Essa coluna reveste-se de muita importância para mim. Não que as anteriores não tivessem. Não é isso. É que vou escrever sobre o meu aniversário, o simbolismo de completar 60 anos. E mais. Entrarei para o time que eu tanto defendo e amo, além do Flamengo. Refiro-me ao carimbo de ser uma pessoa considerada idosa, pelo marco etário jurídico brasileiro. Além de leitor, estudante do Estatuto do Idoso e da Política Nacional do Idoso, agora sou destinatário de suas indicações e medidas públicas.
Nunca falei nada da boca para fora em se tratando da pauta do envelhecimento. A partir de hoje, estou cada vez mais implicado no que falo, no que escrevo e no que leio e estudo sobre essa fase da vida que estou inaugurando. Como estou me sentindo? Um pouco assustado, com medo. Sinto falta do meu pai.
Sinto falta daquilo que ainda não tenho, por sabotagens próprias, e que desejo muito ter: o colo de Deus. Desejo proteção sem amarras para ser livre.
Minha mãe fez 80 anos em abril. Nossa diferença de idade é de 20 anos. Nessa idade, ela teve a sua primeira gravidez, de mim. Somos dois filhos. Sou o mais velho. Ela já se preocupa e sente os reclamos e limites de sua saúde. Nos falamos diariamente ao telefone. E ela me disse o seguinte sobre a nova idade, até baseada no que sentiu ao completar oito décadas de vida. Quando ia chegando os dias – ela é do dia 4 de abril -, “eu ficava um pouco apavorada, com medo, pensando ‘Nossa, 80 anos, estou velha mesmo’.
Depois que chegou o dia, estou conformada. E estou adorando, consciente de que mudei a minha composição corporal e de saúde”. Assim, eu me sinto, na descrição da minha mãe.
É lugar comum dizer isso ou escrever isso, mas o tempo passa muito rápido! Tenho a sensação de que na minha memória e no espírito da gente, cabem muitas coisas, muitas pessoas, fatos e acontecimentos que brilham na nossa identidade. Melhor da vida é reparti-la. Ter gratidão pela presença em nós, das amigas e dos amigos, dos familiares. Nessa nova idade que abro as portas, entro para o cultivo da espiritualidade. A expressão da vida. Alguns desejos salpicam o coração, como o desejo de cuidar: cuidar das pessoas, das plantas, da horta e da criação. E é muito interessante, porque eu percebo que toda a vivência da infância, às vezes silenciosa e muito tímida, por medo da reprovação dos outros, principalmente, dentro de casa, retorna em mim, com um novo olhar, forte e profundo, cobrindo a minha alma, no desejo de realizar tudo aquilo, que lá atrás, ficou para acontecer depois. E ainda bem, que, graças a Deus, tenho a oportunidade de realizar.
A realidade da passagem do tempo me faz perceber que não dá mais para adiar. A proximidade do fim (do nosso tempo) é muito produtiva e provocadora de muito entusiasmo. E é preciso pensar no legado. Ter propósitos na vida. Nesse momento chega em mim a voz de Milton Nascimento com a belíssima canção Encontros e Despedidas. “O trem que chega é o mesmo trem da partida. A hora do encontro é também despedida.” Que maravilha! Pego o trem de idade nova.
Ao meu lado, desejo boas companhias, boas leituras, boas músicas e muitas gargalhadas. Certo é também que desejo uma casa no campo, e tenho somente a certeza dos amigos do peito e nada mais. A idade, como percebem, caros leitor e leitora, acentua meu romantismo e a simplicidade do menino que fui em Porciúncula (RJ), minha pequena porção de terra, cercado do carinho, do afeto e do amor da vó e do vô. Rodeado pela presença amável de primos, tios e tias, que sentados no courinho (sofá) feito do couro do boi contavam estórias para a gente dormir. Quanto mais vou para frente, para o futuro, mais me chegam as novidades da meninice da velha infância.
Para os próximos dias e para os próximos anos, desejo continuar tocando em frente. Como, de novo, recorro a uma outra música, “levando as certezas de que muito pouco eu sei, ou nada sei”. Música não pode faltar na vida da gente. Finalmente. Pelo dia da hoje, do meu aniversário, agradeço a Deus, que através de meus pais, me deu a oportunidade de ter a vida. Muito obrigado!