De vez em quando, talvez pelo fato de eu ser um proletário da palavra, me perguntam porque as pessoas andam escrevendo tão errado. Digo que nossa língua é complicada mesmo, cheia de dengos e artimanhas, embora, quando bem tratada, nos retribua de maneira muito generosa. Mas então retrucam e dizem que o pessoal às vezes não consegue nem se fazer entender minimamente, não consegue expressar uma ideia, por mais rudimentar que seja. Eu respondo que isso não tem muito a ver com as leis do vernáculo, está mais pra falta de prática mesmo, porque as pessoas cada vez escrevem menos, optando por áudios de oito minutos ou figurinhas da Pabllo Vittar. Eu finjo que ouvi ou finjo que entendo e disparo um “joinha”.
Até porque correção gramatical hoje é fácil demais, nossos próprios instrumentos de composição de texto apontam erros ortográficos e até de sintaxe. E se os corretores não estão habilitados, sempre temos o pai Google para nos socorrer, uma vez que os dicionários físicos foram relegados à posição de avós dos burros e socados no asilo das gavetas. Eu, homem cinquentenário que sou, tenho aqui em minha mesa um Aurélio e um Caldas Aulete, que me socorrem quando caminho pelo vale das sombras da ignorância – um passeio que faço todo santo dia. Se não podem me ajudar, recorro à internet para saber, por exemplo, como se escreve Pabllo Vittar, porque é muito LL e TT, mas poderia ser BB ou VV.
E mesmo com todas essas facilidades, o pessoal ainda assim escreve errado demais, insistem meus interlocutores preocupados com a sobrevivência da última flor do Lácio, inculta e bela, a coitada. Para esses eu tenho uma teoria. O problema de errarem é o de menos. Como disse, a língua é traiçoeira e nada fácil de lidar. A questão que me assusta mesmo é o fato de as pessoas simplesmente não terem dúvida. Porque quando a gente tem dúvida, pergunta: pro Chat GPT, pra um colega do lado, pro Aurélio, pro Google. Mas se nós, tão cheios de certezas que andamos, não temos dúvida, ficamos seguros na nossa ignorância. O problema, indagador leitor, repito, não é errar: é não duvidar.
Quando perdemos a curiosidade pelo mundo, quando achamos que todas as perguntas estão respondidas ou, pior, que já sabemos tudo, algo perigoso se desenha no horizonte. Todos os grandes avanços – tecnológicos, científicos, artísticos – da história da humanidade foram respostas a alguma pergunta. Gosto de pensar que saímos das cavernas menos por necessidade e mais por curiosidade de saber o que havia lá fora. Posso estar errado, e me perdoem o teor reflexivo desta crônica, mas o mero fato de me questionar a esse respeito, a qualquer respeito, me conforta sobremaneira.