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Bárbara Rodrigues, Esclerousada aos 25

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Formada em direito, Bárbara abandonou o emprego e hoje se dedica a uma página na qual conta sua rotina com a esclerose múltipla (Foto:Marcelo Ribeiro)

“Eu já tinha sintomas, mas não fechava o diagnóstico. Em outubro do ano passado, eu dormi bem e acordei com a mão dormente. Achei estranho, pensando que tivesse dormido sobre o braço e estivesse muito estressada com o trabalho. Comecei a encarar como uma estafa, até que meu braço ficou dormente. Comecei a ir a ortopedistas e dei início a uma saga. Um médico falou que era estresse, o outro falou que era problema de coluna. Um disse que era síndrome do Túnel do Carpo, pediu exames específicos e me encaminhou para um especialista em mãos. Fiquei esperando o dia da consulta, enquanto dormia e acordava com dormência.

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Depois de 20 dias, com os nervos à flor da pele por não ter nenhum diagnóstico, fui caminhar com meu noivo na universidade e senti uma fisgada na posterior da coxa da perna direita quando fui abaixar para amarrar o cadarço do tênis. Aí percebi que todas as vezes que eu abaixava a cabeça sentia um choque na coluna toda, até o pé. Voltei ao hospital, relatei ao ortopedista de plantão, que me olhou com um olhar diferente e pediu para eu procurar um neurologista. Ele falou, e eu senti que tivesse alguma coisa errada. Ele também pediu uma ressonância da cervical, que eu fiz e, quando peguei o exame, li as palavras ‘esclorose múltipla'”, recorda-se Bárbara Rodrigues Silva, com seus olhos claros, cabelos louros, óculos de aros brancos em madrepérola e uma segurança própria dos jovens. Há oito meses diagnosticada com uma doença considerada rara e ainda com os 25 anos que tinha quando fez a leitura mais dolorosa de sua vida, Bárbara decidiu aceitar o diagnóstico e rejeitar uma sentença. “A esclerose me ensina que eu tenho que viver o hoje, o agora, e preciso sorrir para o dia. O amanhã só vou viver amanhã.”

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Ontem

Depois que Bárbara leu as duas palavras que mudariam seu trajeto, foi a diferentes médicos, até se deparar com um que iniciou seu tratamento. “Fui fazer a pulsoterapia, que é o tratamento com corticóide para as pessoas que estão em surto, com a lesão ativa, ou seja, com a bainha de mielina inflamada. Por estar com uma lesão na região da medula, sentia a dormência no braço e na perna. E o choque que sentia era o que os médicos chamam de Sinal de Lhermitte”, conta ela, que chegou a fazer mais de 60 exames de sangue em menos de um mês. Todo o sofrimento tinha prazo de validade. “Faltavam 15 dias para o intercâmbio para Irlanda, que era meu sonho. Naquele momento em que estava louca para curtir, entrei em depressão. Fiquei internada os cinco dias para fazer a pulsoterapia e perdi minha autoestima. Não quis contar para a família e não falava o nome da doença. Não aceitava. E pensava: como vou viajar assim? Mesmo assim, fui e fiquei de 15 de novembro a 15 de dezembro do ano passado. E foi bom, porque o calor impacta muito nos pacientes de esclerose múltipla, já que a condução nervosa fica ruim em altas temperaturas, e eu perdi o início do verão no Brasil. Fiquei na Irlanda sem sintomas. E para o emocional foi muito bom.

Quando voltei, fui viver a doença de novo, me envolvendo no tratamento. Optei pelo convencional e precisei passar por um processo para conseguir os medicamentos com o Estado, já que são de custo alto”, lembra ela, que três vezes por semana toma uma medicação injetável e sofre com efeitos colaterais como febre e dores no corpo. Sobravam angústias e faltavam referências. “Só tinha a noção da Claudia Rodrigues (atriz), que era a única pessoa que eu sabia ter a doença. Ficava com ela na cabeça. Fui para a internet e só encontrei o lado ruim. Não que ter uma doença tenha um lado positivo, mas eu precisava ver casos de pessoas vivendo bem. Virei especialista em efeitos colaterais de remédios e tempo de vida de pacientes.”

