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Jair fora do mundo

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Jair ia andando pela calçada quando avistou um garoto negro.

Mudou de calçada, porque poderia ser assaltante.

Da outra calçada Jair também acabou mudando, porque vinha lá uma mulher de mão dada com a outra.

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E ele não aguenta esse negócio de sapatona.

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Seguindo em seu footing, Jair trombou um hare krisha.

Mudou novamente de passeio, porque abomina esses ateus carecas.

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Nesta outra calçada vinha uma senhora vestida com uma túnica islâmica, apenas o rosto gordinho de fora.

Atravessou a rua, pois vai que a desgraçada explodia?

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Mais adiante, já muito longe de casa, Jair topou um rapaz de saia.

Trocou de calçada, obviamente, porque odeia essas bichas.

Numa região tão distante que já se falava com outro sotaque, Jair viu em seu rumo um velho desdentado empurrando um carrinho cheio de sucata e papelão.

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Saiu pela tangente, porque não tem que sustentar esses vagabundos que não souberam planejar o fim da própria vida.

E assim seguiu Jair, sartando de banda a cada vez que cruzava alguém que fosse diferente dele, certo de que eram ameaças a sua ética particular, excluindo a si próprio de um mundo dissonante desde o início dos tempos até, por fim, olhos loucos, odiosos e desconfiados, cair para fora do planeta num abismo habitado por monstros e demônios.

Todos em sua cabeça paranoica que acreditava em uma Terra pura, limpa, quase-ariana. E, provavelmente, plana.

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Reprodução da arte de Antar Dayal
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