Os X-Men mudaram de novo, e desta vez nós gostamos

Por Júlio Black

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Oi, gente.

Como comentei há duas semanas, minha relação com os X-Men andava bem fria nos últimos anos, para dizer o mínimo. Dei uma fuçada em meu cérebro quase senil para resgatar o que li do Universo X nas últimas duas décadas além do que já havia citado, e realmente é pouca coisa: os “Novos X-Men” do Grant Morrison, uma fase do Chuck Austen (eca), a volta do Chris Claremont na chatíssima “X-Treme X-Men”, os “Surpreendentes X-Men” do John Cassaday e do Joss Whedon, “Dinastia M”, alguma coisa da fase do Warren Ellis, e, mais para frente, “Vingadores vs X-Men”. Depois, comecei e desisti de ler a fase do Brian Michael Bendis, aí veio a “Morte do X” e, por fim, aquela decepcionante graphic novel “Chega de humanos”.

Continuaria assim se não tivessem recomendado tanto o “X-Men: Grand Design” do Ed Piskor, já elogiada por aqui, e também a nova fase escrita por Jonathan Hickman, que teve início em 2019 e foi tão elogiada pelos ah migos que resolvemos dar mais um salto de fé. Lemos as duas primeiras minisséries do roteirista com os mutunas, “Potências de X” e “Dinastia X”, e, pelo que vimos nessas 12 edições, acho que continuarei a ler os X-Men por bastante tempo.

Para curtir as minisséries, porém, precisei ter em mente um ponto muito importante: abraçar a história sabendo que perdi pelo menos 80% de tudo que aconteceu com os X-Men nos últimos 20 anos, e olha que era muita coisa. Por exemplo, todo mundo que morreu em algum momento e que agora está lá vivo, alegre saltitante: tem a Jean Grey em sua 47ª ressurreição, Cifra, Moira MacTaggart, Proteus, Banshee e Krakoa, entre tantos outros – mas, principalmente o Professor Xavier.

Lembro que o careca telepata morreu em “Vingadores vs X-Men”, teve o cérebro usado pelo Caveira Vermelha na fase de Hickman com os Vingadores e agora não só aparece vivo como está usando o corpo do Fantomex, além de andar o tempo todo com um balde de metal na cabeça, que é nada menos que o bom e velho Cérebro, agora numa versão portátil.

Quem conhece o Jonathan Hickman de outros carnavais sabe que o cara gosta de criar universos megacomplexos, e com os X-Men isso não muda. Leitores de “Projeto Manhattan” (Image Comics) e da fase do roteirista com os Vingadores sabe que ele curte sagas longuíssimas e cheia de novos conceitos e personagens e retcons, além daqueles personagens que ele resgata do limbo, como a turma do Novo Universo Marvel. Foi o que ele fez com os Vingadores, quando Os Heróis Mais Poderosos da Terra tiveram de enfrentar desafios e inimigos de escala universal, com o desfecho anos depois na saga “Infinito”.

As duas minisséries do universo mutante entregam o bom e velho (para alguns) Hickman de sempre: toneladas de retcons, plots paralelos que fazem parte de uma trama gigantesca, intrincada e que provavelmente vai durar anos e anos de acompanhamento, com os leitores precisando ficar ligados em vários detalhes. O roteirista pesa a mão em alguns dos seus já conhecidos cacoetes, como as páginas de textos explicativos sobre os conceitos e eventos que trabalha na história, a mudança no passado e importância de vários personagens, a introdução de novos nomes e a escala universal de eventos, com toda uma nova hierarquia de seres além de nossa compreensão.

Uma coisa que não falta a Jonathan Hickman é ambição, definitivamente.

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Enfim, vamos à história propriamente dita, ilustrada pelo espanhol Pepe Larraz em “Dinastia X” e pelo brasileiro R. B. Silva em “Potências de X”. Os personagens principais nas duas minisséries são o Charles Xavier e – surpresa! – Moira MacTaggart, que é mais importante até que o próprio Professor X, mesmo que apareça menos. Depois de tantos anos com a sua defesa de uma convivência pacífica entre humanos e mutantes – tirando os momentos que vimos que ele não era tão santo assim -, o Professor Xavier cansou de sonhar com a paz entre espécies e parte para o projeto de uma nação exclusivamente para os possuidores do gene X, localizada na ilha de Krakoa.

Para alcançar sua meta, ele oferece a todas as nações do mundo uma baciada de medicamentos que podem curar praticamente todas as doenças, todos desenvolvidos a partir de flores encontradas apenas em Krakoa – algo bem conveniente em termos de roteiro, convenhamos. Em troca dos medicamentos, Xavier exige o reconhecimento da nação mutante – onde é vedada a entrada a qualquer humano “normal” – e que ela tenha um assento na ONU (Organização das Nações Unidas) e o perdão dos crimes cometidos por todos os mutunas. A nova nação está aberta a todos os mutantes, e isso inclui gente boa como Apocalipse, Exodus ou a turminha do Clube do Inferno. Tudo que fizeram de errado no passado é esquecido, o que não pode é vacilar de novo.

Para essa nova realidade, a figura de Moira MacTaggart é a rocha onde Jonathan Hickman vai construir sua igrejinha mutante, pois graças à cientista escocesa temos um dos elementos mais conhecidos das histórias dos X-Men, e que faz com que a cronologia dos mutantes seja tão confusa: os futuros alternativos. São quatro as linhas temporais que acompanhamos, indo do início da equipe mutante e chegando a mil anos no futuro – e todas ligadas a Moira, que passa a ter influência nunca vista nas decisões de Xavier.

É confuso? Com certeza, imagino que até mesmo para quem tem acompanhado os X-Men fielmente por anos. Quem leu apenas alguma coisa nas últimas décadas – meu caso – terá alguma dificuldade no início, e os neófitos devem apanhar um pouco mais. Entretanto, como o Jonathan Hickman adora sagas longas, intricadas e quase tão complicadas quanto “Dark”, a galera terá tempo para entender tudo aos poucos e manter o interesse nessa nova fase dos heróis mutantes.

Nunca é demais lembrar, aliás, que os X-Men foram deixados de lado pela Marvel nos últimos anos, principalmente porque os mutantes não faziam parte do MCU (Universo Cinematográfico Marvel) antes da compra da Fox – que tinha os direitos dos personagens para o cinema – pela Disney. “Dinastia X” e “Potências de X” mostram que o universo mutante, que tem apanhado tanto desde “Dinastia M”, deve voltar a ter a relevância de décadas passadas.

Todavia, tem uma coisa chata nessa história: saber que seremos “obrigados” a ler seis títulos mensais – dois deles escritos pelo próprio Hickman – para acompanhar toda essa nova fase. É um pé no saco ficar acorrentado a qualquer tipo de cronologia, mas por enquanto vamos dar uma moral para os mutantes, pois eles precisam e merecem depois de tantos anos tratados como personagens de segunda classe.

Vida longa e próspera. E obrigado pelos peixes.

Júlio Black

Júlio Black

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