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Hoje

Sempre que Bárbara lê as duas palavras que mudaram seu trajeto, ocorre-lhe uma urgência. “Um dia eu só chorava e fui buscar ajuda. A terapia me levantou. Comecei, então, a dar valor às pequenas coisas. Quando percebi que não gostava da pessoa que eu estava sendo, comecei a mudar. Saí do emprego, que já não me fazia feliz, e comecei a fazer um curso de coach, que era o que queria para a vida. Também comecei a escrever na internet, porque eu precisava mostrar que a esclerose múltipla não é o fim. Claro que cada caso é um caso, e pode ser que amanhã eu não levante da cama, mas agora estou bem e posso mostrar que estou assim”, pontua a jovem, graduada em direito e, desde a formatura, empregada no setor de tecnologia de uma multinacional.

Morando há dois anos com o noivo Fernando, seu namorado desde 2009, compartilhou o diagnóstico primeiro com ele e, em seguida, com os pais dele. “Às vezes, tento me colocar no lugar dele, que vive a doença como se tivesse o diagnóstico. Ele está sempre comigo e divide tudo comigo”, emociona-se. Em abril, revelou a sua família, já dolorida por outra doença autoimune, o lúpus, que impôs a partida de sua tia há 15 anos. Depois foi a vez de contar ao mundo. Há cerca de três meses, Bárbara criou a página “Esclerousada”, no Facebook. “A esclerose múltipla não impacta em redução de expectativa de vida, mas em qualidade de vida. Vou trabalhar para ter uma qualidade de vida sem precisar me diferenciar dos outros. A gente cresce numa sociedade que exige que, com 17 anos, façamos vestibular, entremos na faculdade e, ao fim, entremos no mercado de trabalho para, antes dos 30, ter família e uma vida profissional bem-sucedida. Disso, nada é qualidade de vida.”

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Amanhã

Antes que Bárbara leia as duas palavras que mudam seu trajeto surge-lhe o desejo de não permanecer indiferente a tudo o que lhe acontece. “Eu era uma pessoa que entrava no ônibus e olhava para quem estava sentado no banco preferencial e, se não via deficiência aparente, logo julgava. Não sabia o que aquela pessoa tinha. E se ela estava tão fatigada a ponto de não conseguir voltar para a casa em pé no ônibus? Se estivesse tonta? Quero mostrar na página ‘Esclerousada’, também, que há sintomas da esclerose múltipla que são invisíveis. Ninguém vai saber quando estou com metade do corpo dormente. Ninguém vai saber que fico estourando de dor de cabeça a ponto de perder a visão periférica. Ninguém vai saber quando estou tonta. É preciso que eu fale e que acreditem”, pontua ela, que encontrou na meditação um convite ao equilíbrio e uma oportunidade de permanecer, mesmo que por segundos, imóvel numa vida que lhe apresentou tantas e contínuas mudanças.

Filha de pais que se separaram quando ela tinha apenas 11 anos, ela cresceu mudando de casa e de escola. O diagnóstico, portanto, lhe impôs uma concentração, hoje expressa em seu envolvimento com a divulgação de sua rotina e com a função de secretária da Associação dos Amigos e Portadores de Esclerose Múltipla de Juiz de Fora. O diagnóstico também lhe impôs a necessidade de uma prática de fé para além de sua crença na umbanda. “É preciso ter fé. Acredito muito na cura. Vou viver para vê-la e pode até ser que eu não me beneficie dela, porque posso estar num estágio mais avançado da doença, mas aposto que ela virá. Todos os dias, quando deito na cama, rezo pelos pesquisadores que estão trabalhando por isso.”

 

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