Às vezes, sou silêncio. Gosto de ser silêncio, porque, em meio a tanta gente falando pelos cotovelos, a falta da palavra em forma de som me reconecta. Aqueles que falam sem parar, sem que percebam, no tanto que falam, nada dizem. Talvez não ter o que dizer seja justamente o motivo para o tanto que falam sem de fato falar. Seguem, assim, com as matracas soltas, como se diz, e já não conseguem mais compreender o que dizem, nem o que os outros falam. Se comportam como crianças mimadas, se recusam a ouvir e se acham os maiorais no tanto que falam.
Sem qualquer constrangimento, enchem os ouvidos de quem está por perto. Tem algazarra, tem resmungo, tem papo-furado, tem palpite “bem intencionado”, e haja cordas vocais! Eu sei que se relacionar e conversar com outras pessoas é o que colore a vida, mas é preciso ter paciência. Os que falam demais se esquecem de sentir, de experienciar e, para praticamente tudo na vida, ter compreensão e poder gozar da vivência é sabedoria. A mente precisa de pausa, de silêncio, a fim de absorver o que está ao redor e, assim, ponderar, acolher melhor as palavras e, enfim, dialogar.
Já disse aqui outras vezes: o diálogo está rompido. E, na ânsia de falar, quase ninguém percebe isso. Aqueles que se dão conta dessa situação se sentem como peixe fora d’água. Não era para ser assim, mas a gritaria é tamanha, que deixa o ambiente desagradavél. Já me disseram que eu preciso aprender a falar mais alto, mas me recuso porque seria mais um a disputar a atenção. É um estardalhaço geral do qual quero me fazer distante até quando for possível.
Enquanto escrevo, o silêncio me engole, e é na eloquência dele que meu pensamento cria asas. Lá fora, chove, e é o barulho da chuva que me faz voltar para a quietude e me inspira. Sou quieto e gosto de ser quieto, mas não se engane, também sei ser não-quieto, basta apenas que alguém me pisem nos calos. O grande problema é que hoje tem muita gente ensandecida que não precisa de pisão no pé para desandar a falar.
Paulo Mendes Campos, um dos grandes mestres da crônica brasileira, certa vez escreveu sobre o silêncio dos mortos, de quem ele não era amigo, porque nunca se confessavam. Sim, há silêncios inconvenientes, que merecem ser perturbados, sobretudo aqueles que escondem injustiças. Mas não é sobre isso que se trata essa crônica.
Estou escrevendo sobre a delícia do silêncio, do estar consigo mesmo e da alegria de poder usá-lo para seu conhecimento próprio e do outro. Mesmo que me peçam para ser acima do tom, vou seguir envolvido pelo silêncio, porque, muitas vezes, ele conforta. Vive-se um momento em que a fala em demasia é inútil e pode causar até náuseas verbais. Para terminar, recorro a um antigo provérbio que diz que, em muitas ocasiões, “o silêncio vale ouro” e vale mesmo.