Em um ano marcado por esforço fiscal e busca de equilíbrio das contas nacionais, “pautas-bomba” chamam a atenção dos brasileiros. Uma das mais recentes está relacionada ao FGTS, expediente criado em 1967 em que o empregador deposita mensalmente 8% do valor dos salários devidos em uma conta reserva vinculada ao empregado. O fundo foi concebido com o intuito de proteger o trabalhador em caso de demissão (em especial a sem justa causa, em que este faz jus ao direito de sacar o montante depositado pelos empregadores, acrescido de uma multa rescisória equivalente a 40% desse montante, a ser paga pelo empregador que rescinde – outros 10% são pagos por este aos cofres públicos). Atualmente, o saldo recolhido na conta do FGTS do empregado é corrigido pelo Governo a 3% a.a. mais taxa referencial (TR). A proposta, aprovada em agosto pela Câmara dos Deputados, equipara a correção do fundo ao rendimento da poupança, que gira em torno de 0,5% ao mês ou 6,16% a.a. mais TR. Ou seja, o dinheiro renderia mais do que o dobro do que rende atualmente, mas, ainda assim, ficaria abaixo da inflação (atualmente em cerca de 9,5% a.a. pelo IPCA de 12 meses).
A mudança divide opiniões. Os defensores argumentam que o modelo atual gera prejuízos aos trabalhadores, ao não garantir sequer uma remuneração equivalente à da poupança. Defendem ainda que a TR não deveria mais ser utilizada como índice de correção monetária uma vez que, desde 1999, vem sofrendo considerável redução, deixando de acompanhar a inflação (a TR mais recente está em cerca de 2,2% a.a.).
Já os que são contra argumentam que a medida irá aumentar os gastos do Governo, responsável por pagar os rendimentos sobre o saldo depositado pelo empregador, além de reduzir o volume de recursos disponíveis para financiar os programas habitacionais. O dinheiro depositado nas contas do FGTS e não sacado é usado pelo Governo para financiar a construção de moradias, obras de infraestrutura e de saneamento. Para garantir uma correção maior para os trabalhadores, os recursos do FGTS teriam que ser emprestados a taxas de juros mais altas e, portanto, os investimentos do Governo diminuiriam na proporção do aumento do serviço da dívida com os trabalhadores. Na prática, é como se o Governo viesse tomando emprestado dos trabalhadores a 3% a.a. e, de súbito, tivesse que passar a tomar recursos a 6% a.a. (note que, quando emite um título público, o Governo toma emprestado, a taxas de mercado, a 14,15% a.a. – a Selic anual – ou seja, usar os recursos do FGTS pagando o dobro ainda será um ótimo negócio).
A mudança no cálculo do FGTS também gera impactos no mercado imobiliário, uma vez que construtoras, especialmente as direcionadas ao segmento de baixa renda, veriam seus custos de financiamento aumentarem. O que se espera é que a mudança leve a um aumento de cerca de 30% nos pagamentos médios de hipotecas.
Criado para ser uma segurança para o trabalhador, o FGTS foi amplamente usado pela União como parte do seu orçamento. Dada a conjuntura atual do país, questiona-se se há condições para que o Governo abra mão desse amplo (e barato) volume de recursos. A proposta agora segue para o Senado. É esperar para ver quem o Senado vai querer agradar.
Por Karina Belarmino, Renan Guimaral, Beatriz Machado, Josiele Nunes, Matheus Andrade, Gabriel Henrique Barbosa, Daniel Oliveira e Everton Barbosa.Email para: cmcjr.ufjf@gmail.com