Sei que esse espaço é para falar de esporte, mas me permito dizer um pouco sobre as coisas que comovem. É incrível como a fatalidade que vitimou ontem o ator Domingos Montagner me lembrou a morte de Ayrton Senna. Não sei bem o porquê. Talvez pelos dois terem saído de cena no auge, quando se dedicavam a seus ofícios. Talvez por terem encontrado seu destino nas curvas da vida, no traçado de um rio ou de uma pista automobilística. Talvez pelos dois serem corintianos, como eu. Pois é, talvez tenha algo a ver com o esporte.
Essas situações extremas em que ícones de uma sociedade midiática se mostram tão frágeis quanto eu e você são boas para reflexões. Assim como a solidão, a morte de um anônimo ou famoso só escancara o quanto somos vulneráveis. De nada vale nossa arrogância cotidiana. De nada vale brigar ou se achar melhor que o outro – muito menos segregar – por conta de paixões clubísticas, políticas ou religiosas. De nada vale a vida se não formos capazes de nos confraternizar entre amigos e família e entre desconhecidos e adversários.
Para muitos, Domingos se despediu no auge da carreira pelo recente sucesso como galã de novela das oito. Mas o ator era muito mais que um global. Era um cara normal como qualquer outro, que gostava de assistir futebol no fim de semana. “Ator é o ofício do Domingos. Fora isso, sou palhaço, pai de família e corintiano”, disse uma vez em uma entrevista. Pois é, penso que devíamos superar nossas vulnerabilidades, todos sermos mais palhaços e mais família, e, independentemente de relação consanguínea, conviver em paz com as escolhas – clubísticas ou não – do próximo. É somente isso que deixaremos como espólio. É só isso que levaremos para além da curva.