Durante muito tempo, o destino das aves migratórias no inverno europeu foi um enigma para estudiosos. Sem tecnologia para rastreamento, teorias inusitadas surgiram. No século XVII, o acadêmico inglês Charles Morton sugeriu que as aves viajavam até a Lua para escapar do frio.
Embora hoje pareça absurda, a ideia refletia a limitação científica da época. Já Aristóteles, séculos antes, acreditava que algumas aves se transformavam em outras espécies ou hibernavam sob a água durante o inverno.
Ave flechada
A solução para o antigo mistério da migração dos pássaros só começou a tomar forma em 1822, com um acontecimento curioso no norte da Alemanha. Uma cegonha foi abatida e surpreendeu a todos ao ser encontrada com uma flecha de cerca de 80 centímetros cravada no pescoço. Apesar do ferimento, o animal havia completado um voo de milhares de quilômetros.
Ao ser analisada por especialistas da Universidade de Rostock, constatou-se que a flecha era típica de grupos do centro da África. Isso confirmou, sem margem para dúvidas, que a cegonha havia passado o inverno no continente africano antes de retornar à Europa.
O exemplar ficou conhecido como Pfeilstorch — termo alemão que significa “cegonha flechada” — e foi empalhado para fins científicos. Até hoje, permanece preservado na coleção zoológica da universidade, sendo considerado uma das primeiras evidências concretas da migração de aves entre continentes.

Migração dos pássaros
O caso da Pfeilstorch foi um marco na ornitologia. Até então, a teoria da migração baseava-se apenas em observações e suposições. A flecha africana atravessada no corpo da cegonha forneceu uma evidência física incontestável. Posteriormente, outros registros semelhantes reforçaram a hipótese: aves encontradas na Europa com projéteis africanos, comprovando a migração de longa distância.
Em 1899, o dinamarquês H.C. Mortensen introduziu o anilhamento, um sistema para monitorar aves marcadas. A partir daí, o estudo das rotas migratórias tornou-se mais sistemático e preciso. Ainda assim, a Pfeilstorch continua sendo um símbolo da investigação científica e do poder de coincidências reveladoras.