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Livro aborda Fake News e seus impactos na sociedade contemporânea

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Em “Fake News – A liberdade de expressão nas redes sociais na sociedade da informação”, André Faustino leva o leitor a refletir sobre conceitos, como campanhas de desinformação, deep fake e pós-verdade – Foto Divulgação
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Um dia depois de o presidente Jair Bolsonaro ironizar a Comissão Parlamentar (CPI) das Fake News, dizendo que seus apoiadores merecem receber, cada um, R$ 40 mil por atuarem como “robôs” na internet, o assunto do Sala de Leitura é o livro “Fake News – A liberdade de expressão nas redes sociais na sociedade da informação” (Lura), de André Faustino. Resultado de sua dissertação de mestrado, a obra leva o leitor a refletir sobre conceitos como campanhas de desinformação, deep fake e pós-verdade, que ganharam força no país nos últimos tempos.

De acordo com o autor, que é advogado, sempre o intrigaram a maneira como as pessoas agem nas redes sociais e como a noção de um espaço de liberdades irrestritas influencia o comportamento delas dentro desse ambiente. Por isso, tornou-se um estudioso do assunto e decidiu debruçar-se sobre alguns fenômenos que decorrem dessa liberdade de expressão, como os discursos de ódio e as fake news. “Esses fenômenos existem há muito mais tempo, bem antes do surgimento da própria internet, porém ganharam força dentro das redes sociais devido à facilidade de circulação desse tipo de conteúdo. Como minha pesquisa trabalhou, em uma parte inicial, com conceitos relacionados com a pós-modernidade, inevitavelmente, ela passou pela pós-verdade. Daí me aprofundei no estudo da pós-verdade como fenômeno legitimador de uma cultura baseada na desinformação. Com isso, passei a estudar as fake news e as suas diversas possibilidades de manifestação”, conta.

André Faustino é doutorando em Direito, mestre em Direito na Sociedade da Informação e bacharel em música.

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Marisa Loures – Segundo dados de uma pesquisa divulgada no fim do ano passado pelo Instituto Ipsos, os brasileiros são os que mais acreditam em fake news no mundo. Quais sãos os fatores que tornam o Brasil um terreno fértil para as notícias falsas?

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André Faustino – Nesta semana, a câmara dos deputados divulgou o resultado de uma pesquisa que mostra que os brasileiros consideram o WhatsApp como a principal fonte de informação, seguido de outras redes sociais. Essa pesquisa mostra bem a questão da relação do brasileiro com a informação na internet, evidenciando, claramente, o descompromisso com a qualidade dessa informação. Uma outra pesquisa que pode ser feita é bem simples. Basta buscar no google trends os resultados dos termos mais pesquisados no google no Brasil, isso mostrará a relação que os brasileiros têm com a informação. No ano de 2018, o termo mais pesquisado foi Copa do Mundo, e, em segundo, o termo Big Brother Brasil. Como fator determinante, acredito que a falta de educação é o principal deles. Não existem políticas públicas direcionadas à plena inclusão digital, esse tipo de iniciativa é fundamental para criar uma consciência do uso da internet de forma responsável.

 – Muitos sabem que estão lendo e publicando fake news. Apesar disso, como você mesmo diz, preferem acreditar nelas. Quais são as possíveis causas disso?

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Essa noção da indiferença com a verdade é a base do conceito de pós-verdade. As pessoas, hoje em dia, acreditam naquilo que lhes convém. Como a oferta de informação é muito grande e é impossível processar essa grande quantidade de informação disponível, é mais fácil se apegar a algo com base no apelo pessoal. E é essa relação dos indivíduos com a informação que irá criar um ambiente propício para o protagonismo da desinformação como vemos hoje. As causas são diversas, mas me concentro em três principais, que são a falta de uma educação que busque trazer a noção de inclusão digital, a descentralização da possibilidade de gerar informação, ou seja, hoje qualquer pessoa pode ser um canal de criação de informação, a própria dinâmica da internet e dos diversos meios disponíveis possibilitam isso, como sempre digo o Estado e a imprensa tradicional passaram a ter que dividir a prerrogativa da mentira com os indivíduos. E, por fim, a dinâmica de funcionamento da internet e das redes sociais que possibilitam o exercício quase que irrestrito da liberdade de expressão.

– Você leva para o livro o exemplo das eleições norte-americanas de 2016. Aqui no Brasil, essas notícias falsas polarizaram ainda mais o nosso país nas últimas eleições. Quais são os impactos que elas podem trazer em uma época como essa?

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As fake news nas últimas eleições presidenciais no Brasil em 2018 foram muito utilizadas como forma de amoldamento da opinião pública e, consequente, influência na escolha dos votos dos eleitores. O candidato que saiu vencedor no pleito eleitoral fez, quase que exclusivamente, a sua campanha eleitoral, não trilhou aquele caminho ortodoxo que se esperava de um candidato até então. Mas vale ressaltar que ele já vinha fazendo um trabalho pesado de atuação nas redes sociais muito antes do período eleitoral. Há quase quatro anos, ele trabalhava sua imagem como candidato nas redes sociais. Foram utilizados vários tipos de ferramentas como, por exemplo, uso de robôs, busca de apoio de influenciadores digitais como forma de legitimar um ou outro candidato e direcionamento de conteúdo. Vale ressaltar as propostas de campanha. Há muito tempo feitas pelos candidatos em geral, são um belo exemplo do que é desinformação. O resultado do uso da desinformação dentro de um ambiente de disputa eleitoral é o amoldamento da opinião pública, influência na opção de voto dos eleitores que se baseiam em mentiras e impossibilidade de uma discussão séria sobre as opções de voto.

