“O cara que criou este carro tinha uma inteligência fora do normal.” Assim definiu o presidente do clube de carros antigos de Santos Dumont, Thiago Oliveira, ao falar do seu Fusca modelo 1978. Ele e outros 80 proprietários do modelo clássico da Volkswagen se reuniram na manhã do último domingo (24) no Bairro Mariano Procópio e, de lá, saíram em carreata pela Avenida Rio Branco, chamando atenção de todos que estavam ao redor. O encontro, promovido pelo Família Vintage Club, tinha por objetivo comemorar o Dia Municipal do Fusca que, por força de lei sancionada em dezembro do ano passado, é celebrado todo dia 28 de junho na cidade. A data, aliás, é emblemática: trata-se do aniversário do ex-presidente da República e juiz-forano Itamar Franco, o último chefe de estado a incentivar a produção do Fusca no país, entre 1993 e 1996.
O “cara inteligente” que criou um carro compacto — líder mundial de vendas até hoje — foi o engenheiro alemão Ferdinand Porsche. A pedido de Adolf Hitler, foi planejada a concepção de um veículo automotor econômico que pudesse transportar até cinco pessoas alcançando velocidade de até 100 quilômetros por hora. Deu tão certo que o Fusca em poucos anos ganhou mercado além das fronteiras da Alemanha Nazista. E o resto é história. Afinal, foram 21,5 milhões de unidades fabricadas e comercializadas em cerca de 60 anos de produção. Com um detalhe: a base da carroceria sempre foi a mesma, com pontuais alterações feitas ao longo dos anos. Detalhes que leigos não conseguem observar, mas especialistas em Fusca sabem de cor.
Leo Marchiori, 47 anos, do Clube do Fusca de São João Nepomuceno, é um conhecedor da história do carro. O dele, ano 1972, verde, é um modelo que, de tão conservado, parece ter saído recentemente de fábrica. “Na verdade eu comprei ele azul, bem danificado, e fui fazendo as transformações. Me dei de presente quando fiz 42 anos, e o carro tinha 40. Da versão original ainda falta trocar o volante.” Praticamente nada, para quem se deparou com um veículo com o painel todo arrebentado, motor sujo e peças enferrujadas. Ao ser perguntado se estava próximo à perda total, ele foi enfático: “De forma alguma. Fusca só chega ao fim se abandonar embaixo de uma árvore”, respondeu.
Paixão e investimentos
E é fato: para ter um Fusca, é preciso ter paixão pelo carro. Thiago Oliveira, do modelo 78, diz tratar-se de um hobby oneroso. “A brincadeira não é barata. A maioria das peças é cromada, mas as originais são encontradas enferrujadas. Precisamos mandar fazer o cromo, que custa bastante. Sem contar a manutenção periódica, pois ontem mesmo o mecânico foi em casa para tentar deixar o carro alinhado, e ainda não está 100%. Além disso, a gente precisa ter cuidado redobrado com o motor. O óleo eu troco a cada seis meses, e faço a revisão do carburador a cada oito.”
Embora seja um carro antigo, o Fusca não pode ser um item de garagem, disse Thiago. “Também não uso todos os dias. O problema é que o combustível não pode ficar parado, porque pode corroer o carburador.” Logo, é preciso rodar.
Comboio traz colorido à Rio Branco
O comboio de Fuscas em plena Avenida Rio Branco, na manhã do último domingo, deu um colorido a mais à principal avenida da cidade. Afinal, diferente dos carros fabricados no século XXI, trata-se de um modelo disponível nas mais inimagináveis cores. E há ainda quem faz do seu carro um item único. O do capoteiro juiz-forano Wildes Rodrigues, 38 anos, é um desses. Adepto da cultura Rat Look (“visual de rato”, em tradução livre), ele busca no lixo uma forma de encontrar a beleza.
“Comprei o carro (ano 1980) até novinho, mas fui substituindo as peças por materiais recicláveis. O que encontro no lixo e acho interessante, vou colocando. Também enferrujo a lataria e nem lavo o carro. Esta é a minha personalidade”, disse, dizendo que, apesar da aparência, o carro é bem conservado. O motor é cuidado, e os pneus, conservados. “Viajo com ele para todo lado e ainda levo minha filha.” Na concentração da carreata havia também o oposto, como um Fusca azul com os bancos de couro branco, um bege com rodas esportivas e outros mais modernos, equipados com insufilm e carpetes novos.
Representante do Família Vintage Club, Thiago Madella, 23 anos, define a paixão pelo carro: “É muito gostoso. Quando pequeno eu andava muito na Brasília do meu pai, e meu avô sempre teve um Fusca. Por isso, carro antigo, e principalmente Fusca, remete ao passado. Basta entrar para lembrar de boas histórias, sem contar o cheiro característico, o barulho do motor e até o chiado do velho radinho AM e FM”, disse o orgulhoso dono de um modelo 1979.