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Para além do ajuste fiscal

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Muito se tem ouvido ultimamente sobre a necessidade de o Governo equilibrar suas contas, cortando gastos e/ou (infelizmente) aumentando arrecadação. Trata-se do famoso ‘ajuste fiscal’. Tão difícil quanto entrar na dieta depois das férias, entretanto, é colocar ordem nos gastos públicos. Isso porque cortar gastos envolve não somente mexer em privilégios políticos (viagens, diárias e outros que tais), mas também ficar um pouco mais contido em despesas bastante sensíveis, em áreas como saúde, educação, previdência. Evitando falar sobre o assunto, os governos muitas vezes optam por aumentar tributos diversos, jogando o problema para as próximas eleições. Apesar de indigesta, essa é uma agenda que terá que ser enfrentada algum dia. Mas não é nosso maior desafio.

Recentemente, economistas têm concordado em apontar a baixa produtividade da economia brasileira como uma das responsáveis por nosso pífio crescimento econômico, esse sim nosso maior desafio desde sempre. Relatório preparado pela Agência Brasileira de Desenvolvimento e Inovação (ABDI), em parceria com o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA), lançado em 2014 e integralmente dedicado ao tema, fornece um panorama nada animador da situação. Basta olhar a média do crescimento anual do PIB, que representa a soma de todas as riquezas produzidas numa economia: 2,3% (1990-1999); 3,2% (2000-2009); 4,8% (2003-2008);3,4% (2009-2013); e talvez -0,5% em 2014. Se confirmado o número, nossa riqueza terá encolhido em 2014. E pode continuar a fazê-lo em 2015. Nos demais anos, tivemos algum sucesso ‘boiando’ na onda do bom momento internacional. O crescimento da demanda e a elevação dos preços das chamadas ‘commodities’ (produtos pouco diferenciados, como agrícolas, minerais, petróleo) – que chegou a 21% a.a. entre 2004-2008, para cair para menos de 1% após a crise – impulsionados pelo crescimento da China, certamente nos ajudou. A elevada rentabilidade desses produtos, entretanto, representou um retrocesso na qualidade da nossa pauta de exportações, que se tornou altamente concentrada em produtos básicos (65% do total em 2011).

O cenário prejudicou o avanço do investimento privado no Brasil, que patina em 18% do PIB, quando a meta do Governo é que chegasse a 21% ainda em 2010. Pior, o investimento que há é concentrado em segmentos tradicionais, pouco tecnológicos e de baixo valor agregado. Ganharam espaço em nossa economia, desde a crise, o setor de serviços e a indústria extrativa. Para tentar ajudar, o Governo promoveu desonerações tributárias (redução de IPI, por exemplo). Mas tais medidas tiveram mais efeito sobre a demanda do que sobre o investimento. Com oferta de bens estagnada e a alta demanda, o que se viu foi inflação ascendente. Nem os R$ 375 bilhões em crédito com juros subsidiados liberados pelo BNDES foram suficientes para amenizar o cenário.

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Se houve, portanto, algum crescimento no pós-crise, esse foi devido ao grande contingente de pessoas no mercado de trabalho. Mas até isso tem os dias contatos. Vivemos o auge de um boom demográfico que não irá se repetir no futuro. Por volta de 2050, já haverá mais idosos na economia brasileira. Com mais benefícios previdenciários para pagar, menos jovens para trabalhar e poucos investimentos em automação, a conclusão é que realmente “estamos ficando velhos antes de ficarmos ricos”. Sejamos então pelo menos sábios e façamos algo enquanto há tempo.

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Por Fernanda Finotti Cordeiro Perobelli, a partir da publicação ABDI/IPEA ‘Produtividade no Brasil’, 2014.
Email para: cmcjr.ufjf@gmail.com

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