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Filhos perdidos

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Desejo compartilhar com vocês, nessas linhas de hoje, um pouco sobre o meu cuidado e o meu comportamento emocional, sobre o que se passa aqui dentro, com a saúde da minha mãe. Desejo que seja por um período determinado. Na verdade, esse cuidado por ser de muito amor – e por fazer todo o sentido da minha vida – demarca o início, mas sempre existiu, (de) uma longa experiência da ausência – por isso ocupa um lugar de pouco sossego e de muitas perturbações e inquietudes no meu coração e na minha alma, como também, pelos silêncios que nos habitam, no coração e na alma do meu irmão. E também isso acontece com os muitos familiares queridos e queridas que estão envolvidos nessa parte da nossa vida. Percebo sentimentos ocultos e contraditórios, muitas ambiguidades, iluminações, lembranças, devaneios e medos sobre o que essa experiência tem me provocado, e certamente, imagino, que provoca em muitas pessoas. Minha maior motivação aqui nesse espaço com essa comunicação semanal, é ter a oportunidade de interagir, aproximar realidades e situações comuns à vida de todos nós, principalmente sobre o que acontece com e no nosso envelhecimento. Assim como as crianças, as pessoas idosas precisam de mais olhares. De mais cuidados das famílias, das Políticas Públicas e das cidades.

No plano pessoal e familiar, cuidar de uma pessoa idosa, de dentro de sua casa, traz à tona, uma gama de emoções, aparentemente desencontradas, mas atravessam o nosso peito e fazem morada em nós, sem a nossa permissão consciente e mesmo sem o nosso reconhecimento que existiam. Tem-se um estranhamento que passa a ser peculiar e íntimo. Não dá para negar o que visita o nosso pensamento diante da dor e do sofrimento de alguém que a gente ama. E diante também, principalmente, da grandeza da vida que é o amor. Cuidar do pai, cuidar da mãe é um processo humano muito bonito, porém, muito doloroso. Estou totalmente convencido, pela entrega desse tempo ao cuidado, que é o exercício do amor, que dá todo sentido aos dias que não tem fim, às horas que dormem grudadas nas paredes do quarto.

Nos vários relógios espalhados pelos cômodos da casa, qualquer hora não faz a mínima diferença, apesar da surpresa, que suscita nela, por um tempo que não é mais nosso, é só seu, de quem se coloca em um outro tempo. O espaço de vida de uma mente cansada, estressada, de tanto tomar medicamentos e efetivamente, ter uma dor que pouco é diluída, na expectativa de seu desejo. É a angústia e a ansiedade de perceber, mesmo que seja numa velocidade meteórica, que já não é mais o que se foi. A ação das drogas medicamentosas sobre o organismo compromete a sua marcha, o equilíbrio corporal. A cabeça com os cabelos, como se o vento não parasse de tocar neles, procura saber que dia é hoje. Deitada, desajeitada no sofá da sala, emite, entre minutos e horas de sono, afirmações certeiras sobre o que ouviu, pouco importando, se foi ontem ou no domingo, na varanda terapêutica, de reunião dos filhos, nora e neto. Toca os dias na estranha rotina de que a toda hora que vai ingerir o remédio pergunta sempre a mesma coisa: esse remédio é para que?

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Escrevi um pouco, dividi com vocês, sobre filhos que cuidam de seus pais. Deixo uma dica de referência nessa pauta, porém, às avessas, para nossa reflexão, entre tantas outras: mulheres que desejam ou não ter o exercício da maternidade. O filme é “A filha perdida”. Da diretora e roteirista Maggie Gyllenhaal. Filme da Netflix. Que dá uma boa prosa. Inspirado em um livro da autora Elena Ferrante.

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