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Meu chapa, Osvaldo, do hambúrguer da Academia

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Osvaldo orgulha-se de acompanhar gerações que cresceram comendo seus lanches, como o tradicional hambúrguer e vários tipos de churrasquinho. (Foto: Felipe Couri)
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Pão, maionese, bife de hambúrguer e batata chips amassada. A receita é simples. O tempo, que substituiu a batata chips pela batata palha, também consolidou na memória afetiva de diferentes gerações o sanduíche surgido há exatas três décadas. Era 1989 quando Osvaldo da Silva Homem montou um trailer no Colégio Academia próximo à biblioteca. “Na época, os pavimentos internos tinham apenas um andar. Queriam construir os outros dois, ainda. Então, levaram o primário para próximo da biblioteca e me pediram para ficar lá, ajudando. Fiquei uns três anos lá e, depois, vim em definitivo”, lembra ele, hoje logo abaixo da escada que leva ao ginásio e às quadras. Irmão Alcides foi quem o convidou, lembra. A proposta era auxiliar a cantina que já existia e com a qual nunca viveu atritos. Há alunos bastante para os dois negócios. “Jovem tem fome demais. Comecei com o misto-quente e, de repente, pensei no hambúrguer, que caiu no gosto. Foi um presente”, recorda-se ele, aos 63 anos, calculando vender, hoje, cerca de 70 hambúrgueres por dia. Antigamente, eram mais de 200. “Teve festa em que já cheguei a vender cerca de 500 hambúrgueres”, orgulha-se o homem que, em meio a crianças, adolescentes e adultos viu gerações se seguirem e hábitos se transformarem. A chapa, no entanto, nunca desligou.

Há 30 anos Osvaldo atua no Colégio Academia, onde o pai era regente escolar. (Foto: Felipe Couri)

Maionese caseira

Os ponteiros marcam 5h50 quando Osvaldo chega ao Colégio Academia. Quando o ponteiro menor aponta para o nove e o maior, para o 12, o homem vai embora. Passa mais de 15 horas no trailer. Ao longo de todos esses anos, são cerca de 90 mil horas de sua vida que Osvaldo dedicou ao trailer. Eva, sua filha mais velha, tinha apenas 7 anos quando o pai inaugurou o negócio na escola onde ela passou a estudar. Emanuel, por sua vez, nasceu quando o trailer completava seu primeiro ano e saiu do colégio no 1º ano. Hoje, ele ajuda o pai nas vendas, na chapa e no que preciso for. A filha atua em casa, fazendo escondidinhos, lasanhas, tortinhas, salgados, sanduíches, saladas de frutas e caldos para os dias frios. “Hoje não cozinho mais, mas já fiz muito”, diz o pai. Quando não está no colégio, Osvaldo está em busca de mercadorias. Nos fins de semana, portanto, relaxa com a cervejinha e o futebol. E come hambúrguer. “Se eu não adorasse, não poderia fazer. Sempre adorei”, afirma. Come todo dia? “Não, porque já tenho idade, né?!”, ri o criador de uma elogiada maionese caseira que prepara sempre quando chega em casa. Não dá trabalho, garante o homem, acostumado com uma rotina que desde a década de 1970 se mostrou apertada. Antes do trailer, Osvaldo tinha uma cantina dentro da gráfica da congregação do Verbo Divino do Espírito Santo, na Rua Halfeld. Após o Grupo Solar, em 1981, comprar a empresa e dar a ela o nome de Esdeva, Osvaldo também mudou de endereço e partiu para o complexo industrial na Rua Espírito Santo. De lá, voltou a subir a Halfeld. “O tempo foi passando, e as coisas foram se encaixando. Um chegava, comia e gostava e falava para o outro. Assim foi virando uma bola de neve entre os alunos. Nesse tempo todinho, o pessoal sempre gostou. Uns falam da maionese, que é muito gostosa. Outros falam do carinho que tenho de fazer o sanduíche.”

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De geração em geração: No trailer que vende churrasquinho, biscoito, salgados, tortas e muitas outras opções, também está o trabalho de seus dois filhos. (Foto: Felipe Couri)

Toque do chef

Para os grandões, o hambúrguer de Osvaldo tem o sabor da infância. Carregam consigo as experiências que circularam pelo alimento, os momentos, as companhias e até mesmo as provas. Osvaldo sabe disso. “Os alunos foram saindo, formando. Começaram a fazer festas e me chamavam para fazer hambúrgueres. Já trabalhei numa festa chamada Ploc, fazendo hambúrgueres”, diz ele, que há alguns meses assumiu, por uma noite, a chapa do Garagem Gastrobar, restaurante do ex-aluno do colégio e masterchef Pablo Oazen. “Foi maravilhoso relembrar as turmas antigas. Todo mundo queria tirar foto e bater papo. As pessoas saem e mudam muito fisicamente. É bom reencontrar. A casa ficou lotada, e o pessoal ficou satisfeitíssimo. Vamos fazer mais”, promete o homem de olhos claros e cabelos grisalhos que, com os anos, aprendeu uma receita mais complexa que a do sanduíche. “Para trabalhar, tem que gostar do que faz. Amo o que faço. E as crianças representam esse degrau para chegar lá na frente. Quantos pais hoje vêm aqui com seus filhos para estudar!”, conta. “Tem os jogos deles, e eu tento ver. Eles ficam eufóricos. Um menino vem e pergunta: Está torcendo para a minha sala? Eu falo que estou. De repente chega o outro, de outra sala, e pergunta se estou torcendo para a sala dele. Eu falo que também estou. Levo na brincadeira, eles também”, conta, rindo. “Não estou aqui só para ganhar dinheiro. Isso se tornou uma família”, diz, afirmando que durante todos os anos ouviu as brincadeiras e também as sugestões. “A grande maioria estudou e tem carinho por mim. Hoje são médicos, engenheiros, juízes. É muito bacana ver isso, que trabalhei no lugar que fez o cara crescer, se formar e construir uma família. Isso é muito bom.”

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Figura popular no colégio e fora dele, Osvaldo já fez seu hambúrguer em formaturas, baladas e no restaurante do masterchef Pablo Oazen. (Foto: Felipe Couri)

Era uma vez o taquígrafo

A casa onde nasceu e cresceu ficava no Alto dos Passos. Lá moravam os três irmãos, a mãe, que era dona de casa, e o pai, regente no Colégio Academia, o que justifica tamanha intimidade de Osvaldo com o colégio. No Senac, lembra, concluiu o ginasial. “A vida foi me levando”, diz, enquanto bate o sino e ele passa a se divertir. À sua frente, está um grupo de meninos brincando. Um pega o tênis do outro, e todos riem. Distante, Osvaldo também se diverte. “O tempo foi mexendo com a minha vida. Não posso falar que sempre iria ser isso. Na verdade, fiz um curso de taquigrafia, de escrita através de sinais. Escrevia 150 palavras por minuto. Na época, queria me aperfeiçoar em espanhol ou inglês, mas, jovem, não levei a sério. Era o que eu queria para a minha vida, mas o tempo passou e acabei não me envolvendo com aquilo. Era o que me encantava. Eu teria um ganho muito bom. E trabalharia pouco tempo por dia”, conta. Osvaldo não pensa em parar de trabalhar. “Falta um bocado”, comenta sobre a aposentadoria. Um menino, que deve ter entre 11 e 13 anos, se aproxima dele e aperta sua mão, seguido por um soquinho próprio entre os jovens. Flamenguistas, os dois falam do jogo da semana e riem. São amigos, garante Osvaldo.

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