Uma em cada cinco mulheres sofre de perturbações mentais na gravidez ou durante o primeiro ano de vida do bebê. Um estudo, liderado por Portugal e Espanha, quer compreender os efeitos da pandemia.
Os números são conhecidos e um sinal de alerta nos tempos de pandemia que o mundo atravessa: nos países europeus, entre 10 a 15 % das mulheres sofrem de depressão durante período perinatal (da gravidez até ao primeiro ano de vida do bebê), aumentando o risco de parto prematuro, a redução da ligação mãe/bebé e atrasos no desenvolvimento cognitivo e emocional da criança, que podem persistir na infância.
Na situação atual, este risco é acrescido. “Há uma quebra de expectativas daquilo que seria o ideal para um momento de muita alegria, mas que por si só gera já muitas dúvidas e incertezas”, explica Ana Mesquita, investigadora principal da Escola de Psicologia da Universidade do Minho e coordenadora do estudo internacional “As experiências perinatais durante a pandemia.
“A pandemia gera níveis de ansiedade muito grandes nas mães. Se considerarmos que alguma população já é de particular risco, e que há situações como a perda do emprego que se podem acumular, há um agudizar deste cenário. Se pensarmos que quase 20% das mulheres pode passar por situações de perturbações de saúde mental na gravidez e pós-parto, numa situação em que o risco aumenta podemos ter quadros muito significativos de perturbação”, defende Ana Mesquita.
O primeiro inquérito do estudo está disponível desde 29 de junho, decorre ao longo dos próximos dois meses e podem participar grávidas ou mães com bebês até os 6 meses. Além do questionário inicial, após essa primeira fase, o estudo acompanhará as mães durante um, três e seis meses. A investigação quer acompanhar mulheres desde a gravidez até ao pós-parto — seguindo mulheres sem infecção ou que testaram positivo para a covid-19. “Poderemos ver, por exemplo, se há impactos duradouros ou não”, explica Ana Mesquita.
O estudo internacional, que só estará concluído em 2021, inclui 11 países europeus — Albânia, Bulgária, Chipre, França, Grécia, Israel, Malta, Portugal, Espanha, Turquia, Reino Unido — a que se junta o Brasil. Uma “task-force” liderada por Ana Mesquita e pela colega espanhola Emma Motrico, da Universidade Loyola Andalucia, em Sevilha, criada dentro de um consórcio europeu já ligado às questões da depressão no período perinatal.
O inquérito inicial vai avaliar não só a saúde mental das mulheres, mas também as suas experiências neste período em diversos aspectos: do acompanhamento na saúde, à atividade física, ao suporte social e condições de vida. “O objetivo é captar o máximo de variáveis possíveis que possam ajudar a explicar o quadro de saúde mental”, afirma Ana Mesquita. Serão também recolhidos dados sobre a situação epidemiológica de cada país, do confinamento ao número de casos, para enquadrar os dados à luz daquilo que é a realidade em cada país.
Alterações nas consultas, parto, amamentação
As restrições impostas pela pandemia têm condicionado sobretudo o acompanhamento das grávidas em consultas e ecografias — quer pela dificuldade em marcar consultas e exames, quer pelo impedimento da participação do pai nesses momentos. Além disso, as grávidas e mães recentes ficaram mais isoladas, por imposição do confinamento, viram a sua atividade física restringida e, em alguns casos, enfrentam dificuldades econômicas agravadas pela covid-19.
No período inicial de confinamento no Brasil, as incertezas sobre os cuidados com as grávidas e mães recentes geraram muitas controvérsias. Houve casos em que mães positivas para a covid-19 foram separadas dos filhos nos primeiros dias de vida do bebê.
Atualmente, no Brasil vemos muitos relatos de mulheres que foram impedidas de terem acompanhantes no momento do parto sob a alegação do risco de contaminação pela Covid-19. A Lei Federal nº 11.108, de 07 de abril de 2005, mais conhecida como a Lei do Acompanhante, determina que os serviços de saúde do SUS, da rede própria ou conveniada, são obrigados a permitir à gestante o direito a acompanhante durante todo o período de trabalho de parto, parto e pós-parto. A Lei determina que este acompanhante seja indicado pela gestante, podendo ser o pai do bebê, o parceiro atual, a mãe, um(a) amigo(a), ou outra pessoa de sua escolha. A lei não foi revogada na pandemia e o direito a um acompanhante deve ser respeitado.
Quanto ao aleitamento materno, as orientações do Ministério da e da Organização Mundial de Saúde é de que a parturiente amamente seu bebê mesmo nos casos positivos para Covid-19 ou em investigação, desde que se cumpram as medidas de controle de infecção.
Até a presente data, a grávida está dentro do grupo de risco acrescido para a covid-19. Um estudo recente realizado na Itália identificou dois casos de transmissão do vírus da mãe para o filho, podendo indicar uma possível transmissão vertical, da mãe para o feto no útero ou para o recém-nascido durante o parto.
No que toca à saúde mental, as orientações mais recentes é sobre a necessidade de reforçar os cuidados com a saúde mental de grávidas e mães devido ao risco acrescido de perturbações de ansiedade e humor em período pandémico. As grávidas devem ser questionadas sobre o seu estado emocional a cada contato com o obstetra ou profissional de saúde.
Apostar na prevenção é essencial. Um estudo realizado no Reino Unido, em 2014, revelou os custos associados à saúde mental perinatal: 84 mil euros por cada mulher diagnosticada (gastos nos cuidados ao longo da vida), sendo que cerca de 30% desse valor dizia respeito a custos associados à mulher e 70% a custos com os cuidados de saúde da criança ao longo da vida.
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Pelo app Tumaas as parturientes podem escrever seus relatos de parto para contarem como foi o tratamento do hospital/maternidade no momento do parto nesse período de pandemia.
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Fonte: público.pt