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Paulo Stucchi: “O espírito lendário mostra-se menos perigoso do que o homem”

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O jornalista paulista Paulo Stucchi lança “No fundo do rio” na Flijuf – Feira do Livro de Juiz de Fora, que começa hoje e segue até a próxima sexta-feira em formato on-line – Foto Divulgação
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“No fundo do rio” (Insígnia Editorial, 240 páginas), lançamento do jornalista e psicanalista paulista Paulo Stucchi, explora a lenda folclórica do boto cor-de-rosa, assim como fragmentos do Nazismo na Amazônia Oriental. Escritor confirmado para a segunda edição da Flijuf – Feira do Livro de Juiz de Fora, Stucchi já escreveu outros três livros de ficção com enredos históricos, entre eles “A filha do Reich”, obra finalista do Prêmio Jabuti 2020.

“Quando terminei um livro que atualmente se encontra no prelo na editora, eu queria escrever uma história de suspense e misticismo. Inicialmente, a presença nazista não estava no projeto, mas havia pesquisado sobre as expedições do Terceiro Reich na Amazônia na década de 30 e decidi cruzar os fatos. O gostoso da História é que ela nos permite criar, expandir, brincar com a verossimilhança”, assevera o autor, em entrevista a esta coluna, adiantando que, na obra, “o boto é apresentado como uma entidade que protege rios e matas. A presença maligna do homem explorador o faz agir.”

Assim que o romance começa, o leitor conhece o casal de protagonistas Bruno e Cecile. Ele, um sociólogo; ela, uma antropóloga francesa nascida na Guiana Francesa e radicada no Brasil e apaixonada pela cultura indígena. Cecile some misteriosamente no Rio Jari. Acreditando que a amada fora levada pelo boto cor-de-rosa, dois anos depois, Bruno volta a Guaiapis, um povoado fictício localizado no sul do Pará e Amapá, para descobrir a verdade sobre a lenda. Ao fazer isso, ele não só se vê diante de próprios traumas, mas também de mistérios ali escondidos.

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“Em uma de suas pesquisas, Cecile conhece o vilarejo, onde tem contato com uma versão bem mais sinistra da lenda do boto cor-de-rosa, que seduz meninas e as leva para o fundo do rio com ele. Também tem conhecimento sobre um assentamento nazista na região, e é a partir daí que os interesses do casal se cruzam, já que Bruno estuda sobre as influências do fascismo no Brasil. Tudo ocorre a partir daí. Quer dizer, mais ou menos – não posso contar para não estragar o suspense. De modo geral, Bruno e Cecile são um casal como qualquer outro; digo isso no sentido mais humano mesmo, com seus problemas, dúvidas e uma forte conexão. A ligação desses personagens é que conduzirá a trama até o fim”, conta  Stucchi, que conversa com o público juiz-forano na próxima quinta-feira, 15, às 20h.

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A abertura oficial da Flijuf 2021 ocorre nesta terça,13, às 19h, com um bate-papo com o ator Paulo Betti, e segue até a próxima sexta-feira, 16. O evento, que ainda inclui a presença de vários autores locais, será transmitido no Instagram – @feiradolivrodejf–  em dois horários. Pela manhã, das 9h ao meio-dia; e, à noite, das 18h às 21h. Lá também está disponível a programação completa.

Marisa Loures – O Nazismo também foi explorado em “A Filha do Reiche. De onde vem o interesse por esse assunto?

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Paulo Stucchi – Acho que o nazismo desperta interesse de diversos tipos de mídia pela abrangência de seu legado – um legado ruim, mas que existe até hoje. Também não podemos nos esquecer de que o nazismo tinha forte ligação com o misticismo, tendo o Terceiro Reich financiado expedições a diversos lugares do mundo à procura de objetos e locais lendários – inclusive a Cidade do Ouro na Amazônia. Isso, para enredos de ficção, é um prato cheio.

– Vemos o avanço do conservadorismo e ouvimos gritos de pessoas que pedem o retorno do autoritarismo. Aqui no Brasil, há quem clame pela volta da Ditadura Militar. Abordar assuntos como esse em livros de ficção é importante para fazer com que as pessoas não se esqueçam do que é viver sob um regime totalitário?

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Sem dúvidas. A liberdade de pensamento é a única liberdade verdadeira. Matar os sonhos do homem é tirar o que temos de mais humano. Isso é injustificável. Quem lida com cultura e, portanto, sonhos, não pode se calar. Não estou me referindo à política partidária; estou falando de humanidade e humanismo.

– As lendas folclóricas exercem um fascínio em muitas pessoas. Tanto é que livros, novelas, séries exploraram essa questão. Ao trazer a lenda do boto cor-de-rosa para esse romance, você resgata uma paixão antiga?

Na verdade, acho que o folclore brasileiro ganhou um novo gás recentemente, num movimento de resgatar a cultura nacional. Isso é muito importante. Não se trata de uma paixão antiga, mas, particularmente no caso do boto cor-de-rosa, enxergo uma dramaticidade muito interessante: um ser lendário que se transforma em homem, seduz e leva as mulheres para o rio. Essa não é a lenda original, segundo a qual o homem em forma humana engravida as moças – uma forma, na época, de justificar a gravidez fora do casamento. Mas enxerguei um gancho para desenvolver uma trama com outro viés; os leitores podem dizer se funcionou ou não.

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– No prefácio do livro, o escritor e músico Gustavo Rosseb avisa o leitor que você o carregará “pelos cantos sombrios do misticismo brasileiro”, devolvendo-o “com a experiência de ter saído de uma montanha-russa.” Lendo isso, lembrei-me de uma conversa que tive com um autor de literatura fantástica. Ele me disse que o mundo está muito árido e pouco místico. Estamos mesmo precisando de um pouco de misticismo?

Estamos precisando olhar para nosso íntimo, enxergar nossa essência. O melhor do ser humano brota quando ele ama. O amor é algo intangível e inexplicável, algo místico também. Acho que é disso que a humanidade precisa; compreender que o que deixamos são os rastros de amor que cultivamos, e não nossos cargos, dinheiro ou bens.

– Rosseb conta que se identificou com seu livro por ser brasileiro, “já que a história traz muito sobre nós.” A intenção era fazer com que o brasileiro se reconhecesse no seu livro, considerando que muito do que é consumido por nós em termos de ficção é colonizado pelo imaginário europeu?

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Acho que essa visão tem dois pontos: obviamente, não há nada mais brasileiro do que a cultura indígena, e, em segundo lugar, a africana. Não que a presença europeia não seja fundamental em nossa cultura, já que somos um povo sem uma linhagem étnica definida. Contudo, “No fundo do rio” conecta o leitor por ser um livro que fala, acima de tudo, do ser humano. Da dor da perda irreversível, de como lidamos com nossos demônios. Ao final, o espírito lendário que leva mulheres para o fundo do rio mostra-se menos perigoso do que o homem em si.

“No fundo do rio”

Autor: Paulo Stucchi

Editora: Insígnia (240 páginas)

Lançamento nesta quinta, 15, às 20h, na Flijuf – Feira do Livro de Juiz de Fora.

Transmissão no Instagram – @feiradolivrodejf

A abertura oficial da segunda edição da Flijuf ocorre nesta terça-feira, 13, às 19h, com bate-papo com o ator Paulo Betti. A programação segue até sexta-feira, 16.

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