O governo de Jair Bolsonaro (2019–2022) foi marcado por uma série de políticas e decisões que geraram questionamentos em várias áreas, especialmente no que diz respeito ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Um dos episódios mais preocupantes envolve a assinatura de sete convênios que autorizaram entidades a fazer descontos irregulares sobre os benefícios de aposentados e pensionistas. Tais práticas resultaram em sérias fraudes que lesaram diretamente os beneficiários, sem o seu consentimento ou conhecimento.
Contexto da fraude no INSS
Durante os governos de Jair Bolsonaro e seus predecessores, uma rede de convênios foi estabelecida entre o INSS e diversas entidades, muitas das quais se envolveram em práticas fraudulentas de descontos sobre os benefícios dos aposentados e pensionistas.
Um levantamento realizado pelo jornalista Fernando Molica, do Correio da Manhã, revelou que ao menos sete desses convênios ocorreram durante o governo Bolsonaro, facilitando a implementação de cobranças irregulares nos benefícios.
A análise realizada pelo jornalista apontou que as entidades responsáveis por essas fraudes eram frequentemente as mesmas que dominavam o cenário das irregularidades, conforme identificado pela Polícia Federal.
A Controladoria Geral da União (CGU) e outras entidades fiscalizadoras chegaram a divulgar os números que revelavam o impacto negativo desses convênios sobre os segurados do INSS.
Entidades envolvidas e o valor dos descontos
O levantamento revelou que as entidades mais envolvidas nas fraudes e descontos indevidos eram, em sua maioria, associações que ofereciam serviços de assistência aos aposentados e pensionistas, mas que na prática desviavam parte dos benefícios.
O maior desconto identificado foi de 4,09%, um valor elevado que foi aplicado em um convênio firmado em abril de 2022 com a União Nacional de Auxílio aos Servidores Públicos (Unaspub), válido por cinco anos.
Outros descontos variaram entre 2% a 3%, mas o impacto cumulativo foi significativo, especialmente porque muitos beneficiários não tinham conhecimento das cobranças ou sequer autorizavam essas transações.
De acordo com investigações, a fraude acontecia de forma sistemática, com a autorização de descontos sem o consentimento dos aposentados, tornando essa prática uma violação direta dos direitos dos cidadãos.
Convênios e renovação de contratos
Em 2019, o governo Bolsonaro assinou convênios com entidades que facilitaram o desconto irregular sobre os benefícios. Um desses acordos foi com o Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos da Força Sindical, que teve seu desconto ampliado de 0,5% para 2,5%, até o limite de R$ 50,00 por benefício.
Esse termo aditivo, assinado no final de 2019, aumentou ainda mais a possibilidade de fraudes, visto que muitos aposentados nem sabiam da modificação nas condições.
Mais uma vez, o governo Bolsonaro manteve e renovou vários desses contratos em 2020 e até mesmo em 2022, o que gerou questionamentos sobre a falta de controle e fiscalização sobre essas práticas.
Embora o governo de Bolsonaro tenha sancionado leis que exigiam renovação anual desses contratos, a medida foi suavizada no Congresso, com a prorrogação do prazo de renovação para três anos, o que abriu espaço para a continuidade das fraudes.
Caso específico da associação de proteção aos aposentados e pensionistas
Outro convênio relevante e digno de destaque é o assinado em 29 de dezembro de 2022, com a Associação de Proteção e Defesa dos Direitos dos Aposentados e Pensionistas. Este acordo foi firmado três dias antes da posse de Luiz Inácio Lula da Silva, com a publicação no Diário Oficial ocorrendo em janeiro de 2023.
Este contrato envolvia descontos de 3% sobre os benefícios, e a crítica principal recai sobre o fato de que ele foi assinado em um momento delicado, com a transição de governo e o fechamento de um ciclo de práticas questionáveis.
Legislação e as alterações durante o governo Bolsonaro
Em meio às fraudes descobertas, o governo Bolsonaro tomou uma série de decisões legislativas e administrativas que afrouxaram ainda mais o controle sobre os descontos irregulares.
Uma das medidas mais controversas foi a inclusão de uma exigência de renovação anual das autorizações de descontos, prevista em uma Medida Provisória em 2019. No entanto, essa MP foi modificada no Congresso, com o aumento do prazo de renovação para três anos.
Em 2020, Bolsonaro sancionou a lei que permitia renovação das autorizações por até quatro anos, o que facilitava a perpetuação de tais práticas fraudulentas.
Já em 2022, a Lei 14.438 incluiu um artigo que eliminava qualquer possibilidade de controle sobre os descontos, tornando impossível qualquer tipo de verificação ou fiscalização sobre os acordos firmados entre o INSS e as entidades, contribuindo ainda mais para o cenário de impunidade.
Investigações em curso
A Controladoria Geral da União (CGU) tem sido fundamental na investigação dessas fraudes, tendo identificado a Caixa de Assistência dos Aposentados e Pensionistas do INSS como a entidade mais envolvida em desvios.
O contrato com essa entidade, assinado em maio de 2022, estabelecia um desconto fixo de 3% sobre os benefícios por cinco anos, e, como as investigações demonstraram, tal medida resultou em sérios prejuízos para os segurados, que não tinham conhecimento do que estava sendo descontado de suas aposentadorias.
Além disso, a CGU também identificou outros acordos que garantiram descontos irregulares e abusivos para uma série de entidades que atuavam como intermediárias, com a maioria dessas cobranças sendo feitas sem o devido consentimento dos beneficiários.
Consequências e o futuro da questão
As fraudes envolvendo o INSS e os convênios assinados durante o governo Bolsonaro geraram um clima de desconfiança e insegurança entre os aposentados e pensionistas.
A falta de fiscalização, a pouca transparência e as brechas legais permitiram que práticas abusivas se perpetuassem por anos, causando danos financeiros e psicológicos a um grupo já vulnerável da população.
A transição de governo em 2023 trouxe uma nova perspectiva sobre o tema, com o governo Lula retomando contratos e, em alguns casos, renovando acordos que já haviam sido denunciados.
A fiscalização mais rigorosa e o fortalecimento da transparência nas negociações de convênios são ações urgentes para que as fraudes não voltem a ocorrer.