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Engenheiro ‘corta’ Fusca 1976 para os dias de sol

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Fotos: Leonardo Costa
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Depois de um agradável papo e um delicioso café servido por sua esposa, Nely, Nicolau Falabella me conduz pela sala de estar repleta de quadros. A pintura a óleo é sua grande paixão. Ele mostra uma série inspirada na Segunda Guerra Mundial e vamos rumo à garagem, onde estão três de seus tesouros: um Chevrolet Opala Comodoro 1982, um Puma GTS 1978 e um Fusca 1.300 1976, personagem desta reportagem. E, seguramente, não há no planeta um Fusca como o de Nicolau Falabella.

“Comprei esse carro para dar ao meu filho, que acabara de entrar na faculdade”, lembra o engenheiro aposentado, ex-diretor da Cesama. Mas logo em seguida apareceu um Fusca 1978, branco, “inteirinho”, e Falabella comprou também. “Estava muito melhor que o amarelo 1976, então o Bruno praticamente só andou nesse. E o outro ficou encostado na garagem.” Era virada do século, por volta de 2001.

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Entusiasta de automóveis clássicos, especialmente de conversíveis, Falabella comprou naquela mesma época seu primeiro carro aberto, um MP Lafer 1976. “Era todo original, ganhou vários prêmios em diversos encontros, em Juiz de Fora, em Vitória, em Teresópolis. Era um carro muito bonito”, recorda o engenheiro, que se desfez do estiloso veículo que imitava o clássico inglês MG TD utilizando mecânica de Fusca. Apenas 4.300 unidades do MP foram fabricados pela Lafer, indústria brasileira sediada em São Bernardo do Campo e que produziu carros entre 1974 e 1990.

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E o Fusca parado lá na garagem. A ideia de transformá-lo em um cabriolet veio pela TV. “Eu assistia a um desses canais fechados e eles estavam passando um rali em Mônaco, só com mulheres dirigindo carros conversíveis. A maioria deles era de Fuscas conversíveis. E eu com o amarelinho parado na garagem. Foi ali que decidi.” E pode-se dizer que a transformação do Fusca 1976 em um carro sem igual foi uma verdadeira saga.

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Corta, alisa, troca

Decidido a fazer do Fusca um cabriolet como aqueles do rali de Mônaco, Nicolau Falabella foi até um funileiro na Avenida Sete de Setembro. “A primeira coisa que fizemos foi tirar o teto. Mas aí apareceu um problema: era preciso reforçar a carroceria, pois senão o carro poderia ‘envergar’.” A solução encontrada foi passar uma espécie de trilho em torno da base de todo o carro, além de uma haste transversal como suporte. “Mas não era suficiente. Tínhamos que colocar uma targa para dar uma sustentação maior. Descobri um cara em Matias Barbosa que fabricava para-choques de caminhão em aço. Ele fez o serviço.”

Soldada a targa – espécie de santantonio que vai por cima do carro, entre os bancos dianteiros e traseiros -, surgiu outro problema: o para-brisa estava alto demais. Era preciso diminuir uns 12 centímetros, o que não era problema para o funileiro, mas e os vidros? “Fizemos um molde em madeirite e mandamos para São Paulo, onde um vidraceiro cortou na medida certa.” Foram embora os quebra-ventos laterais, e os vidros das portas, manuais, foram substituídos por elétricos usando máquinas de um Chevette. As setas, que originalmente iam em cima do paralama do Fusca, foram deslocadas para a parte inferior. “Acho que são de Corcel II.” Os retrovisores foram tirados e substituídos por modelos mais antigos do próprio Fusca.

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Aí veio a transformação que dá ao carro de Falabella sua maior singularidade: alisar todos os vincos que são característicos do clássico da Volkswagen. “Foi a parte que deu mais trabalho. Foram meses ‘alisando’ o carro, descaracterizando o capô dianteiro e a tampa traseira.” E as reentrâncias, que são a própria identidade do Fusca, desapareceram, conferindo ao carro um aspecto completamente diferente do original. Ainda há os bancos individuais retirados de um Audi – dois dianteiros e dois traseiros -, as lanternas Fafá de Belém retas e as rodas de Golf com quatro furos. E o motor 1.300 foi substituído por um 1.500. “Comecei em 2003 e fui terminar só em 2005.” De original talvez tenha sobrado 50% do carro. Placa preta, nem pensar.

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Paixão nacional

O Fusca de Nicolau Falabella não é um carro de garagem. Ele anda. E bastante. “Vira e mexe vamos a raids e encontros, para Cabo Frio, Vitória. Mas é um carro para se andar em dias de sol, de preferência naqueles dias bonitos de inverno”, conta o engenheiro, confessando que, no verão, sai apenas se não houver risco de chuva. Apesar de ter uma capota retrátil de lona, a vedação não é lá das mais confiáveis, assim como a do Puma. O prazer da direção vem justamente do vento no rosto, já que o Fusca é pouco confortável. “Vai a qualquer lugar, mas é duro.”

‘Os policiais me param para olhar o carro, não para pedir documentos.’

Nicolau Falabella

Enquanto me preparo para ir embora e ajudo a cobrir os carros com as lonas protetoras na garagem, pergunto a Falabella se nunca foi parado pela polícia com esse veículo tão modificado. “Sim, já. Mas os policiais me param para olhar o carro, não para pedir documentos”, diverte-se, certo de que, naturalmente, há uma grande simpatia do brasileiro, polícia ou não, pelos Fuscas. E um tão diferente chama especial atenção. “O Fusca foi o primeiro carro de milhões de brasileiros. Foi o primeiro da maioria das pessoas da minha geração. E ainda hoje é um automóvel acessível. Talvez por isso esse meu carro chame mais atenção ainda. O pessoal olha e pensa: ‘dá para fazer'”, diz Falabella enquanto subimos as escadas. Antes, uma última olhada para o pneu que se deixa entrever sob a lona. “Tá meio baixo. Preciso dar uma volta.”

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