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Conheça Sil Andrade: artista pública que canta por Juiz de Fora

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“Ao passar, as pessoas levam a música que eu estou cantando. Se lembram de coisas, despertam memórias”, afirma Sil (Foto: Divulgação)
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Sil Andrade ama bossa nova. Sentada no Parque Halfeld, cumprimenta quem passa e encontra amigos da música, com quem se apresenta de vez em quando e faz trocas importantes. “O que mais tem nessa cidade é artista”, diz. Ela, que nasceu no Bairro Monte Castelo, mas já morou em Foz do Iguaçu, na Amazônia, em Brasília e em Lisboa, conta que aproveitou um pouco de cada lugar, e voltou para onde nasceu para fortalecer suas raízes. Afirma que sabe bem do que está falando – hoje, ela vive totalmente dedicada à arte e cultura, após ter sido aposentada como servidora pública. “Eu sou sexy…sexagenárea”, brinca. A cidade a inspira, e por isso é possível encontrá-la cantando em espaços livres, como o recanto da bossa nova, próximo ao Banco do Brasil, no Centro da cidade, e também em feiras de verduras e na rodoviária. Para ela, ocupar esses espaços significa levar música para todos e fazer com que as sensações e memórias sejam democratizadas: “É resistência. Eu tenho o microfone, eu tenho a voz”.

A sua trajetória na música começou quando ela ainda tinha 5 anos e morava em Foz do Iguaçu. “Eu nasci em Juiz de Fora, mas entre 15 e 20 dias, meu pai já me levou embora”, revela. Na época, a família toda se mudou porque ele era militar, e lá Sil foi chamada para cantar na Rádio Cultura da cidade. “Minha mãe me ajudou, ensaiamos uma música da Vanderleia. Mas eu não me lembro de ter ido me apresentar. Provavelmente, eu ‘amarelei’. Mas foi meu primeiro contato com a música”, conta. Mais tarde, quando seus avós morreram, um tio foi morar com ela, e foi fundamental para que essa ligação fosse se estreitando. “Ele me via cantando no pau de vassoura, e começou a construir uns instrumentos pra mim. Era muito habilidoso, então fazia uns violões rústicos pra mim, com pedacinho de madeira, pregos e linha de pescar. Pronto, aí eu me envolvi de fato e não parei mais”, conta.

Logo depois, com 11 anos, ela ganhou de seu pai uma guitarra azul, contrabandeada do Paraguai. Foi fazendo aulas de música em todas as cidades que morava, mesmo que isso significasse estar sempre trocando de professores. “Nós moramos no Sul, fazíamos piquenique nas Cataratas do Iguaçu, quando ainda tinha sete quedas, e na Garganta do Diabo. Depois, fomos morar na Amazônia, durante três anos, e tive contato com integrantes do projeto Rondon, íamos para campanha de vacinação nas aldeias ribeirinhas. Estudei e fiz graduação em Brasília. Tive contato com o cerrado, que é muito legal, e o planalto central é um lugar maravilhoso”, relembra. Durante a pós-graduação, foi para Lisboa, com uma bolsa do Instituto Camões, e ficou durante três anos estudando, entre 2001 e 2004. O mais marcante, no período, foi o rigor do inverno, com o qual ela estava longe de estar acostumada, mas ela também destaca a oportunidade de conhecer mais sobre a história de outras colônias portuguesas na África, a partir de imigrantes como ela. “Tive um contato muito grande com o início da minha ancestralidade e o início da minha família. Foi um estudo bem empírico”, afirma.

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Depois da pós-graduação, voltou para Juiz de Fora. “Fiquei durante uns 10 anos tentando me entrosar com a arte e a cultura local. Até que conheci meu marido, Adriano Barbosa, que era meu músico, e começamos a ocupar os espaços públicos da cidade”, relembra. O lema dela, tocando nesses locais, é “sem ingresso, sem parede, com chapéu”. Eles queriam ensaiar o trabalho que ela já tinha e foram para “praças e espaços ociosos da cidade”. Desde então, fez trabalhos como o EP “TREMinhão”, “Mineirices & Poesia” e o recente “Mamão & Poesia”. Também se tornou Conselheira Municipal da Cultura. Seu trabalho consiste em conseguir que esses espaços possam mesmo ser de todos: “Já vamos para dez anos nessa luta, comigo ocupando mesmo os espaços públicos e consciente de ser uma artista pública. Nesse caminho, buscando os benefícios não só pra mim, mas pra todos os artistas de rua como eu”.

