Quinta-feira, dia 29 de dezembro de 2022. Dez e quinze da manhã. Diante da tela do computador, começo a escrever este texto. O último do ano. Passa um turbilhão de pensamentos na minha cabeça sobre o que afinal deveria escrever. O ano que vai embora não foi fácil. Aliás, os últimos quatro anos não foram fáceis. Cada um sabe onde seu calo mais apertou. Pensei em fazer um balanço dos momentos mais pessimistas, mas também percebi que, analisando por outro prisma, havia motivos, apesar de tudo, para um saldo mais otimista. Decidi, então, que era melhor não fazer esse tipo de reflexão, pelo menos por agora.
Mas, com o aproximar de um novo ciclo, é quase impossível não pensar na vida e nos rumos que a gente quer dar para ela. Pensei nos meus atos ridículos, nas minhas derrotas, nas minhas conquistas e em como tudo isso me afeta e, no final das contas, se transforma em amadurecimento. Com cada um desses momentos, aprendi um pouco mais sobre mim e, com certeza, isso é igual para todo mundo. O diferente é como cada um lida com esse autoconhecimento.
Existe receita para levar um ano novo extraindo dele só o que há de bom? Sabemos que não. Na verdade, quando pensamos sobre a vida, que é o tecido que nos move ao longo do ano, não tem receita, nem conselho. Não existe um tipo de padronização que seja boa para mim e para outra pessoa. A vida é o que temos e cada um a vive da sua maneira e da forma como ela se apresenta. É até possível plantar sementes mirando o que se pretende colher no futuro, mas os frutos nem sempre rendem o que era desejado.
Talvez, por isso, a vida seja um grande barato. Sei que, para alguns, as possibilidades são menores. Cabe aos que têm mais privilégios uma mudança de rota, alcançar o entendimento de que, mesmo em nossos pequenos atos, existe a capacidade de transformação, de deixar tudo mais justo para o maior número de pessoas. É difícil, eu sei, mas é preciso começar.
O novo mesmo precisa se dar dentro da gente, porque não adianta apostar no que está de fora se, internamente, tudo continua trancado e cheio de amarras. A força que pode mover cada um de nós para o futuro não são os desgostos do passado. Pelo contrário, é preciso deixá-los para trás, para assim, inclusive, viver de forma mais plena o presente. Quem vive no mundo adulto sabe que não existe magia quando o relógio registra meia-noite. As dificuldades não deixam de permanecer só porque dezembro virou janeiro. As mazelas do mundo não desaparecem para que tudo recomece do zero.
Portanto, o novo precisa estar em nós e no desejo de querer fazer dar certo. Sem isso, o ano que chega não passa do mais do mesmo. Para terminar, vou recorrer a Carlos Drummond de Andrade que, em seu poema “Receita de Ano Novo”, mostra como é importante que cada um faça a sua parte para merecer o que o ano vindouro guarda de novidade. Sua poesia termina assim: “Para ganhar um Ano Novo que mereça este nome, você, meu caro, tem de merecê-lo, tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil, mas tente, experimente, consciente. É dentro de você que o Ano Novo cochila e espera desde sempre”.