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Rádio de pilha

rádio de pilha
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Outro dia um homem com cabeça de peixe descia a Alameda Prefeito Francisco Antônio de Mello Reis ouvindo um rádio de pilha. Trazia o transistorizado bem junto à cabeçorra, entre a guelra e o olhão arregalado. Embora meu interesse ictiológico se resuma a aspectos gastronômicos dos peixes, me parecia ser uma cabeça de tilápia. Mas como não avalio as pessoas pelo formato de suas cabeças e mais pelo que vai dentro delas, dei pouca importância à questão anatômica.
Uma pessoa caminhando pela Mello Reis não é algo exatamente raro, mas também não é coisa das mais corriqueiras. Praticamente não há calçada. Subindo ali para as bandas do que meus colegas costumam chamar ironicamente de “Cinturão da Riqueza” – a Cidade Alta, como um todo -, não parece ser muito importante dar aos pedestres boas condições de locomoção, pois os moradores todos têm carros. E mais de um. Ou três. Os a pé, grupo formado essencialmente por empregadas domésticas e serventes de pedreiro mal servidos pelo transporte público, que se virem disputando espaço com os carros na pista de rolamento.
De modos que uma pessoa andando a pé na Mello Reis sempre chama atenção. Ainda mais se estiver ouvindo rádio de pilha. Antenado leitor, quem hoje em dia escuta rádio de pilha? Mais: onde se pode comprar um rádio de pilha? Fosse na década de 1950, quando foi inventado, vá lá (acreditem, jovens, os conceitos de portabilidade e mobilidade nas tecnologias de informação e comunicação não nasceram com os smartphones). Ou mesmo nas décadas subsequentes do século XX, mas em junho de 2024? Causa espécie, como diria um certo ministro do Supremo com problemas de coluna, ora aposentado.
Não prestei muita atenção ao caminhante, visto que eu acelerava minha motocicleta morro abaixo na supracitada alameda. Todavia seu breve avistamento, num flagrante de rabo de olho através da viseira do capacete, foi o suficiente para levantar essas questões. O problema da mobilidade dos pedestres na Mello Reis. O uso de um rádio de pilha transistorizado por um cidadão em marcha ao largo do Parque da Lajinha, trazendo o aparelho juntinho da reluzente cabeçona. Mas o que saberei eu, que ignorava até que peixe tinha ouvido?

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