Essa coluna tem quase nove meses de vida, e eu desejo, através dela, a cada sexta-feira que ela é publicada pelo jornal Tribuna de Minas, promover uma conversa com vocês, leitores e leitoras, sobre um tema, ou um assunto ainda pouco falado ou pouco explorado, no bom sentido, e que precisa cada vez mais, na minha opinião, estar presente em nossas rodas sociais do nosso dia-a-dia: o nosso envelhecimento pessoal e público. Coletivo. Como se dá a passagem do tempo em nós?
Tem sido recorrente a abordagem, o retorno dado por alguns leitores sobre o conteúdo das colunas semanais que trata sobre os cuidadores de pessoas idosas. Com satisfação, atendo ligações telefônicas de pessoas, querendo saber um pouco mais sobre essa matéria. Digo isso, ou melhor escrevo sobre isso, inicialmente, para situar o leitor e a leitora, que hoje vou dar sequência a esse assunto. Sei que serei repetitivo para alguns, mas percebo que devo, até mesmo pelo interesse demonstrado por outras pessoas, continuar apresentando algumas indagações, reflexões e angústias e pedidos de socorro, sobre o ato de cuidar de alguém. No caso aqui, cuidar de uma pessoa idosa dependente na família.
Algumas perguntas, algumas situações, verdadeiras limitações humanas, me chegam às mãos e à mente, de pessoas próximas que me lançam questões do tipo: Quando saber a hora de internar ou institucionalizar uma pessoa idosa da família? O que traz mais dor ao familiar – a morte de um corpo já envelhecido ou a morte em vida de um corpo que já não responde mais? Não tenho respostas prontas e organizadas. Se as tivesse, certamente, não tenho dúvida alguma, as utilizaria em proveito próprio, porque há mais de 10 anos que o meu cotidiano familiar é compartilhado com um familiar com Doença de Alzheimer.
A dinâmica familiar fica toda comprometida. Sua relação íntima de casal fica esquecida. Vive-se em função desse cuidado. Pensamentos desconexos, até mesmo, perversos, encostam em nosso travesseiro na hora de dormir, ou mesmo durante a luz do dia. Como não surtar com um pai ou com uma mãe completamente demenciado/a que comete um ato totalmente impensado e infeliz? É muito estresse. As famílias, independentemente de condição socioeconômica não sabem o que fazer. Chega num ponto em que não se sabe mais para onde caminhar.
Mais uma reflexão em voz alta: o que fazer quando se esgotam as possibilidades emocionais para o cuidado com o familiar idoso que tem a Doença de Alzheimer? Se nossa expectativa de vida aumentou nos últimos anos, significa que a possibilidade de convivermos com os nossos declínios cognitivos estarão mais presentes entre nós e em nossas famílias. A Doença de Alzheimer, por exemplo, principalmente quando o diagnóstico está em algumas personalidades públicas, ganha grandes repercussões midiáticas, o que favorece um pouco a educação para o nosso envelhecimento. Precisamos ter uma preparação para essa realidade. Ainda não temos.
Diante dessa constatação, de que embora estamos vivendo mais, ainda não vejo medidas robustas por parte do Estado para organizar a sociedade para o seu envelhecimento. E as nossas cidades, o que oferecem de medidas públicas sociais e de saúde para a proteção e apoio às famílias que cuidam de seus idosos com demência? Se a atenção oficial já é omissa e indiferente na raiz cultural com as pessoas idosas, autônomas e independentes, o que será com os idosos dependentes, que são mais caros e de difícil manejo profissional? Num país que tem pouquíssimos profissionais qualificados na geriatria e na gerontologia, o que nos espera na esquina do futuro, que é logo ali?
Em parte, espero ter atendido com essas pequenas linhas, àqueles leitores e leitoras que se interessam por esse conteúdo que envolve cuidar de pessoas idosas – realidade crescente – que observo no meu cotidiano profissional. Para eles, sugiro visita às livrarias da cidade que disponibilizam vasto material bibliográfico sobre Doença de Alzheimer e também consultar o território da internet. E para aqueles leitores e leitoras que estão chegando agora no assunto do envelhecimento com suas principais patologias de desequilíbrio cognitivo, sugiro acompanhar a mídia local que, certamente, abordará a matéria sobre Doença de Alzheimer, porque o dia 21 de setembro, amanhã, além de ser o Dia da Árvore, é também consagrado ao Dia Mundial da Doença de Alzheimer. Informe-se sobre a doença. É meio caminho andado para o tratamento.
A cidade carece da criação de grupos de apoio para os familiares que cuidam de seus idosos dependentes com baixa autonomia. Vejo com muito bons olhos a criação voluntária de movimentos sociais nessa direção. Grupo de pessoas cuidadores de idosos que se reúnem sistematicamente para o crescimento profissional. Debates e estudos de casos. O cuidado exige educação continuada, capacitação profissional associada à construção de habilidades socioemocionais para a lida diária. Penso que para um cuidado de qualidade prestado a uma pessoa idosa é necessário casar o conhecimento científico com uma prática amorosa. Só o amor mais do que a ciência pode promover a cura. A cura de nós mesmos no cuidado à outra pessoa, que se constitui no remédio indicado para a nossa própria dor.
Aos familiares, cuidadores de pessoas idosas, por conta do dia de amanhã, deixo aqui meu respeito, reconhecimento, compaixão, solidariedade e gratidão pela crença maior que move a todos nós na tarefa de cuidar. Ele ou ela, seu pai ou sua mãe, não sabem mais quem a gente é, não nos reconhecem mais pela doença; mas nós, mais do que ninguém, sabemos muito bem o que ele ou ela fez por nós. De verdade, para mim, só o amor pode resgatar essa dívida de vida. Desejo também que em breve tempo, possamos contar com serviços e recursos sociais públicos para apoio aos cuidadores de pessoas idosas.