Uma recente decisão da 11ª Vara do Trabalho da Zona Sul de São Paulo trouxe à tona um importante debate sobre a responsabilidade das empresas em garantir a reintegração de funcionários após um afastamento por acidente de trabalho.
A notificação de uma empresa do setor de alimentos e bebidas a pagar R$ 20 mil de indenização por danos morais a uma promotora de vendas que não foi readaptada em novas funções após a alta do auxílio-doença gera sobre os direitos dos trabalhadores e as obrigações das empresas.
Entenda o acidente de trabalho e o afastamento
O acidente de trabalho em questão ocorreu em 14 de junho de 2005, quando uma funcionária sofreu uma queda enquanto abastecia uma prateleira. O impacto da queda resultou em uma lesão no joelho esquerdo, o que comprometeu em 20% sua capacidade laborativa, conforme atestado pericial. Após o acidente, a trabalhadora foi afastada de suas funções e passou a receber o auxílio-doença por parte do INSS.
Este afastamento durou de 30 de setembro de 2005 a 30 de novembro de 2023, quando um profissional foi considerado apto a retomar suas atividades laborais pelo INSS. Contudo, a sua volta ao trabalho não foi acompanhada de nenhuma adaptação das suas funções, o que levou a empresa a ser processada e condenada judicialmente.
Qual foi a decisão judicial?
O juiz Gustavo Kiyoshi Fujinohara, responsável pela sentença, foi claro ao afirmar que a empresa agiu de forma negligente ao não readaptar a funcionária em novas atividades compatíveis com suas limitações físicas.
A decisão foi fundamentada no artigo 476 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e no artigo 63 da Lei nº 8.213/91, que determinam que a alta previdenciária implica na retomada do contrato de trabalho, com as obrigações da empresa de garantir o pagamento dos contratos de trabalho.
O magistrado desde então que a indicação do INSS para que um trabalhador assumisse uma função administrativa não eximia a empresa de sua responsabilidade de readaptar um profissional, mesmo que as funções fossem diferentes daquelas que ela desempenhava anteriormente. Além disso, a decisão indicou que a omissão da empresa em oferecer uma nova função representava uma “barreira atitudinal” que impedia a plena inclusão do trabalhador.
A empresa, por sua vez, argumentou que a reabilitação do INSS não obrigava a readaptar a funcionária, alegando que não havia vagas compatíveis com as limitações da trabalhadora. No entanto, a justiça não foi aceita essa justificativa, entendendo que a empresa não poderia se eximir de suas responsabilidades.
Inclusão exigência de adaptação das condições de trabalho
Um ponto crucial abordado na sentença foi a questão da inclusão e da adaptação das condições de trabalho para os trabalhadores reabilitados. O juiz enfatizou que a reintegração de um trabalhador que passou por um processo de reabilitação deve ser acompanhada de ajustes adequados no ambiente de trabalho, garantindo que o colaborador consiga desempenhar suas funções de forma compatíveis com suas novas condições.
Segundo a decisão, exigir que o trabalhador apresente plena capacidade física e mental após um acidente de trabalho é uma forma de discriminação. A reintegração deve ser vista como um processo que inclui a adaptação das condições de trabalho, tendo em conta que o empregado passou por um longo período de recuperação e reabilitação.
A sentença também reforçou que as empresas têm a responsabilidade de garantir que seus trabalhadores, especialmente aqueles que sofreram acidentes de trabalho e passaram por reabilitação, possam retornar ao mercado de trabalho em funções compatíveis com suas capacidades. A missão da empresa, portanto, não pode ser aceita, e a decisão judicial impõe uma multa significativa como forma de reposição por danos morais causados ao trabalhador.
O “limbo previdenciário” e os danos morais
Um dos aspectos mais graves deste caso foi a situação conhecida como “limbo previdenciário”, onde o trabalhador fica sem salário e sem trabalho. Após a alta do auxílio-doença, um profissional não foi readaptado e não recebeu reviravoltas, ficando em uma situação em que, de acordo com a legislação, ela não deveria ser descartada pelo empregador, mas também não deveria ser mantida em um “vazio legal” sem uma função clara.
Este cenário gerou danos morais, pois o trabalhador ficou em uma posição vulnerável, sem a garantia de seu sustento e sem a possibilidade de retomar suas atividades profissionais. A instrução da empresa a pagar R$ 20 mil de indenização visa compensar esses danos, além de servir como um alerta para outras empresas sobre a importância de respeitar os direitos dos trabalhadores reabilitados e garantir sua inclusão de forma justa e adequada.