É verdade, nem sempre a gente tem tempo para sair de casa e dar um confere no cenário musical da cidade assistindo aos shows ao vivo. Com isso, muitas vezes a gente acaba ficando por fora do que a música local tem produzido nos últimos tempos. Mas ela, a tecnologia, que tanto facilita a nossa vida, também não iria deixar o trabalho autoral dos juiz-foranos a ver navios. No Spotify, uma das plataformas de streaming de música mais usadas pelos brasileiros, é possível conferir o som de vários artistas juiz-foranos, de diversos estilos. Para dar início à sua playlist, selecionamos seis nomes disponíveis no aplicativo, mas para instigar a caça ao tesouro, adiantamos que há muito mais músicos e estilos da terrinha por lá. Vamos começar a desbravar?
Caetano Brasil
Quem ouve o disco solo do multiinstrumentista Caetano Brasil mal acredita que este acontecimento da música local tem apenas 22 anos. Seu disco, viabilizado pela Lei Murilo Mendes, é um passeio por sua trajetória e a certeza de uma sólida carreira que se anuncia. Tirando o clássico “Ó abre alas”, de Chiquinha Gonzaga, todas as faixas do disco têm a assinatura do músico e de parceiros. As composições traduzem o frescor e a versatilidade de Caetano, com o traço brasileiríssimo do choro, pegadas do universalismo do jazz e intervenções essencialmente caetanísticas, em arranjos, improvisos e “sobes e desces” sonoros. O disco tem participação de diversos outros artistas da cidade, mais um motivo para conferir o trabalho com ouvidos bem atentos, e para desmitificar a música instrumental de vez. Com Caetano, ela é moderna, vibrante, contagiante. Muito mais que um som ambiente.
Carlos Fernando Cunha
Os dois álbuns disponíveis do Spotify são essencialmente brasileiros. O mais recente, “Baobá”, transborda as raízes sambistas de Carlos Fernando, carioca de nascença, e sambista criado na bateria da Unidos do Vila Isabel. O álbum tem 11 faixas, composições suas e de parceiros e uma regravação do “conterrâneo’ Martinho da Vila, “Madrugada, carnaval e chuva”, em que faz dueto com Ana Costa, consagrada na cena do samba nacional. “Baobá” tem também a chancela de Wilson das Neves, que interpreta “De piedade” com Carlos. “Zeroquarenta”, o disco anterior, também já expressa o samba tão presente na vida do artista, mas possui também faixas que flertam com outras vertentes da MPB, como “Nhá Moça” e a bela ” A moça e o cello”, parceria com o mestre André Pires e bebe até na fonte das marchinhas, como “Perambulando”.
Guido Del’ Duca
O som de Guido é leve, melódico e fala de amor, dores e banalidades do cotidiano sem firulas, com destaque sempre para a voz e o violão do artista, mesmo quando há uma percussão marcada. Há uma clara evolução técnica do EP “Homem banda” para “Guido”, primeiro disco do artista, ambos disponíveis no Spotify. No primeiro, a voz mansa, as letras positivas e o instrumental delicado já estão presentes, mas o refinamento da gravação do disco valoriza ainda mais o som do artista. Vale ouvir com atenção a divertida “Quando te vi no Krismara” e a tão simples quanto bela “Lavo a louça”. Além dos dois discos, tem o single “A tal da beleza”, linda composição de Guido com participação de Marte MC e das crianças assistidas pelo Instituto Dom Orione, em que o artista voluntaria como professor de musicalização. Pra ouvir e ficar bem.
Laura Jannuzzi
“Ondes”, disco de estreia de Laura, é um passeio musical por sua carreira. O álbum tem composições que a cantora arriscava ainda quando cursava medicina e nem pensava na música como profissão, e também canções recentes, de uma Laura já escolada nos palcos, como a faixa-título. Um disco para ouvir inteirinho, no shuffle, na serenidade da voz da artista, que faz um som essencialmente brasileiro, costurado por fortuitas parcerias locais. As influências do som de Laura, claras em seu repertório, são uma antropofagia de Chico Buarque, Novos Baianos, Doces Bárbaros, Mutantes, Secos e Molhados, Marcelo Jeneci, Los Hermanos e Tulipa Ruiz. Em tempos em que tanto se canta gritando, a voz mansa, suave e doce de Laura é presente nos fones de ouvido.
Martiataka
Consolidados na cena autoral do rock juiz-forano, o Martiataka tem seus quatro discos disponíveis no app. Nos discos “”Rockæ Roll Combustível” e “Marginal”, a banda mete o pé na porta com um rockzão rasgado, despudorado, cheio de refrões marcantes e referências dos anos 60 aos 80. “Coração e tripas”, de 2014, faz uma viagem por gêneros que influenciam o sexteto mas que ainda não haviam sido explorados pelos marcianos: country, folk e blues. Acústico e gravado no Estúdio Versão Acústica, de Emmerson Nogueira, com produção de Nando Costa, o disco passeia por toda a carreira da banda e tem duas inéditas. A guitarra feroz dá lugar a arranjos de piano, banjo, violões, cordas e metais, sempre com a vivacidade e a autenticidade do Martiataka.
Matilda
Sonoridade e sororidade, dois traços que chamam atenção em “Patuá”, primeiro disco da Matilda, disponível no aplicativo. O trabalho da banda de mulheres mostra a harmoniosa reunião de várias influências das integrantes, Amanda Martins (flauta transversal), Bia Nascimento (violão), Fabrícia Valle (percussão) e Juliana Stanzani (voz). O disco passeia pelo samba, por baladas de riquíssimo instrumental e por lindas e originais referências a um clube como o delas, o da Esquina, dos mineiros que as precederam. Vale a pena prestar atenção especial à faixa de abertura, “Degradê em lua nova”, iniciada por um poderoso coro feminino, que arrebata qualquer ambiente. Mulherões da vida e da música. Logo ali, no Spotify.