O especialista em transporte coletivo urbano, José Ricardo Daibert, explicou, durante entrevista à Rádio Transamérica, que andar a pé é o modo de deslocamento mais usado pelas pessoas durante o dia, porém é o que menos tem planejamento. Enquanto a via do automóvel é bem cuidada, as calçadas estão cheias de obstáculos, como degraus, buracos e falta de material antiderrapante. A solução, segundo ele, é a mudança de foco por parte dos governantes.
“Não estamos querendo acabar com o automóvel. Estamos querendo que a prioridade que ele mereceu ao longo das últimas décadas no mundo e, principalmente, no Brasil, seja revista. Precisamos ter coragem de dar menos importância para o automóvel. Ele não vai deixar de existir, mas tem que deixar de ser o foco prioritário”, disse.
Para Daibert, o transporte público é a face mais triste da desigualdade social, porque é a população de baixa renda que mais depende desse meio de locomoção. Além disso, ele afirma que o modelo urbano expulsa do centro das cidades as classes menos favorecidas e as coloca nas áreas mais periféricas.
“Existe hoje uma questão muito crítica por conta do preço da tarifa, porque o serviço de transporte é caro. As pessoas estão sendo excluídas geograficamente e deixando de se deslocar. Só para se ter ideia, chega a ser três vezes maior o número de deslocamentos diários de uma pessoa de alta renda do que uma de baixa renda. Estamos criando um termo que é muito triste no Brasil: a imobilidade urbana. A pessoa deixa de se locomover por conta dos altos custos de deslocamento. Para resolver isso vamos ter que tocar na ferida que é a questão do financiamento”, explicou.
Juiz de Fora tem demonstrado uma sensibilidade grande para essa questão, afirmou o especialista. Por isso, ele acredita que a cidade pode sair na frente na solução para o novo modelo de financiamento. “Esse é o caminho para conseguir melhorar a qualidade e reduzir custo”.
Segundo Daibert, os governantes precisam oferecer caminhabilidade à população e isto não se restringe a dar um bom passeio, mas garantir o ir e vir com segurança. A correta engenharia de transporte deve pensar sempre primeiro no mais frágil, naqueles que têm algum problema de deficiência, no idoso, na criança e nos que apresentam dificuldade de locomoção.
“Nas áreas urbanas, precisamos devolver a cidade para as pessoas. Nós falamos que a felicidade está no caminho, mas hoje esse caminho está difícil. Por isso, quando queremos ir de um destino a outro, desejamos que tudo se dê como em um passe de mágica, porque o deslocamento é ruim. Precisamos dar caminhabilidade, ciclicidade para que esses caminhos possam ser, inclusive, espaços atrativos. Estamos com algumas expectativas e acredito muito também que Juiz de Fora sairá na frente na questão da mobilidade urbana sustentável”, observou Daibert.
Automóveis promovem cinco vezes mais acidentes
O automóvel é o pilar de uma mobilidade insustentável. Ele é responsável por provocar cinco vezes mais acidentes, gerar cinco vezes mais poluição e ocupar 20 vezes mais espaço.
“Se colocarmos a história do homem em um tempo de 24 horas, percebemos que o automóvel apareceu nos últimos 35 segundos para dar mais fluidez e segurança no trânsito. Hoje, ele congestiona e mata. Alguma coisa está errada. O automóvel é um projeto que funcionou durante um período e que ainda vai ter sua função, mas não como pilar dos deslocamentos necessários, principalmente dentro das áreas urbanas. Os pilares hoje da mobilidade sustentável são o transporte coletivo, a bicicleta e o andar a pé”, detalhou o especialista.
Segundo ele, o Brasil ainda não dá a atenção que o transporte merece, mas tudo caminha para que comece a mudar. Há, inclusive, dois estudos em nível nacional que propõem até mesmo a tarifa zero. “Ou seja, nunca teve tanto movimento no país para falar sobre financiamento do transporte coletivo. Esse tema precisa ser mesmo muito debatido, para que as pessoas possam deixar seu automóvel em casa e desfrutar de um transporte coletivo público digno”.