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Espaço de todo mundo

O gosto pelo ar livre é outra coisa que aprendeu com o tio: “Ele me ensinou a nadar, jogar futebol, bolinha de gude, caçar rã. Era muita liberdade, e aquilo me agradou. Eu fui me apossando disso e desenvolvendo. Na rua já tem o sol, o vento, as pessoas passando”. Ao longo do tempo, então, foi aproveitando os lugares de que mais gostava para cantar. Ela afirma, por exemplo, que nem canta sozinha em casa. A rua é o espaço inclusive no qual ensaia. Para ela, deixar as músicas só consigo não faz sentido.

Um dos lugares de que mais gosta de cantar é nas feiras de verdura, “porque a dona de casa também gosta de música”. Em sua visão, a vantagem de cantar para um público transeunte é que ela consegue impactar as pessoas em seu dia a dia, e vai para esses espaços sem pensar em quem vai prestar atenção ou não. “Ao passar, as pessoas levam a música que eu estou cantando. Se lembram de coisas, despertam memórias. Eu acabo recebendo um monte de presente. A comunidade me dá um retorno espetacular, e isso faz com que eu siga”, conta. Também foi em um dos espaços de rua, ainda em Portugal, que ela teve uma das experiências que mais a tocou.

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Nessa época, ela estava sofrendo com o inverno, e ficando em um estado “meio depressivo” pela falta de costume. Até que um amigo encontrou um computador na rua, o programou com cuidado e entregou a ela. Sil, então, ficou em casa escrevendo, e, desse momento, surgiu um livro inteiro, com 40 crônicas. Três delas foram publicadas por lá, e em uma, “O som do Rego”, narra um dia de primavera no bairro em que morava. “Peguei o violão e fui pra praça tocar. Apareceram ciganos, portugueses, alguns brasileiros e africanos. Todos foram me ver tocar. Foi uma coisa linda”, diz.

“Vou e faço”

Sil admite que é uma pessoa prática e independente, e atribui muito disso à sua criação como escoteira. “Eu trago as técnicas dos escoteiros pro meu dia a dia, pra música. Pra mim, por exemplo, as medalhas são comuns, meu pai era cheio, no movimento te dão várias, então é algo comum, sabe? Mas o reconhecimento da comunidade é que me emociona, e ocupar espaços também”, diz. Essa força também se mostrou durante os períodos mais difíceis, como as situações em que precisou enfrentar de frente o racismo, as burocracias que exaurem os artistas e o falecimento de seu marido, há quatro anos, que também era um grande parceiro na música. “Foram coisas que me impediram durante um período, mas a vida segue”.

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Para ela, o essencial em todo esse processo é respeitar as próprias emoções e entender que se tem necessidade de colocar algo em prática, deve fazer isso por si mesma, mesmo que tenha muito trabalho pela frente. “Eu vou e faço o que acredito. Carrego meu equipamento e instalo sozinha, canto sozinha e levo pra casa sozinha”, afirma. Uma de suas opções para viver essa vida, inclusive, foi não ter filhos. “Não me arrependo. Queria conhecer os lugares, viajar, fui atrás de vulcão, mar morto, montanha. Fui e fui. Conheci a América Latina toda, a Europa e li muita literatura”. Nessa fase da vida, sua preocupação é sempre o futuro, porque diz que o que já fez, “já foi”. É por isso que também pretende voltar a escrever, depois de 20 anos afastada dessa área, e ir para Ibitipoca, vila que ama. “Na praça principal da vila tem um Ipê branco. Quando fica florido, fica muito bonito. Quero estar lá cantando, nesse lugar”, diz.

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