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Democracia sob tensão e as eleições de 2022: o retorno ao coronelismo, enxada e voto

coluna bruno stiger
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A difundida regra “um homem, um voto” é uma conquista que assinala a igual representação do voto no processo político de um Estado: homens, mulheres, brancos, pretos, ricos e pobres, todos possuem o mesmo “poder” de influenciar em uma democracia substancial. A frase de efeito foi muito utilizada na Inglaterra do século XVIII pelos defensores do sufrágio universal.

Nos Estados Unidos, a frase em questão virou um princípio invocado constantemente pelo Corte Warren na década de 1960, no auge das mobilizações relacionadas às lutas pelos direitos civis, possuindo como fundamento expresso na Constituição deste país a denominada “cláusula de proteção igual da Constituição”.

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O princípio também foi usado pelo movimento anti-apartheid durante a década de 1980, numa África do Sul dominada por uma minoria branca e violenta, que manteve por décadas o monopólio da força através da força.

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O sufrágio universal e igualitário foi se consolidando no Brasil durante o século XX, a exemplo do voto feminino em 1945, porém só com a Constituição de 1988 se tornou verdadeiramente universal, momento em que os considerados analfabetos tiveram assegurado o direito ao voto.

No entanto, o Brasil de 2022 demonstrou um enorme potencial para o retrocesso nesse campo. Em que pese a proteção do voto livre e universal, garantido pela lei e pela Constituição, o mundo da vida demonstrou considerável capacidade de burlar tais garantias e expôs como fratura exposta o inconformismo de parcela da sociedade com o princípio “um homem, um voto”.

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O paradoxo, então, se apresentou: em nome de uma suposta “liberdade” e de uma hipotética “democracia”, pessoas se “ARMARAM” para assediar eleitoralmente pessoas livres e iguais e depois restringir o livre trânsito delas quando o resultado das eleições não foi o esperado. Ora, é possível invocar o princípio democrático para restringir a democracia?

Me parece, com todo respeito a quem pensa diferente, diante de tudo que se presenciou após o resultado das eleições no último domingo, que a suposta defesa da democracia é, em alguma medida, um ódio a tudo que ela proporciona (por isso o desejo de se apropriar do conceito) em uma eleição: o voto das supostas elites terem o mesmo peso que o voto do Nordeste ou da favela. É saber que a doméstica pode mudar o destino do país do mesmo modo que o patrão.

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Não por outro motivo que, nestas eleições, nunca se denunciou tanto os assédios eleitorais. Só o Ministério Público do Trabalho registrou 2.544 relatos, com 1.945 empresas denunciadas ao órgão. Em 2018, foram 212 relatos contra 98 empresas, número 12 vezes menor. Minas Gerais foi o Estado que teve maior quantidade de relatos, com 584 casos sobre 426 empresas.

Diante do quadro apresentado, a obra “Coronelismo, enxada e voto” de Victor Nunes Leal nunca esteve tão atual. Milícias cidadãs, compostas por coronéis chefes políticos, proprietários de terras e dinheiro, senhores do bem e do mal, decidiam em quem seus empregados ou dependentes deveriam e podiam votar, algo que aconteceu à luz do dia nas últimas eleições.

Portanto, já passou da hora de termos menos “pessoas de bem” e mais “pessoas do bem” defendendo o país. Menos coronéis e milícias e mais cidadãos e cidadãs comprometidos verdadeiramente com a democracia e com os resultados que ela proporciona.

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