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Cuidados à mãe!

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Há muito tempo que escuto, vivencio e participo do cuidado de muitos familiares – filho/as, neto/as e sobrinho/as – às suas pessoas idosas. Esse cuidado pode ser realizado a esses familiares de uma forma informal ou por pessoas habilitadas profissionalmente que fazem cursos para essa finalidade: cuidar de pessoas idosas. Eu, inclusive, participo desses cursos, sou convidado para conduzir disciplinas em salas de aulas sobre aspectos sociais e familiares que envolvem cuidar de uma pessoa idosa.

Há três anos que estou numa outra posição. Cuidando da minha mãe com a participação de familiares e da Antonia. Um cuidado prolongado. Que tem a participação de médicos e médicas, de enfermeiros e enfermeiras na condução do processo de restabelecimento de sua saúde. Aos 80 anos, minha mãe apresenta-se muito ansiosa. Alterna dias de calmaria emocional; em outros, um grau de baixa estima pessoal considerável, com culpa, lamentações de sua vida e percebendo-se vítima do mundo, por estar momentaneamente limitada em sua autonomia e independência na gestão de suas atividades de vida diária: vestir-se, fazer sua própria comida, como por exemplo, pernil com batatas ou frango assado servidos no almoço de domingo; tomar banho; alimentar-se; andar pela casa, estender a roupa no varal do quintal; fazer compra, assistir às missas na igreja do bairro; fazer hidroginástica; ir ao banco receber sua aposentadoria do INSS.

Sua vida mudou. E essa leitura de sua realidade tem dias que ela sente mais. Daí essa variação, essa alternância em seu estado de humor. Sua pressa em ficar boa logo. Para mim, compartilhar desses momentos é muito difícil. Ela nunca se permitiu na construção de sua velhice – acho até que, como ela, muitas pessoas, como muitos de nós, pouco pensamos que algum dia podemos ou vamos depender de outras pessoas para tocar o nosso cotidiano; no caso da minha mãe, o seu dia-a-dia, que é muito comum. A tomada emocional ligada(mecanicamente) no cuidado aos filhos fez dela uma pessoa – e acredito que isso acontece com outras pessoas também – que não se permitiu receber afeto e amor, não podia; principalmente pela fortíssima repressão, na maioria dos casos, por um pai altamente punitivo. Temido dentro de casa. Mulherengo na rua.

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É difícil também para mim e faz parte do meu crescimento espiritual não deixar-me enganar e alimentar a fantasia pessoal de que eu posso livrá-la do seu sofrimento, de sua desesperança e angústia diante da percepção de que seus passos encurtaram na vida. Sou solidário. Desenvolvo a compaixão. Choro. Fico com o silêncio que afia a alma. Nela ficam presentes e soltam no ar, as lembranças de outrora; as memórias dos filhos, quando pequenos; a liberdade de existir e de ser na fazenda do Dr.Miranda; andar à pé mais de léguas para chegar à escola na Malacaxeta. Um tempo que passou. Que teima em ficar. E fica, sim.

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Caro leitor e leitora, produzo mais essa crônica, motivo de estar aqui, porque desejo e preciso, para crescer, dividir com vocês as emoções e os sentimentos sobre a vida. Para mim, a literatura, no caso, esse exercício de escrever toda semana – renova em mim a necessidade de bater um papo, de conversar e expressar minha necessidade e carência afetiva de compartilhar nessas linhas o que eu sinto e o que vai no meu coração. Estou convencido de que esse canal tem um quê de terapêutico, porque eu entrego à vocês aspectos pessoais, e que encontram ressonâncias em muitos retornos que recebo de vocês que me leem. O que, para mim, além de ser uma grande honra, é altamente enriquecedor e importante na esperança de fortalecer a minha humanidade.

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