Thales Godoi brinca com a mãe que a aula de artes que começou a fazer quando criança e o fato de ter crescido escutando Milton Nascimento causaram um efeito borboleta em sua vida: virou artista. Aos 18 anos, ele se mudou de Timóteo, na região metropolitana do Vale do Aço, a mais de 300km de Juiz de Fora, para a cidade universitária onde iria cursar Faculdade de Artes. Também por volta dessa época, foi fazendo as primeiras experimentações na fotografia, sem saber que rumo aquilo tomaria. Para ele em sua vida de antes, aquela era uma possibilidade “quase alienígena”. Mas foram justamente as pequenas coisas em sua formação que despertaram a vontade de entrar de cabeça no mundo das artes e, mesmo tão jovem, resolver se arriscar por completo desenvolvendo um olhar próprio. Neste mês, ele também estreou sua primeira exposição individual, na Galeria Irineu Lomar, no Filezinho, que disponível até 10 de novembro.
A vontade de desenvolver melhor a fotografia veio enquanto ele editava fotos no próprio celular e teve vontade de ver como ficariam as imagens se fossem em uma qualidade melhor. Não podendo comprar uma câmera, viu que seu pai tinha algumas analógicas, e foi tentando experimentar fazer as fotos assim. “Meu pai nunca foi fotógrafo, mas era aquela pessoa da família que tirava as fotos e que tem as fotos, sabe? E ele também viaja muito, então lá em casa tem vários álbuns de família. Na pandemia a gente voltou naquilo tudo”, conta. Hoje, aos 21 anos, ele também entende que esse começo na analógica trouxe um outro olhar para a fotografia, que ele inclusive valoriza bastante, por esse modo diferente de se pensar a foto. “A analógica funciona com uma lógica bem diferente da que a gente tem hoje. Não só você não vê na hora, como tem toda uma expectativa para ver o resultado. Tirar foto se torna algo bem menos banal”, destaca.
Desde então, foi se dedicando cada vez mais, até que conseguiu comprar a primeira câmera profissional. Também na faculdade, foi estudando e podendo ligar as teorias ao que estava aprendendo na prática. Cita, por exemplo, o livro “Sobre a fotografia”, de Susan Sontag, e o olhar para uma fotografia quase surrealista, que “caça os acidentes na câmara”. Ele sente que, muitas vezes, é isso que procura. “Adoro quando a foto sai com resíduos ou manchas”, conta. Também pela influência dos estudos, começou uma bolsa no Museu de Arte Murilo Mendes (MAMM) e foi curador de uma exposição de arte abstrata no Tenetehara Instituto Cultural. Essa vontade de aliar o impulso artístico com uma composição bem racional o atrai, inclusive por considerar que assim não precisa ficar só refém da inspiração.
Apesar de estar traçando um caminho bem delineado, o jovem afirma que teve, sim, medo ao escolher a área das artes. Para fazer essa escolha e ter o apoio da família, inclusive, ele conta que fez um teste vocacional, e que também comprovou essa aptidão. Confirmações como a da bolsa de extensão e a exposição, em sua visão, servem para apontar que ele está no caminho certo. Mas, no fim das contas, também acha que não tinha como ser de outro jeito. “O André Bazin, crítico de cinema, fala que a fotografia é capaz de tornar uma parte do mundo virgem à nossa atenção e portanto ao nosso amor. Isso define perfeitamente. Não acho que a fotografia cria exatamente algo novo, parte da realidade. O que o fotógrafo viu, o olho também viu. Mas quando vira fotografia, faz a gente reparar melhor”, diz.
Primeira exposição individual de Thales Godoi
A sua primeira exposição individual reúne trabalhos que fez de diferentes maneiras. “Eu gosto de misturar bastante. Nessa exposição tem fotos preto e branco, pequenas, mais experimentais. E eu gostei disso. Acho que surpreende também”, conta, sobre esse processo. Ele sente que tem uma “falta de coesão” no seu trabalho que permite que ele brinque e experimente também, e por isso ele não pretende ter uma marca tão definida por agora, até para poder também se dar a chance de brincar com diferentes possibilidades.
Algumas de suas fotos preferidas surgiram do acaso. Antes daquela primeira câmera de seu pai estragar, o filme não avançou como deveria, e gerou duplas e triplas exposições. “São fotos impossíveis de reproduzir. Foram feitas quase em colaboração com a câmera, que é autora daquelas fotos tanto quanto eu.”
Para ele, dar esse efeito conjunto em uma exposição também é importante, entendendo o impacto que cada foto quando está junta pode gerar. E a possibilidade de fazer isso acontecer no Filezinho foi um verdadeiro encontro, já que ele também entende que esse é um espaço descontraído e que está próximo da população, algo que ele desejava bastante.
Fotografia como bênção
Todo o seu trabalho como fotógrafo em Juiz de Fora, cidade pela qual ele diz ter se apaixonado à primeira vista, também está relacionado às vivências que teve com outros fotógrafos da cidade. Ele cita, por exemplo, Sérgio Neumann, Eridan Leão, Pury e muitos outros como mentores. Para ele, aprender com os que vieram antes é essencial, e não consegue acreditar em quem fala que em Juiz de Fora “não tem nada para fazer”. “Acho que falta na rapaziada da minha idade a aproximação com quem vem antes, de querer aprender. E isso foi muito importante pra mim”, conta.
Com esses tantos amigos no meio, compartilha o que considera a maior magia da fotografia: aquele instante específico em que consegue capturar algo e pode também sentir o menino que foi se orgulhando do que ele se tornou. “Eu não sou uma pessoa muito religiosa, mas brinco com meus amigos fotógrafos que a hora em que a vida põe uma cena na frente da sua câmera é tipo uma bênção. Às vezes é um lampejo leve, e depois você percebe aquilo, e às vezes é uma força que vem na hora.”