Nos últimos anos, a realidade econômica e social do Brasil tem tornado o sonho da casa própria mais distante para muitos jovens. As dificuldades enfrentadas por essa geração, como a alta nos preços dos imóveis e as taxas de juros elevadas, têm gerado um cenário desafiador, e a percepção de que é mais difícil adquirir um imóvel do que em gerações passadas está se espalhando em conversas informais, discussões familiares e até memes nas redes sociais.
O mercado imobiliário brasileiro tem experimentado um aumento nos preços nos últimos anos. Em 2024, a inflação no setor imobiliário foi de 7,7%, superando a inflação geral e também a média global de 2,6%. As principais razões para esse aumento incluem o custo crescente dos materiais de construção e a escassez de imóveis disponíveis.
A pandemia contribuiu para uma desorganização nas cadeias de fornecimento, o que resultou em um aumento nos preços dos insumos e, consequentemente, no custo de construção.
Além disso, as cidades brasileiras, especialmente as mais densamente povoadas como São Paulo, enfrentam um aumento nas demandas por imóveis, o que também pressiona os preços para cima. Jovens relatam que a compra de imóveis em locais tradicionalmente mais acessíveis tornou-se inviável. O aumento de preços chega a níveis que tornam um imóvel de R$ 500 mil ou R$ 600 mil comum em regiões que antes eram consideradas acessíveis.
Taxas de juros elevadas
O cenário das altas taxas de financiamento também agrava a situação. A Selic, taxa básica de juros do Brasil, vem subindo desde 2020, e, em março de 2024, alcançou 14,5% ao ano.
Para aqueles que precisam financiar um imóvel, isso significa juros mais altos e parcelas mais pesadas. Esse aumento nos custos de financiamento torna o processo de aquisição ainda mais desafiador, já que os jovens, em sua maioria, não possuem o capital necessário para pagar uma entrada significativa.
O sonho da casa própria
A casa própria sempre foi um dos maiores sonhos de muitos brasileiros. Segundo uma pesquisa da Ipsos, 73% dos jovens brasileiros ainda sonham em conquistar a casa própria, mas 62% acreditam que está mais difícil comprar um imóvel do que em gerações anteriores. O alto custo dos imóveis e os juros altos para o financiamento afastam cada vez mais a realização desse sonho.
A relação entre os jovens e o mercado imobiliário tem mudado. Em vez de buscar um imóvel imediatamente após a entrada no mercado de trabalho, muitos estão adiando esse objetivo para um futuro mais distante.
Mudança de comportamento
Além da compra de imóveis, outro reflexo dessa realidade é o aumento da busca por aluguéis. Tradicionalmente, o Brasil tem uma cultura de compra de imóveis, mas a alta nos preços tem incentivado muitos jovens a optar pelo aluguel por mais tempo, o que é um fenômeno que já ocorre em outros países, especialmente na Europa.
De acordo com dados da Ipsos, 76% dos entrevistados que pagam aluguel manifestaram interesse em adquirir um imóvel, mas 36% acreditam que, devido aos altos custos, esse desejo não será concretizado. O aluguel, que antes era visto como uma opção temporária, está se tornando uma realidade mais permanente para muitos.
Geração desiludida
Muitas conversas entre jovens, seja nas redes sociais ou nos círculos familiares, destacam a percepção de que a geração atual tem mais dificuldades em comprar um imóvel do que as gerações anteriores.
Essa visão é compartilhada por muitos, que sentem que o cenário econômico mudou de tal forma que a casa própria, que antes era uma meta atingível na faixa dos 30 anos, tornou-se algo distante, se não impossível, sem um esforço significativo e mais tempo de planejamento.
Impacto das redes sociais
A maneira como os jovens lidam com as dificuldades para adquirir um imóvel também é influenciada pela forma como o tema é discutido nas redes sociais. Memes, posts e discussões sobre o assunto têm se tornado um reflexo da frustração e da percepção de que as condições para comprar imóveis são piores do que as das gerações anteriores.
A sensação de desilusão é crescente, com muitos acreditando que os preços continuarão subindo e que o mercado imobiliário será cada vez mais inacessível.
Essa visão negativa, entretanto, pode afetar a motivação e a persistência dos jovens, criando uma espécie de “niilismo” em relação à possibilidade de adquirir a casa própria. Para Marcos Calliari, CEO da Ipsos no Brasil, isso é uma consequência do discurso coletivo, que reflete um cansaço da geração diante das dificuldades enfrentadas.
Possíveis soluções
Apesar dos desafios enfrentados pelos jovens, existem algumas alternativas que buscam mitigar o impacto da alta nos preços e do financiamento. O governo brasileiro, por meio de programas como o “Minha Casa, Minha Vida”, oferece condições facilitadas de crédito para famílias com renda mais baixa.
Além disso, a implementação de planos urbanos em algumas cidades, que incentivam a construção de moradias com interesse social em áreas centrais, também tem se mostrado uma alternativa viável. Tais medidas podem ajudar a melhorar a oferta de imóveis mais acessíveis e, assim, possibilitar que mais jovens consigam realizar o sonho da casa própria.
A realidade dos jovens brasileiros em relação à compra de imóveis reflete um cenário complexo, que envolve fatores econômicos, sociais e culturais. Para muitos, o sonho da casa própria parece estar cada vez mais distante, mas isso não significa que o objetivo seja impossível.
A adaptação aos novos tempos e o planejamento financeiro estratégico podem ajudar a reverter esse quadro, mas a intervenção do governo e o ajuste das políticas públicas serão essenciais para garantir um futuro mais acessível à habitação.