu alta.
Acúmulo silencioso
A hidrocefalia de pressão normal acontece quando há um acúmulo de líquido cefalorraquidiano (o líquor) no cérebro, sem aumento da pressão intracraniana. Isso torna o diagnóstico mais difícil, já que a pressão aparentemente estável não alerta para o problema.
Apesar disso, o excesso de líquido pode afetar três áreas principais: a cognição, a mobilidade das pernas e o controle urinário. De acordo com especialistas, é comum que os sintomas sejam confundidos com demência, Alzheimer ou mesmo sequelas de outras doenças, o que retarda o tratamento adequado.
Diagnóstico precoce no caso de Chico
Chico Buarque descobriu o problema durante um check-up de rotina, o que permitiu uma intervenção precoce. Ele foi submetido a um procedimento chamado derivação ventrículo-peritoneal, em que uma válvula é implantada para drenar o líquido acumulado do cérebro para a cavidade abdominal.
Segundo o neurocirurgião Fernando Gomes, professor da Faculdade de Medicina da USP e coordenador do Grupo de Hidrodinâmica Cerebral do Hospital das Clínicas, esse tipo de cirurgia é de complexidade intermediária e costuma apresentar bons resultados quando feito a tempo. “As funções afetadas costumam melhorar assim que a drenagem se normaliza”, explica.
Quando os sintomas enganam
Entre os principais sinais da hidrocefalia de pressão normal estão:
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Marcha magnética (o paciente parece ter dificuldade para tirar os pés do chão);
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Incontinência urinária;
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Declínio cognitivo.
Esses sintomas nem sempre aparecem juntos, o que também dificulta o diagnóstico. O neurologista Lucas Savelli, membro da Academia Brasileira de Neurologia, alerta que qualquer alteração na capacidade de andar, pensar ou controlar a urina deve ser investigada, especialmente em idosos.
“Às vezes o paciente já apresenta sinais há meses, mas eles são atribuídos a outras causas, como cirurgia de próstata ou Alzheimer. O diagnóstico definitivo costuma ser feito com exames de imagem, como a ressonância magnética, além de testes como o TAP test, que avalia a melhora dos sintomas após a retirada de parte do líquor”, detalha.
Uma condição mais comum do que se imagina
Estima-se que cerca de 480 mil brasileiros convivam com a hidrocefalia de pressão normal, muitos sem saber. De acordo com o Dr. Fernando Gomes, o quadro pode ser idiopático (sem causa conhecida) ou estar relacionado a traumas cranianos, infecções como meningite ou cirurgias cerebrais prévias.
Quando não tratada, a doença pode levar a deterioração severa da qualidade de vida, com perda da mobilidade, demência grave e incontinência. “A pessoa não morre diretamente da hidrocefalia, mas sua saúde se agrava muito com o avanço da condição”, reforça Gomes.
Prognóstico positivo com tratamento
A boa notícia é que, quando diagnosticada a tempo e tratada com o procedimento adequado, a hidrocefalia de pressão normal tem cura e permite ao paciente retomar suas atividades normais. O caso de Chico Buarque, que recebeu o diagnóstico antes de apresentar sintomas mais graves, é um exemplo claro de como o acompanhamento médico pode fazer toda a diferença.