Para a realizar este tipo de transplante é necessário compatibilidade do tipo sanguíneo (sistema ABO), processo mais simples que o de rim, por exemplo. Devido a sua alta capacidade de regeneração, a doação de um órgão pode beneficiar mais de um receptor e, se realizado intervivos, parte do órgão do doador pode ser suficiente para o receptor.
O ato cirúrgico – troca do fígado comprometido do receptor pelo órgão saudável do doador (cadáver ou vivo) -, é apenas um dos momentos do longo processo até a sua chegada. Pela discrepância entre o número de pessoas que necessitam do transplante e o número de órgãos doados (via morte encefálica) há um tempo longo de espera em fila, tornando-se um grande desafio levar o paciente vivo até o momento do transplante.
Os doentes que necessitam do transplante são graves, com diversas complicações decorrentes do mau funcionamento do fígado e que precisam estar razoavelmente equilibradas quando a doação acontece. Após a realização do tão esperado transplante, há um período imediato onde o paciente, submetido à cirurgia de grande porte, tem que ter seus diversos sistemas equilibrados de forma adequada para permitir que o órgão transplantado retome o seu funcionamento de modo pleno. Em média, 7 a 10 dias após a realização do transplante, o paciente recebe alta e com medicamentos que diminuem a ação do sistema imunológico aceitam este órgão “diferente” como sendo seu.
Por tudo isso, há tanto o que se comemorar quando mais um centro, fora das capitais, é credenciado para realização do transplante hepático. Somente 60 hospitais no país (menos de 1% dos hospitais brasileiros) são credenciados pelo Ministério da Saúde para realização do procedimento, sendo, o Monte Sinai, o sexto, no estado de Minas Gerais. O credenciamento exige alto nível de qualificação da equipe cirúrgica, estrutura física sólida, além de equipe multidisciplinar com profissionais de comprovada competência.
Grupo do Fígado do Monte Sinai
O Grupo de Fígado do Monte Sinai foi criado durante o II Encontro Minas-Rio de Hepatologia, em setembro de 2016, reunindo hepatologistas, cirurgiões do aparelho digestivo, hematologistas, anestesiologistas, especialistas em endoscopia digestiva, patologia clínica e radiologia intervencionista, além de enfermeiros, psicólogos, nutricionistas, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, dentre outros profissionais. A equipe estabeleceu um fluxo contando com um importante parceiro, o Hospital Universitário da UFJF, cujo Centro de Referência em Hepatologia, em funcionamento desde 2004, é o segundo maior de Minas. E outra importante parceria foi estabelecida com os gestores municipais que deram apoio fundamental para a concretização do projeto. Todo o processo é financiado pelo SUS.
Estrutura de alto padrão
A UTI do Hospital está entre as mais modernas do país e a estrutura ainda conta com leitos do Centro de Transplante de Medula Óssea, com posto de enfermagem independente, apartamentos isolados com filtro Hepa e estrutura de unidade semi-intensiva, além de equipe com três anos de experiência com pacientes imunossuprimidos.
Parceria com Centro de Referência do HU
Mensalmente, cerca de 300 consultas especializadas são feitas por uma equipe de Hepatologistas no Centro de Referência do HU. Entre os mais de 3 mil pacientes cadastrados, as doenças mais prevalentes são a hepatite C crônica, a doença hepática alcoólica e a doença hepática gordurosa não alcoólica e a hepatite B crônica que representam, em todo o mundo, as principais indicações de transplante hepático. Em tese, 20% a 30% destes pacientes têm ou evoluirão para cirrose hepática, tornando-se candidatos em potencial ao transplante.
Após pré-seleção no Centro de Referência do HU-UFJF, o paciente é encaminhado para o Centro de Transplante Hepático do Monte Sinai, onde a equipe analisa e inscreve o paciente em lista, momento a partir do qual passa a concorrer por um órgão.
O critério que define a ordem de quem recebe o órgão entre os pacientes ativos em lista é a gravidade da doença hepática, avaliada pelo escore MELD e pelo tempo em fila. Quanto maior a pontuação, maior a gravidade da doença e, portanto, mais rápido o paciente receberá o órgão. Desde o status de ativo em lista até o recebimento do órgão todos os esforços da equipe são para manter o paciente vivo em condições clínicas mínimas para a realização do transplante.
Luta pela captação é uma constante
Com o processo completo, o transplante realizado e após a alta hospitalar, o ganho de qualidade de vida é um dos maiores entre todos os pacientes transplantados. De um modo geral, a sobrevida média é de 80% no primeiro ano e 75%, em 5 anos. Mas, a escassez de órgãos, consequente ao baixo número de doadores, resulta na morte de uma proporção significativa de pacientes à espera do transplante.
Segundo o último relatório do Registro Brasileiro de Transplantes (veículo oficial da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos – ABNT) aponta que, mesmo com taxas mais promissoras de doação no primeiro trimestre de 2017 quando comparado ao mesmo período de 2016, há muito o que evoluir. Uma vez que a lei de doação de órgãos no país prevê que é necessário a autorização da família para a efetiva captação dos órgãos, boa parte delas ainda recusa a doação após a constatação de morte encefálica que é feita por dois médicos neurologistas, não vinculados às equipes de transplante. Em 2016, a taxa de doadores efetivos cresceu 3,5%, atingindo 14,6 pmp (por milhão de população), mas esse acréscimo foi menor que o esperado. A taxa de notificação de potenciais doadores vem crescendo lentamente e está próxima a 50 pmp, mas a taxa de não autorização familiar mantém-se muito elevada (43%).