– Na obra, encontramos a defesa da necessidade de limites ao direito fundamental da liberdade de expressão nas redes sociais. Como isso seria possível hoje?

– Até os direitos fundamentais possuem limitação, não existem direitos absolutos. Aliás, uma das características deles é, justamente, a relatividade, pois, quando em conflito com outros direitos fundamentais, pode sofrer uma limitação. Um exemplo disso é o caso das biografias não autorizadas em que ocorreu a colisão de dois direitos fundamentais, como a liberdade de expressão e a privacidade. Recentemente, Tim Berners Lee (cientista da computação) deu uma entrevista falando, justamente, da questão da regulação na internet. Esse assunto é bastante complexo, já que ainda paira a falsa sensação de liberdades irrestritas quando os indivíduos estão interagindo dentro das redes sociais. Acredito que seja necessário pensar o conceito de contrato social. A regulação na internet é um assunto bastante complexo, mas, sempre que discuto essa questão, penso no conceito apresentado por Lawrence Lessig (escritor norte-americano e professor na faculdade de direito de Harvard) em um livro chamado “Free culture”. Nele, ele propõe uma forma de regulação quadripartite através de leis, normas, mercado e infraestrutura, ou seja, devem ser levados em conta as várias formas de manifestação na internet. Buscar regular somente através de leis, não levando os outros pontos em consideração, torna ineficaz qualquer tipo de tentativa. O funcionamento da internet é bastante complexo para buscar uma regulação apenas de uma forma. Se pensarmos que existe, ainda, a deep web, fica mais desafiador refletir em uma forma efetiva de regulação, mas acredito que deva existir a busca por pensar a internet em seus vários aspectos e sempre trazendo a possibilidade de discussão pública, com uma noção multisetorial e multidisciplinar.

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Em um mundo onde não existe mais nenhuma verdade absoluta – como diria Camus só os loucos a possuem-, a pós-verdade evidencia essa efemeridade da informação e o descompromisso com ela. Portanto, compreender a sociedade em que vivemos hoje – alguns a chamam de pós-moderna, Bauman a chama de modernidade líquida – é fundamental para entendimento desse tipo de fenômeno social que ganha destaque, justamente, nesse contexto de um tempo onde só vemos os cacos da modernidade.

– O conceito de pós-verdade veio à tona no contexto de fake news.  A pós-verdade é um neologismo que descreve a perda de importância dos fatos objetivos diante da emoção e das crenças pessoas. Como você avalia esse fenômeno para a compreensão do mundo contemporâneo?

Primeiro, sempre gosto de pensar “o que é a verdade”? Essa pergunta persegue o pensamento humano há muito tempo. O fato é que não sabemos o que é verdade, ela nada mais é que uma convenção aceita por um grupo de pessoas, mas que pode não fazer sentido para outro grupo. Toda essa questão da relação com a verdade irá se relacionar com conceitos caros para a humanidade, como a ética e a moral. Ainda fica mais interessante se pensarmos que hoje não é nem mais o homem que define, em alguns casos, o que é verdade, mas, sim, um algoritmo. A pós-verdade é a manifestação, em sua plenitude, de como o individuo do mundo de hoje se relaciona com a informação. Se, na Idade Moderna, a informação era importante como forma de possibilitar a “construção” de um mundo, nos tempos atuais, ela nada mais é do que a própria mercadoria, a informação é dotada de valor econômico. Em um mundo onde não existe mais nenhuma verdade absoluta – como diria Camus só os loucos a possuem-, a pós-verdade evidencia essa efemeridade da informação e o descompromisso com ela. Portanto, compreender a sociedade em que vivemos hoje – alguns a chamam de pós-moderna, Bauman a chama de modernidade líquida – é fundamental para entendimento desse tipo de fenômeno social que ganha destaque, justamente, nesse contexto de um tempo onde só vemos os cacos da modernidade.

– É possível pensar em medidas de combate às fakes news e por quais caminhos elas poderiam surgir?

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É possível sim, mas para isso é preciso pensar esse protagonismo das fake news como uma consequência do tempo em que vivemos. Elas sempre existiram, a diferença é que a prerrogativa dessa mentira ficava nas mãos de poucos grupos, como o Estado e a imprensa. Com a descentralização dessa prerrogativa da informação, as fake news ganharam protagonismo, já que estão à disposição para qualquer um. Penso que a educação seja o principal fator, ou seja, dar a possibilidade para as pessoas terem o pleno discernimento e capacidade de se relacionarem com a informação ou com a desinformação. Essa questão da educação passa, principalmente, por uma noção de inclusão digital, uma espécie de alfabetização digital. Apenas franquear o acesso das pessoas à internet, criar uma série de leis, não tem nada a ver com inclusão digital. Essa visão deve ser sistêmica, através de uma discussão efetiva com os diversos setores da sociedade, como forma de buscar empoderar os indivíduos na relação com a tecnologia e com a informação. Devem existir políticas públicas direcionadas para esse tipo de ação, devem existir discussões e ações efetivas que permitam que as pessoas consigam compreender e interagir com os mais diversos meios tecnológicos. A compreensão desse novo mundo e a forma de como se relacionar com ele são fundamentais para evitar “analfabetos digitais”, que são os principais alvos e, de certa forma, propagadores da desinformação.

“Fake News – A liberdade de expressão nas redes sociais na Sociedade da informação”

Autor:André Faustino

Editora: Lura

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