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Homem da caverna, homem caracol

concha de caracol

Foto: Pixabay/ClaudiaWollesen

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Sou um homem da caverna. Considero-me um bicho da minha toca. Não há lugar melhor no mundo, para mim, do que a minha casa. Isso não é coisa de agora. Desde criança, por meio de um olhar infantil, enxergava minha casa como um lugar encantado. Adorava meu quarto e a disposição de cada brinquedo. O lugar de cada carrinho, de cada jogo e de cada personagem em forma de boneco me traziam uma sensação de algo familiar, de continuidade, de segurança. Sempre fui muito organizado. Ter cada coisa em seu lugar era sinônimo de proteção.

Mas isso não quer dizer que não gostava de revirar tudo. Sim, gostava como qualquer criança e revirava. O corredor, que ligava o quarto à sala, transformava-se em uma grande avenida sobre a passadeira. Era carro pra lá e pra cá. Até velocípede. O degrau de uma escada, uma grande plataforma para pouso de espaçonaves ou campo de batalha para seres intergalácticos. Uma bacia de zinco, daquelas antigas, cheia de água, era o rio mais caudaloso ou os oceanos mais profundos povoados por seres mitológicos, como sereias e tritões e temíveis monstros, como o Kraken, um polvo gigante com muitos tentáculos e que adorava destruir navios.

 À medida que o tempo foi passando, outros cantos da casa foram ganhando minha atenção. Na adolescência, a sala com o seu toca-discos, que depois foi substituído por um aparelho três em um, fazia a alegria das tardes e noites de sábados. Se não era dia de “hi-fi”, tinha sempre gente lá em casa, e as conversas giravam em torno dos últimos lançamentos musicais ou de pérolas do passado. Alguém sempre trazia um vinil ou uma fita cassete. Foi no bolachão que ouvi pela primeira vez “The dark site of the moon”. Eram tempos felizes e tínhamos noção dessa felicidade. Quando a gente é adolescente, acha que aqueles momentos vão durar para sempre.

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 Hoje, como adulto, vejo a casa ainda mais cheia de qualidades, o que só aumentam minha vontade de nela ficar ou de para ela voltar o mais depressa depois de um dia difícil. O quarto e seu aconchego, a cozinha, onde o rádio se mantém sempre ligado. Não falta música no café da manhã e no horário do almoço. E tem o filtro de barro, que deixa a água sempre fresquinha. A sala e sua estante de livros. A varanda e o seu calor. 

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Já reparou que, depois de uma viagem, o que também é sempre bom, chegar em casa é reconfortante? Os móveis, a cama, o travesseiro, o cobertor, o seu próprio banheiro, a temperatura e o cheiro são coisas que acalentam. Por isso as viagens são incríveis. Ao mesmo tempo que nos despertam para as novidades, renovam o encantamento pela nossa casa.  

Não importa tamanho, que seja o ideal, pau a pique e sapê, como escreveu Zé Rodrix em parceria com Tavito, e Elis cantou. Que seja nossa, que guarde nossa história, nossos amores. Tenho amigos que falam que sou como caracol de jardim, porque acham difícil me tirar de casa. Para sair da concha, tem que valer muito a pena! Todo mundo tem aquele canto no mundo em que se sente realmente bem. Como bom canceriano, minha sorte é ter esse canto bem na minha casa, junto dos meus!

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