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Claudia Biscotto: “Sofri bullying e acho que quase ninguém escapou de um por aí na vida”

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A dentista e escritora Claudia Biscotto conversa com a criançada sobre preconceito no livro “Carol e a receita mágica” – Foto Arquivo Pessol
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 O livro que apresento hoje foi escrito por Claudia Biscotto. Ela é dentista. Está acostumada a trabalhar com os pequenos, e, por isso, adquiriu um jeito todo especial de falar com eles. E, desde que estreou na literatura, tem falado sobre assuntos bem sérios.

“Carol e a receita mágica” (Paratexto, 40 páginas) traz a história de uma garotinha que tem muito afeto por comida. Ela é linda e alegre, mas bastou escutar três amigas de sua mãe fazendo críticas a seus hábitos alimentares e à sua aparência física para sua alegria dar lugar a muita tristeza. A partir desse momento, Carol torna-se mais uma vítima de bullying, um mal que pode trazer consequências arrasadoras à nossa saúde física e mental. “Rola, bolota, rola! Rola por aí”, dispararam as malvadas, para logo caírem na gargalhada.

“Eu não diria que o bullying sofrido pela Carol tenha sido, essencialmente, ‘gordofobia’. As amigas poderiam ter utilizado qualquer característica dela para fazer o bullying. Ser magra demais, usar óculos, ter uma deficiência física. Na verdade, o alvo era a mãe de Carol, e utilizaram da criança para atingi-la. Situação mais covarde ainda”, destaca a autora, justificando a opção por introduzir, na obra, a questão da alimentação.

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“Quis trazer essa discussão pelo fato da atual massificação de certos tipos estéticos tornarem-se alvo ou objetivo tanto de adultos como de crianças. É uma questão a se discutir muito. E lembrando que, durante a infância e a adolescência, as crianças passam por muitas mudanças físicas. Já observaram o quanto uma criança engorda antes de um estirão de crescimento? É natural, fisiológico. Carol se encontra nesta condição, e ela se alimenta bem, ‘saboreia tudo’, como ela mesma diz, tanto que seu jeitinho de gostar de comer nunca havia sido maldosamente criticado. Pelo contrário. Acho que essa foi a ruptura em seu coração”, completa Claudia, que planeja um lançamento presencial não só do novo livro, mas também de “A festa” (Paratexto, 24 páginas). Ah, também está em seus planos seguir por aí, de escola em escola, para conversar com a meninada.

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Marisa Loures – Normalmente, as situações que estão à sua volta inspiram sua escrita. Com “Carol e a receita mágica” também foi assim?

 Claudia Biscotto – Creio que nossa vivência sempre nos inspira, nos adverte, como nos transforma de alguma maneira. Pode ser através de um sorriso, de um piscar mais demorado de olhos, de um ruído ou mesmo em um silêncio. Meu olhar foi treinado para reparar os detalhes (sou dentista), as minúcias. E este olhar, eu o levei da profissão para minha vida. Em “Carol e a receita mágica”, não fujo dessa regra, mas ela não traz, necessariamente, características de uma única pessoa, de uma história vivida. São momentos ou questões que me incomodaram e assim me impulsionam em transformá-los em uma história, em um escrito, em criar um personagem, um ambiente. Gosto de escrever histórias, casos de família, relatos de viagens. Ler e escrever são uma grande diversão para mim. O meu pensamento flui, cria e recria imagens, e diversas possibilidades de escritas aparecem.

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– Seu livro faz o leitor entender o quanto o bullying pode fazer mal para uma pessoa. Carol, sua protagonista, entrou em depressão. Como a literatura pode ajudar a trabalhar, com as crianças, questões delicadas como essa?

A literatura é uma grande ferramenta para trabalharmos diversas questões, principalmente, as mais delicadas como estas de saúde mental. Atualmente, com a pandemia da COVID 19 e a necessidade de isolamentos social, escolar e familiar, além de mudanças de costumes bem diferentes do nosso dia a dia, estamos vivendo um boom de problemas de saúde mental, principalmente em crianças e jovens, que foram privados destas convivências, as quais são essenciais e muito importantes para seus desenvolvimentos físico, emocional e psicológico. Assim, com a literatura, de forma lúdica, podemos alcançar problemas guardados no cantinho do coração ou nos pensamentos, abordando os mais diversos assuntos.

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– Há quem diga que todo escritor de ficção coloca um pouco de sua própria história de vida nos livros que escreve. Você sofreu bullying na infância? Como conseguiu superá-lo?

Esta palavra “bullying” é bem atual, mas isto não quer dizer que só aconteça atualmente. É um velho e antigo problema. Se lembrarmos de nossa infância, da adolescência e até da vida adulta, encontraremos muitos exemplos de bullying. Quem não teve um amigo valentão ou brigão que determinava quem participava ou não de brincadeiras ou da turma? Ou um amigo a quem você confiou um segredo, e, em pouco tempo, a galera já sabia de tudo? Ou foi intimidado por um adulto próximo que te fala coisas para você “ser melhor”? Acontecem a todo tempo, com todos nós. Mas a maioria dessas situações, em geral, são resolvidas com o amadurecimento, e você segue seu caminho sem grandes problemas. Apenas as questões que tocam seu coração, que trazem uma ruptura consigo mesmo são as que precisamos rever para continuar. Sim, sofri bullying, e acho que quase ninguém escapou de um por aí na vida.

– No livro anterior, “A festa”, a personagem principal é uma menina que se esqueceu de escovar os dentes, e eles ficaram repletos de bactérias. Também é um tema importante de se tratar com a criançada e que traz uma mensagem para os leitores. Que estratégia você criou para tornar seu texto interessante, aos olhos dos pequenos, ao escrever sobre assuntos tão sérios?

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Fui criando essa historinha para minha netinha, para estimulá-la a escovar seus dentinhos antes de dormir. E, como ela amou, toda noite, quando passava uns dias em minha casa nas férias, eu tinha que contar a história da “Festa”. E ela vibrava, com a confusão causada. E, como você mesmo comenta, de um assunto tão sério, consegui trazer leveza, interesse e conhecimento da importância da higiene bucal. E essa história já foi lida por adultos, acadêmicos da saúde, que me relataram que escovaram seus dentes bem melhor lembrando-se da “Festa”. Muito especial ouvir isto, não? E nos meus livros sempre trago uma linda ilustração, pois como diz o ditado, “a imagem vale mais que mil palavras”. Assim eu posso trabalhar a leitura com diversas faixas etárias, sem problemas. De forma que, em um momento, pode parecer bem infantil, e, em outro, podemos avançar na idade dos leitores.

 

 

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“Carol e a receita mágica”

Autora: Claudia Bigotto

Ilustradora: Beatriz Nogueira

Disponível  no site da editora Paratexto.

 

“A festa”

Autora: Claudia Bigotto

Ilustrador: Thadeu Madureira

Disponível no site da editora Paratexto.

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