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Piaçabuçu

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– Isso aqui tudo antes era plantação de arroz – diz o barqueiro. – Arroz e coco. Mas aí, depois das mudanças, o rio perdeu a força e o mar entrou. Salgou tudo. Não nasce mais nada.

Os ribeirinhos da foz do Rio São Francisco, diz o barqueiro, tiveram de aprender a criar camarão em cativeiro.

– Sobreviver, né?

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O barqueiro hoje vive em Piaçabuçu, Alagoas, mas já viveu no Cabeço, que, como arroz e coco, também acabou.

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– Mar engoliu tudo.

Único vestígio da comunidade do Cabeço, um farol empenado contra o horizonte, fustigado pelas ondas do Atlântico, que tritura também o que resta do São Francisco em seu ocaso.

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O Velho Chico é colossal. É imenso. Mas tem a desvantagem de ser feito homem. Nasce pequeno e límpido, encorpa-se, viceja, corrompe-se, produz, morre.

Não importa a extensão, todo rio tem a seu desfavor o fado de ter início e fim. E eis o milagre: ainda assim, continuar existindo.

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Diferente de um rio, o oceano não começa nem termina. Desconhece paradoxos. Apenas é. Se ele resolve avançar sua sombra cristalina para dentro do delta de um rio ou sobre uma aldeia de pescadores, não se pode impedi-lo.

Ali em Piaçabuçu, onde o Velho Chico é ainda mais velho, onde ele perde a sua força, não é exatamente onde ele morre, pois que continua nascendo, lá nas lonjuras da Serra da Canastra. É, antes disso, onde ele é confrontado com sua impermanente finitude.

Eis a sina do rio: conhecer seu fim sem jamais se acabar.

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