
O Bom Velhinho pilotou seu ônibus até a madrugada do dia 25, quando, ao lado do fiel escudeiro, o cobrador Daniel Silva Pereira, que vestia um gorro vermelho, estacionou o veículo no Progresso para celebrar o Natal com os amigos passageiros. “O presidente (da Associação de Moradores) do bairro me convidou para um churrasco na casa dele. Jantei, tomei um guaraná e depois levei o ônibus para a garagem”, diz o motorista, que não tem dúvida em afirmar ter sido este seu melhor dia de trabalho. “Eu não sabia que daria tanta repercussão. Valeu muito a pena.”
E, antes que o dia clareasse, papai Julio foi até a casa onde os dois filhos moram com a mãe para deixar os presentes na árvore. Os meninos, de 3 e 6 anos, queriam muito ver o Papai Noel e chegaram a montar uma “armadilha”. “As crianças colocaram uma vassoura atrás da porta, que iria cair e fazer barulho logo que ela fosse aberta. Assim, iriam acordar e encontrar o Papai Noel”, conta o homem que, ao volante, fez a alegria dos filhos. “Eles moram no Progresso e me viram conduzindo o ônibus à tarde, mas não me reconheceram. Depois me perguntaram se eu era amigo do Papai Noel e se eu tinha emprestado o ônibus para ele.”
Para o Natal deste ano, Julio quer alegrar as crianças de outras regiões da cidade. A ideia, segundo ele, é que Papai Noel conduza o ônibus por uma semana, cada dia em uma linha diferente. “A Ansal nos apoia e nos incentiva.” “Quando o Julio surgiu com esta ideia do Papai Noel, nós achamos o máximo. Sabemos como esta época de Natal toca o coração da população e que a comunidade iria receber superbem.” comenta Rodrigo Reis, gerente geral da Ansal.
‘Sempre sonhei em ser motorista’
“Quando criança, morava no Bairro Santo Antônio e da janela de casa admirava os ônibus passarem. Dizia para a mãe: ‘Um dia ainda vou dirigir um carro desse’. A mãe não levava fé. No dia em que eu comecei a trabalhar na Ansal, fui na casa dela vestido com meu uniforme e ela quase não acreditou. Minha mãe só não teve o prazer de andar comigo, pois estava doente e morreu pouco tempo depois.”
Mas o que dona Clarice ensinou ao filho ele nunca esqueceu. “Quando meu pai morreu, eu tinha 1 ano de idade. Minha mãe trabalhou muito para não deixar faltar nada e ainda me ensinou as coisas boas do mundo. Graças a Deus, segui seus conselhos e sempre busquei o caminho certo.”
Caçula de três irmãs, Julio desde cedo acompanhava dona Clarice no trabalho como cozinheira das creches da Amac. Quando criança, era matriculado na instituição em que a mãe atuava. Depois, já adulto, gostava de ir às creches vestido de palhaço. O nariz vermelho ele ainda costuma carregar no bolso para alegrar os pequenos que entram no ônibus. “Adoro levar alegria às crianças, é gratificante fazer alguém feliz.”
Julio também recorre ao nariz de palhaço para amolecer o passageiro adulto, que, por algum motivo, nem sempre é amável. “Aprendemos em conversas e treinamentos com nosso supervisor que é preciso manter a calma ao volante, saber ouvir e ter a certeza de que não vale a pena discutir. Se o passageiro está nervoso e reclama, é preciso respeitá-lo.”
Mas, quando possível, é bom tirar um sorriso dele, não é mesmo Julio? “A gente é meio psicólogo. O passageiro desabafa, reclama, a gente até dá uns conselhos e vira amigo. Eu sempre sonhei em ser motorista e hoje me sinto realizado.”