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O segundo advento

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Ando com um poema de William Butler Yeats na cabeça. Especificamente a parte que diz
“Os melhores perdem toda a fé
Enquanto os piores se enchem da mais apaixonada intensidade.”
O poema se chama “The second coming” (“O segundo advento”) e foi escrito em 1919. Faz referência ao apocalipse bíblico e reflete os impactos dos horrores da Primeira Guerra Mundial sobre a sensibilidade do poeta irlandês. Eram palavras sobre tempos ainda mais sombrios que estavam por vir. E como podem, cem anos depois, parecer tão tristemente atuais?
Não há por aqui dirigíveis e aviões bombardeando pessoas, mas o terror encontra seu caminho sob novas e fluidas formas. Os piores se agarram a suas opiniões a despeito do que a razoabilidade possa evidenciar. Os mais piores ainda manipulam tais opiniões a favor de objetivos tétricos. Criam assim uma crescente massa de idiotizados manipuláveis que vão, pouco a pouco, sufocando os melhores que, um a um, desistem. Nelson Rodrigues já profetizara: “Os idiotas vão tomar conta do mundo; não pela capacidade, mas pela quantidade. Eles são muitos”.
(Nelson é prova de que os conservadores também têm seus gênios.)
Pois aí estão os idiotas. Muitos. E os vemos marchando na Europa, cartazes em punho, condenando vacina. Mas não vemos seus marionetistas nas sombras dos palácios, negando ajuda aos países miseráveis. Vemo-los na brasilíssima calçada da rua ao lado, títeres animados pela possibilidade de eleger uma nova fraude, sob os olhos impassíveis dos comentaristas políticos. Mas não vemos seus manipuladores nos subterrâneos da internet, construindo bit a bit um “segundo advento”.
E questiona Yeats, por nós:
“Que besta bruta, vinda enfim sua hora,
Arrasta-se a Belém para nascer?”

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