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Dignos da rotina

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Muito se fala sobre as grandes coisas da vida. Sonhos mirabolantes a serem concretizados, carreiras profissionais magníficas para serem construídas, viagens fantásticas para serem cumpridas. Tudo isso tem o seu valor e, muitas vezes, funciona como combustível para que se siga adiante. Mas quero aqui falar das pequenas coisas; do que, na verdade, forma o tecido do nosso dia a dia: a rotina e seus pequenos atos banais. Há quem diga que guarda ranço dessa repetição das coisas e, realmente, existem momentos em que nosso desejo é virar a mesa. Essa hora da virada é importante na vida das pessoas, porque pode alterar rotas. O que parecia muito certo passa a ser visto como muito errado, o que é um começo para um novo caminho.

Todavia, mesmo que esses pontos críticos sejam, às vezes, necessários, é preciso valorizar o que preenche nosso cotidiano. Parece que não, mas o feijão com arroz, o colégio da criança, a conta que precisa ser paga, o barulho do carro que avisa a necessidade de procurar a oficina, a reunião na empresa, o arrumar a casa e o regar as plantas têm potencial para nos salvar. Salvar de quê? Alguns vão questionar. Talvez, de uma ânsia por novidades inexistentes ou fabricadas. Talvez, daquele instante em que você está perdido e se pergunta: “E agora?”. Voltar-se para as pequenas coisas pode ser um porto seguro e a oportunidade de colocar a cabeça no lugar.

Somos dignos da rotina, mesmo que em tantos sentidos nos pareça monótona. O rame-rame dos dias que se seguem assenta as coisas em seus lugares e, claro, nos prepara para os grandes acontecimentos, para as ocorrências formidáveis, que só são magníficas quando estão diante do que é simples. É preciso saber o valor do que é comum, para não se naufragar no oceano do que é extraordinário e vazio.

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Sei que nem todo mundo concorda ou até mesmo entende esse ponto de vista. Nem tudo é mesmo feito para ser entendido, mas para ser sentido. Para alguns, será preciso muita vivência para que se perceba o que existe de deslumbrante atrás de um corriqueiro pão com manteiga, de um almoço em família, de uma xícara de café no meio da tarde, de chegar em casa depois de um dia trabalho, de deitar na cama e pegar no sono com facilidade. Sem essas coisas que são tão banais e ao mesmo tempo tão humanas, jamais seria possível medir a grandeza de qualquer outra coisa na vida.

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