Febre, calafrios, dor de cabeça, fadiga, mal-estar e tosse. São esses os primeiros sintomas frequentemente atribuídos a gripes ou até mesmo a dengue. Contudo, esses indícios também podem indicar uma zoonose mundial pouco divulgada: a febre Q.
Essa doença é transmitida aos seres humanos principalmente pela inalação de partículas de poeira contaminadas por animais infectados, como ovelhas, cabras e gado. Apesar de sua seriedade, a doença ainda é pouco conhecida na prática médica, conforme revela uma pesquisa de pós-doutorado realizada pelo farmacêutico e doutor em saúde, Igor Rosa Meurer, pelo Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).
Em entrevista à Tribuna, o especialista explica que a febre Q pode ser classificada em aguda e crônica. “Na fase aguda da doença, os pacientes geralmente apresentam sintomas parecidos com os da dengue e da influenza, como febre, dor de cabeça, dores no corpo, fadiga, dentre outros. Já na fase crônica, os pacientes podem desenvolver problemas mais graves como endocardite, osteomielite e infecções vasculares, podendo o paciente ir a óbito. Além disso, a febre Q tem sido relacionada à síndrome da fadiga crônica”, explica.
Em Minas, 20 municípios entre os 126 que fizeram parte da pesquisa, tiveram pelo menos um paciente com exposição prévia ao patógeno causador da doença, sendo eles: Arcos; Belo Horizonte; Belo Vale; Brumadinho; Campos Gerais; Cristina; Divinópolis; Igarapé; Lima Duarte; Mariana; Oliveira; Pedro Leopoldo; Rio Piracicaba; Sabará; Santa Bárbara; Santana do Deserto; São José da Barra; Sarzedo; Três Corações; e, Varginha.
Prevenção e diagnóstico
Igor também ressalta que a prevenção em humanos é realizada seguindo regras de higiene pessoal durante o contato com animais e de higienização dos espaços em que estão abrigados. “A vacinação em rebanhos de animais tem sido utilizada em alguns países, e tem tido ótimos resultados no controle da febre Q. Reduzindo a doença nos animais, é possível reduzir a contaminação ambiental e, consequentemente, o risco de transmissão ao ser humano”, diz o pesquisador.
Já o diagnóstico é feito por meio de métodos sorológicos, que têm a finalidade de detectar anticorpos e, em alguns casos, componentes antigênicos. Quanto ao tratamento, existem algumas estratégias, sendo a mais importante a utilização de medicamentos.
90% dos médicos desconhecem a febre Q
Durante sua pesquisa, o farmacêutico revelou que mais de 90% dos médicos desconhecem a febre Q, “uma doença infecciosa negligenciada”. A investigação, que entrevistou 254 médicos de hospitais, consultórios e Unidades Básicas de Saúde, mostrou que 236 profissionais, 92,9%, não tinham conhecimento da doença, e 228, 89,7%, estavam desinformados sobre aspectos clínicos, epidemiológicos e laboratoriais.
Dos 26 médicos que afirmaram ter algum entendimento sobre a febre Q, apenas três conseguiram responder corretamente mais de 50% das perguntas em um questionário estruturado com 25 questões. O estudo destaca a necessidade urgente de melhorar a formação e conscientização sobre doenças negligenciadas entre os profissionais de saúde, integrando as abordagens de saúde humana, animal e ambiental.
Por fim, o especialista destaca que é fundamental aumentar a divulgação e a conscientização sobre a febre Q no Brasil. “Órgãos competentes, profissionais de saúde e a população devem unir esforços para implementar medidas de investigação, monitoramento, controle e prevenção dessa doença, que ainda é negligenciada e subnotificada no país. A colaboração de todos é essencial para enfrentar esse desafio de saúde pública”, conclui o especialista.
*sob supervisão da editora Júlia Pessôa