“Com exceção talvez de um ou outro tísico, completamente impossibilitado de aplicar o mais insignificante pontapé a uma bola de borracha, vai haver por aí uma excitação, um furor dos demônios, um entusiasmo de fogo de palha capaz de durar bem um mês.” Com todo esse pessimismo, Graciliano Ramos, em 1921, profetizava sobre a chegada do futebol no Brasil.
O esporte futebol, porém, marcou um gol na gaveta contra a profecia do escritor, que achava que a “estrangeirice” não entraria na “terra de espinhos”.
Quase um século depois, o autor de Vidas Secas, ao certo, não imaginaria que suas obras seriam referência até hoje, e muito menos que a estrangeirice inventada pelos ingleses seria a mania nacional, ou que um tal de Pelé levaria o Brasil pelo mundo com a bola nos pés. Ou, até mesmo, que o “football” levaria muitos jovens ao caminho do sucesso, à realização do sonho de ajudar a família, dar uma casa para a mãe, e servir de exemplo para uma comunidade inteira. A matéria que saiu na nova Tribuna, do último domingo, relata bem o poder do esporte bretão nas comunidades.
O Bonsucesso, do Bairro Industrial, clube por onde jogou Kim, que passou pelo Atlético-MG, o zagueiro Marcelo, ex-Flamengo e o habilidoso Sávio, joia do Tupi, e onde hoje jogam quase cem jovens, passa por dificuldades, corre o risco de fechar as portas e, junto, acabar com o “objetivo de tirar as crianças dos caminhos ruins”, como relatou, o treinador Walmir. O projeto se mantém na base da amizade, da vontade dos meninos, e com a ajuda de alguns pais. Espanta, um esporte secular, uma mania nacional, ainda ser visto como “fogo de palha”, onde histórias como as do “Bonsuça”, muito bem contada pelo amigo Bruno Kaehler, passam desapercebidas pelas vistas do poder público e do empresariado da cidade. Graciliano tinha mesmo razão, “terra de espinhos”.