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Conheça Crraudio: das margens ao Marginal Lab

CRRAUDIOFOTO Anderson Rangel
CRRAUDIOFOTO Joao Vitor 3
Em 2012, tornar-se DJ e produtor cultural foi algo que Crraudio percebeu que poderia mudar o cenário cultural em Juiz de Fora. A ação, entretanto, foi só uma consolidação do que ele percebeu que gostava de fazer desde criança: trabalhar com música (Foto: João Vitor)
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Quando Claudio Jr. Ponciano começou a ser conhecido como Crraudio, há 12 anos, enfrentava um dilema: nos bailes funks tradicionais, como pessoa LGBT, não se sentia completamente à vontade; nas festas voltadas para o público LGBT, não havia espaço para o funk de que ele tanto gostava. Precisava de um terceiro lugar em que essas duas partes dele pudessem coexistir – e onde outras pessoas pudessem aproveitar e se expressar juntas. Foi assim que o jovem, nascido em Ubá, começou a se engajar em movimentos que fizessem com que isso fosse possível. Ao se mudar para Juiz de Fora, em 2012, tinha como missão “fazer a cidade ser legal” para ele. Desde então, passou a trabalhar como DJ, produtor cultural e diretor de conteúdo, e foi assim que, das margens de uma cultura popular, conseguiu abrir portas. Até que, este ano, enfim, vai poder inaugurar, com outros dois amigos, o Marginal Lab.

A história do DJ com a música começou quando ele ainda era bem novo, a partir de um projeto social de musicalização do qual participou na infância. Isso já tinha aberto os olhos dele para um caminho que continuaria mirando por muito tempo, e que, mesmo ainda criança, já deixava marcas. “Descobri que um vizinho meu conseguia gravar CD no quintal dele. Pedi ajuda, porque queria ter as músicas que tocavam nas festas de família em uma lista só”, conta Crraudio. Naquele momento, ele relembra que até mesmo o vizinho foi percebendo como o tipo de seleção que ele fazia era pensada com cuidado. Ainda hoje, aquilo de que ele mais gosta nessa arte é justamente a possibilidade de contar histórias. “Estava numa festa, outro dia, e coloquei uma música do episódio 4 de X-Men 97. Ali da pista vi algumas pessoas se emocionando muito, trazendo memórias de volta e surpresas. Isso é muito bom”, conta.

Quando entrou na faculdade para se tornar designer de produtos, ainda em Ubá, Crraudio começou também a tocar em calouradas. “Sempre falo isso para os meus amigos ou pessoas que querem tocar. Testem junto às pessoas que vocês amam, porque se você conseguir deixá-las felizes, já mostra algo”, aconselha. Aquele momento foi importante para que ele conseguisse entender o que era o trabalho de DJ para fora das paredes do seu quarto, e nesse sentido, como entender o público e conseguir mexer com as emoções. Enquanto percebia o público de Ubá e ia criando oportunidades novas, foi também se aproximando de Juiz de Fora, até que se mudou para a cidade e começou a trabalhar como social media e designer no Café Muzik.

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Foi assim que Crraudio também foi conhecendo alguns de seus parceiros e inspirações, como a MC Xuxu, cantora trans de funk da cidade, e que ele considera pioneira em também trazer esse protagonismo LGBT dentro do cenário do pop e para este público. “A gente está aqui no Brasil, com uma influência gigante de músicas afrodiaspóricas, funk, reggaeton e todos os ritmos que nasceram a partir disso. (…) A gente vê muito mais disso agora, mas há oito anos era muito difícil. Só que a gente já acreditava que as pessoas iam gostar, porque a gente já gostava”, reflete, sobre essa vontade. O que parecia particular, no entanto, era coletivo, porque a cultura geral foi acompanhando esses esforços. “A gente nasceu junto com outros movimentos culturais, como Batekoo. Nessa mesma época, Beyoncé lançou o Lemonade, e acho que esse mundo pop foi percebendo que precisava de pessoas pretas. Hoje já estamos dentro desse imaginário. Naquela época, a gente estava desbravando”, diz.

