Vivi por quatro anos o processo de cuidados à saúde da minha mãe. Não só eu, mas também meu irmão, familiares, a Antônia, amigas, amigos e vizinhos. O início desse ciclo se deu quando estávamos em consulta médica com a ginecologista. Essa parte do cuidado de acompanhar a mãe aos serviços de saúde, durante o tempo todo, ficou para mim. Meu irmão cuidou dela em casa. E muito bem! Nessa consulta, a médica solicitou exames para investigação de uma suspeita de diagnóstico de câncer. Confirmado. Eu fiquei mais desesperado do que ela. Até porque, e isso ficou visto ao longo do seu tratamento, a consciência real da sua situação de saúde foi gradual. Aos poucos, ela foi tendo a dimensão do que representava esse tratamento.
Minha mãe, à época, estava aposentada – trabalhou por muito tempo dando produção em fábricas de meias. Com mais de 70 anos (76 anos), decidiu olhar mais para a sua saúde. E encarou o tratamento com otimismo, fé e coragem. Diante da realização de três cirurgias, entre idas e vindas, radioterapias e quimios, sua funcionalidade foi caindo. Sua autonomia e independência também. Nossa atenção e estratégia de cuidados familiares reclamavam por outras providências. Em cuidados paliativos, ativamente assistida e amparada pela excelente equipe de profissionais do Vida Saudável do Plasc/Santa Casa, buscamos e oferecemos a ela – equipe e cuidadores de casa – conforto e alívio para as suas dores e incômodos de várias ordens. Feito esse registro clínico, apresento algumas lições de vida. A principal delas é a que apresentei no título dessa Coluna. Não economize amor. Nem afeto e nem compaixão.
Nessa oportunidade de cuidado à minha mãe, nunca me senti tão livre, tão vivo, tão humano. Sobremaneira com toda a dor e sofrimento que trago no peito. Porque a vida humana é mesmo de perdas, frustrações e despedidas. Precisamos aprender a morrer. Não carrego a preocupação de saber quando o meu luto vai cessar. Se é que algum dia ele vai embora. Não acredito. Sabem por quê? Pode parecer estranho ou não fazer sentido para alguns: o que estou vivenciado na minha experiência de vida é o seguinte: perder pai é muito ruim. E eu já perdi, em 2014. Mas perder mãe é muito pior.
Estou como na metáfora do futebol, quando o atacante dá um belo drible no zagueiro, ficou “sem pai nem mãe”. É o meu caso. Na presença da orfandade. A imagem que eu faço é que com a presença da mãe a gente vai em frente, segue adiante, mas sabe, tem a confiança, de quando resolver voltar, ela vai estar lá para te receber. Sem ela, agora, a insegurança toma conta. Quem vai me ajudar a atravessar a ponte? O evento mais importante na minha vida, mesmo tendo mais tempo pela frente, e não terá outro, foi a morte da minha mãe. Tudo o que eu tinha e tenho no meu coração de amor devolvi a ela. E assim foi, com certeza, com meu irmão. Com as pessoas que, de perto, vivenciaram esse momento de vida.
De agora em diante, passados 21 dias de nossa despedida, minha missão é honrar o seu nome, agradecê-la pelo legado que deixou para nós; da importância de se ter fé na vida, na melhor inspiração da música do Milton, “Maria, Maria”. E a certeza que ficou para sempre, mãe: “o estudo é a luz da vida”. Muito obrigado.