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O tempo só é amigo das mães de bebês

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O tempo só é amigo das mães de bebês. Quanto ao restante de nós, mães e pais e não mães e não pais, ah!, de nós o tempo é inimigo. Quantas artimanhas não inventamos para enfrentá-lo? Vamos à academia. Aplicamos botox. Implante capilar. Criamos os antibióticos e as vacinas também porque, em última instância, lutar contra o tempo é lutar contra a morte. Cortesia cretina do tempo, adversário de tudo que vive, aquilo que nasce começa imediatamente a morrer.
Mas não pense, indignado leitor, que a primeira crônica do ano será sobre deterioração. Não. Lutar contra o tempo não é só lutar para prolongar a vida, mas também para fazê-la mais leve.
Dizem que as guerras promovem a invenção de grandes tecnologias. E na perene guerra contra o tempo, o homem tem inventado, ao longo dos séculos, muitas maravilhas que fazem nossa existência mais segura, mais saudável e, por que não?, mais bela. Ora, não é só da invenção de aspirina e técnicas cirúrgicas e antidepressivos e drogas ilícitas e automóveis que se faz a luta contra o tempo. Não mesmo.
Não quisesse vencer o tempo, oponente com o qual tem de conviver, o homem primitivo teria feito seus desenhos nas areias do Piauí, e não nas paredes inacabáveis das cavernas da Serra da Capivara. Não quisessem preservar a memória dos indivíduos, os antigos não teriam inscrito epitáfios na pedra das lápides, os faraós não teriam mandado erguer as pirâmides, os reis não teriam encomendado seus retratos a pintores, Niépce não teria inventado a fotografia nem os irmãos Lumiére o cinema.
Olha o tanto que a luta contra o tempo nos deu: a escrita, a poesia, o teatro, a arquitetura, a pintura, o desenho, a fotografia, o cinema. As técnicas que em sua origem serviam para eternizar uma vida, um momento, tornaram-se maneiras de fazer mais suave a jornada que chamamos de tempo. Assim que nos distraímos com Machado de Assis e Leminski e Niemeyer e Shakespeare e Michelangelo e Sebastião Salgado e Tarantino…
A crônica mesmo, atento leitor, foi conjurada ali na encruzilhada da história com o jornalismo e a literatura para imortalizar os feitos da Coroa portuguesa. Hoje está aí nas páginas dos jornais, aliviando a dureza do noticiário. Tem seu nome derivado de Cronos, deus do tempo, que na mitologia grega devorou seus próprios filhos por medo de ser destronado por eles. O tempo, da mesma forma, nos devora diariamente, aos poucos e aos montes. Nem por isso, todavia, deixamos de celebrá-lo a cada aniversário, a cada Ano Novo, que aliás é o Aniversário da Terra, como quis Rubem Braga. Diante de sua inexorabilidade, festejamos o que há entre o começo e o fim. Festejamos, portanto, o caminho. Que por aqui chamamos de vida.

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