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É ‘Makoomba’ mesmo

A ideia de ter um espaço físico ou metafórico que abraçasse essa vontade foi se intensificando, até que, junto com Amanda Fie e Ocrioulo, criou o Makoomba. “Se não estavam nos chamando, precisávamos criar um espaço”, diz. O projeto, que inicialmente era uma festa, foi incorporando as músicas afrodiaspóricas, como funk e reggaeton, que eram ainda mais marginalizadas no momento em que a festa foi criada, em 2015. Com o tempo, no entanto, o projeto foi crescendo: “Toda vez que a gente pensava onde essa festa funcionaria melhor, era na rua. A rua é o espaço mais democrático e, como artista, estar na rua é o melhor lugar, é onde você mais consegue se conectar com as pessoas. É uma energia”. Então, a festa virou um bloco de carnaval.

Para que fosse possível reunir a quantidade de pessoas que o Makoomba consegue atualmente, no entanto, foi preciso enfrentar resistência e ter paciência. “Como eu sempre toquei música afrodiaspórica, que tem uma presença forte de tambores, sempre tinha alguém que falava ‘nossa, isso parece música de macumba’. Aqueles comentários que vêm cheios de preconceito, né? Mas resolvemos assumir isso e ressignificar, como uma forma de dar a cara mesmo”, afirma Crraudio. Atualmente, considera que o projeto consegue, tanto pela vontade de seus idealizadores como pelo espaço que ocupam, mobilizar muito mais que só uma parcela de uma comunidade. “A gente vê famílias, crianças, a juventude, pessoas mais velhas. Todo mundo dançando junto, e dançando funk, que é algo que faz parte da nossa vida. Isso mudou a química do meu cérebro”, conta. Foi assim, também, que foi criado o Kaô Funk, pelo mesmo grupo, que focou ainda mais no funk.

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Abrindo portas e vindo junto com Crraudio

Logo no início da entrevista, Crraudio ressaltou que está passando por um momento de mudanças. Finalmente, aos 33 anos, sente que seus esforços estão se transformando em qualidade de vida e que pode dar ainda mais espaço para a sua vontade de criação, inclusive porque o trabalho como diretor de conteúdo tem possibilitado que use da linguagem que já tinha desenvolvido para trabalhar com grandes influenciadores. Um dos projetos que mostram isso é o Baile do Futuro, que vem sendo realizado anualmente, e que funciona como uma residência artística para ensinar pessoas pretas e LGBTs o que é produção. “Tudo que fez parte da nossa criação a gente tenta passar para outras pessoas, para elas poderem ter algo que a gente não teve, que é outras pessoas ajudando nesse processo”, conta. Em sua vivência, é preciso sempre abrir esses outros espaços. “Ensinar para outras pessoas e abrir esses caminhos só faz com que a comunidade em que você está inserido cresça. Conhecimento funciona rodando. Todas as vezes que faço residência ou dou monitoria de discotecagem, aprendo muito”, diz. 

Além disso, a criação do Marginal Lab consolida uma vontade também antiga, que era de ter o próprio espaço para conseguir experimentar. Crraudio Conta que recebeu a chave do local, que também está abrindo com Amanda Fie e Júlio Piubello, nesta semana.”Vai ser nosso laboratório de criação. Acho que vai ser um catalisador muito legal, inclusive para aprender a ter essa gerência. Estou muito empolgado, toda hora sonho se o público vai gostar. Vai ser algo novo para a gente”, diz Crraudio. O objetivo é ter um gerenciamento horizontal, em que tanto os artistas residentes quanto os garçons e responsáveis pela limpeza tenham parte nos lucros. A intenção, como Crraudio diz, é a mesma do começo – tornar não só Juiz de Fora, quanto Ubá e o mundo, um lugar legal para pessoas como ele, em todos os sentidos diversos que isso tem.

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