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A suposta morte de Daminhão Experiença

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Oi, gente.

Dizem por aí que Daminhão Experiença morreu no último dia 10, mas sei lá. Não seria surpreendente se ele houvesse morrido há muitos e muitos anos, de forma anônima, e só descobrissem agora. Ao mesmo tempo, tenho lá minhas dúvidas se Experiença realmente morreu, porque Daminhão é o tipo de sujeito que parece imortal, daqueles que aparentam 70 anos de idade há pelo menos três décadas.

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Mas dizem que Daminhão morreu e quase ninguém percebeu, e poucos realmente se importaram. Porque quase ninguém conhecia o sujeito. Eu mesmo só fui ouvir o “trabalho” de Damião Ferreira da Cruz (seu suposto nome de batismo) há cerca de 20 anos, graças a um vinil que caiu nas mãos de um amigo.

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Foi então que descobri que existia um cara que se chamava Daminhão Experiença, cujo sobrenome artístico era uma homenagem à Jimi Hendrix Experience, e que gravava inúmeros discos de vinil sobre suas aventuras em nosso mundo e em sua “terra natal”, o Planeta Lamma.

Ao mesmo tempo que era quase impossível de ouvir, “Daminhão Experiença no Planeta Lamma” era uma experiência única. Entre canções intermináveis num dialeto incompreensível, o artista cantava sobre aborto, traição, sexo, lesbianismo, drogas, comunismo, semiótica, homossexualidade… Era tudo tosco, de musicalidade sofrível e letras simplórias, muitas de um machismo e falta de noção que fariam a turma do Politicamente Correto exigir sua prisão. Mas era impossível não cantar versos como “Esse mundo tá muito mudado / Os hômi tão virando mulé / E as mulé tão virando hômi / E eu mesmo que sou hômi / Fala, fala, mentiroso”.

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Como aqueles eram os anos 90, não demorou para emprestar a minha fita cassete gravada com o álbum do Daminhão e ser vítima do “bobo quem empresta, mais bobo quem devolve”. Numa época em que a internet ainda engatinhava, passei anos e anos sem procurar pelos discos do maluco que dizia ter nascido no Planeta Lamma, no máximo repetindo os versos que ainda lembrava, como “Eles se esqueceram / Que a mãe deles / Não abortaram eles”.

E assim foi até descobrir por meio dessa tal internet que Daminhão estava morto e enterrado. E descobrir, finalmente, um pouco mais do sujeito. Que ele teria nascido na Bahia, que serviu na Marinha e teria caído do mastro de um navio, o que rendeu a ele uma aposentadoria por invalidez e um estado de confusão mental como bônus. Que morava em um apartamento imundo em Ipanema, no Rio, e gravou mais de 30 discos em vinil que vendia pelas ruas do bairro – isso quando não oferecia o disco de graça para quem não tivesse dinheiro, ou pagava um salgado para o “cliente” que custava mais que a própria bolacha preta com um buraco no meio. Que sempre se recusou a ter contrato com gravadoras, e que ninguém sabia onde e como gravava seus álbuns. Que dizia ter sido cafetão no Estácio. Que preferia ser casado com lésbicas, pois preferia ser corno de outra mulher que de outro homem.

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Todas essas pérolas fazem parte de álbuns com títulos como “Damião Experiença chupando cana verde no Planeta Lamma/ Damião Experiença cheirando alho no Planeta Lamma”, “Planeta Cachaça”, “Damião Experiença no Planeta Mendigo”, “Cemitério Nazismo” e “AdeusAdolfHitler1945fim”. Quem se der ao trabalho de procurar por essas obras na internet vai perceber que Daminhão não era gênio, muito pelo contrário: é capaz de não aguentar dez minutos de “Aisibilô, iprimenaplô, guilina bari sia adelan mnaplô” mas, ao mesmo tempo, é impossível não reconhecer que, no meio de tanta piração, o suposto baiano cantava coisas que faziam sentido. E que talvez fosse genial, no fim das contas, mas de um jeito completamente torto.

Vivo ou morto, Daminhão Experiença é imortal. Ou não. Então.

Vida longa e próspera. E obrigado pelos peixes.

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